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Carlitos, a última evolução do ténis

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Alcaraz é, aos 19 anos e quatro meses, o mais jovem número um do ranking mundial masculino

Alcaraz é, aos 19 anos e quatro meses, o mais jovem número um do ranking mundial masculino

Tim Clayton - Corbis/Getty

Noah Rubin chegou a ser campeão de juniores em Wimbledon, mas nunca entrou no top 100 mundial do ténis e agora anda até pelas catacumbas dos lugares quinhentos-e-tal do ranking. Mas é reconhecidamente um pensador do ténis, um tipo preocupado com a desigualdade que existe na modalidade. E, nas horas vagas, um belo comentador das bolas que vão e vêm nos courts, na sua página de Twitter.

Ainda antes da final do US Open de domingo, Rubin escreveu que Carlos Alcaraz podia muito bem ser o “mais completo jogador” que o ténis já viu. Como se um cientista louco tivesse um dia chegado ao seu laboratório escuro investido em criar um atleta que incorporasse as melhores características de Roger Federer, Rafael Nadal e Novak Djokovic.

“O ténis evoluiu outra vez”, remata Rubin, talvez incrédulo como todos nós, que achávamos que o darwinismo tinha feito uma pausa para dormir uma soneca depois de afinar o Big 3.

Carlos Alcaraz, que há umas horas venceu o seu primeiro título em torneios do Grand Slam, tornando-se, de permeio, no mais jovem número 1 mundial masculino do ténis, com 19 anos e quatro meses (para se perceber a magnitude do feito, o anterior registo era de Lleyton Hewitt, que o fez com mais um ano e quatro meses que o espanhol), parece, de facto, feito de uma improvável combinação de células da solidez de fundo de court de Djokovic, da fantasia e acervo de pancadas e soluções de Federer e do peso de bola e huevos de Nadal. Isto sem nunca deixar de ser apenas um miúdo de um pueblo nas afueras de Múrcia, filho da classe média, com a sua barba adolescente e borbulhas na cara, a tornar em espectáculo cada bola, a sorrir mesmo quando perde um ponto porque o ténis é um desporto tão bonito quando bem jogado, por isso mais vale rir.

E é por isso que Carlos Alcaraz é o futuro do ténis. Exatamente por não, não parecer um robô ou uma criatura feita por um qualquer Dr. Frankenstein que leu demasiado David Foster Wallace. Ele é carne e osso, um tipo se rasga todo para chegar a uma bola e a devolve com um tweener, que arrisca as pancadas que outros temem, que ousa defender break points com drop shots. Nem sempre lhe corre bem - o pior é que muitas vezes corre -, mas é por loucuras como estas que na meia-final com Frances Tiafoe, tenista da casa, o público de Nova Iorque estava dividido, com o coração ao lado daquele rapaz transbordante de carisma e que, ainda por cima, ganha.

Mas talvez o mais impressionante na vitória de Carlos Alcaraz no domingo, frente a Casper Ruud, o norueguês que é um tenista muito mais espanhol do que o murciano, tenha sido a inteligência. Fisicamente diminuído depois de maratonas de cinco sets nos três encontros anteriores, a Alcaraz pareceu faltar frescura algures entre o segundo e o terceiro sets. Os amorties deixaram de entrar, as bolas que antes beijariam as linhas começaram a sair demasiado longas. E aí, Carlitos percebeu que tinha de deixar de ser feiticeiro para ser hitman. Mais Nadal que Federer. Mais pragmático. O derradeiro set talvez tenha ficado a dever ao espectáculo, mas Alcaraz meteu medo. Aos 19 anos, não se deixou sugar pelo abismo, teve a força mental para perceber que as finais, afinal, são para se ganhar. Aos 19 anos, volto a repetir, e naquela que é verdadeiramente a sua primeira temporada a tempo inteiro no circuito.

No seu tweet, Noah Rubin frisava que não sabia se um dia Carlos Alcaraz iria bater os recordes de Nadal, Djokovic e Federer. Ninguém sabe e nem sequer essa discussão é importante neste momento. Importante é estar cá para ver a evolução da última evolução do ténis, um tenista que, diz o seu técnico, Juan Carlos Ferrero, só está a jogar a “60% do seu potencial”. É assustador. Fascinantemente assustador. E o melhor de tudo? É muito divertido.

O que se passou

Antes de Alcaraz, outra jovem brilhou no Arthur Ashe Stadium. Iga Swiatek pode não ter o ténis vistoso do seu colega, mas aos 21 anos é indiscutivelmente a atual melhor jogadora do circuito feminino. Em Nova Iorque, venceu o seu terceiro major, o segundo do ano.

O Benfica ainda sofreu e o FC Porto e o Sporting golearam em mais uma jornada da I Liga.

Remco Evenepoel tem apenas 22 anos, diz-se há muito que é um prodígio e este domingo sagrou-se vencedor da Vuelta. Mais um de uma geração de miúdos que tomou o ciclismo a golpe de talento. João Almeida, um deles, foi 5.º.

Max Verstappen venceu o GP Itália, em Monza, o que já não é notícia nenhuma. Notícia é que o neerlandês pode sagrar-se campeão mundial já daqui a duas semanas, em Singapura.


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O que aí vem

Segunda-feira, 12
⚽ I Liga: jornada fecha com o Vizela - Estoril (20h15, Sport TV1)

Terça-feira, 13
⚽ Mais uma jornada de 🎶 CHAAAAAAAPIONS 🎶 com destaque para o Sporting - Tottenham (17h45, Eleven 1) e o FC Porto - Club Brugge (20h, TVI/Eleven 1), numa ronda em que também se joga o Bayern Munique - Barcelona (20h, Eleven 2) ou o Liverpool - Ajax (20h, Eleven 4), entre outros.

Quarta-feira, 14
⚽ Mais jogos de Champions, com o Benfica a visitar a Juventus (20h, Eleven 1). Destaque ainda para o Manchester City - Borussia Dortmund (20h, Eleven 2)

Quinta-feira, 15
⚽ Na Liga Europa, o SC Braga recebe o líder da Bundesliga, o Union Berlin (20h, SIC/Sport TV1). Joga-se ainda o Sheriff - Manchester United (17h45, Sport TV1), o Roma - HJK (20h, Sport TV3) ou o Rennes - Fenerbahçe (20h, Sport TV4)
🤾 Liga dos Campeões de andebol: Wisla Plock - FC Porto (19h45, Porto Canal)

Sexta-feira, 16
⚽ Arranca mais uma jornada da I Liga com o Portimonense - Chaves (20h15, Sport TV1)

Sábado, 17
⚽ I Liga: Santa Clara - Paços Ferreira (15h30, Sport TV3), Gil Vicente - Rio Ave (15h30, Sport TV1), Estoril - FC Porto (18h, Sport TV2), Boavista - Sporting (20h30, Sport TV1)
⚽ Na 2.ª jornada da Liga BPI, o Clube de Albergaria recebe o Benfica (11h, Sport TV2)
⚽ Na Premier League há Wolverhampton - Manchester City (12h30, Eleven 1) e na La Liga o Barcelona - Elche (15h15, Eleven 1)
🎾 Taça Davis: Portugal - Brasil (15h, Sport TV6)

Domingo, 18
⚽ I Liga: Arouca - Vitória (15h30, Sport TV1), Benfica - Marítimo (18h, BTV), Casa Pia - Famalicão (18h, Sport TV1) e SC Braga - Vizela (20h30, Sport TV1)
⚽ Serie A: Roma - Atalanta (17h, Sport TV3) e Milan - Nápoles (19h45, Sport TV2)
🏒 Campeonato de hóquei em patins começa com clássico: Sporting - FC Porto (15h, Sporting TV)
🏁 MotoGP: GP Aragão, corrida (13h, Sport TV4)

Hoje deu-nos para isto

Isabel II, sabemos, gostava mais das tradicionais corridas de cavalo do que dos desportos de massas - uma das filhas, Ana, e a filha desta, Zara, foram inclusivamente atletas olímpicas na equitação, - mas a sua vida pública está umbilicalmente ligada ao momento em que o futebol se tornou verdadeiramente na atividade extracurricular preferida dos britânicos.

O ano era 1953, a rainha tinha pouco mais de um ano de reinado e ainda nem sequer havia sido coroada quando entregou o ceptro a outro rei, na final da FA Cup. Stanley Matthews era então um já veterano capitão do Blackpool, venerado no país mas sem qualquer troféu importante no currículo. E num estádio de Wembley com 100 mil súbditos nas bancadas (e outros 10 milhões a assistir pela BBC), “O feiticeiro do drible” foi decisivo para a vitória por 4-3, com a rainha, na tribuna de honra, dar em mãos a desejada taça ao avançado, já com 38 anos.

Diz-se que foi esse jogo que uniu o reino em torno de uma jovem monarca e trouxe de novo a esperança ainda nos despojos da II Guerra Mundial. Treze anos mais tarde, naquela mesma tribuna, Isabel II, que partiu aos 96 anos na quinta-feira, entregaria o troféu Jules Rimet a Bobby Moore, capitão de Inglaterra, após a final do Mundial de 1966.

Stanley Matthews a receber o troféu de vencedor da FA Cup das mãos de uma então muito jovem Rainha Isabel II

Stanley Matthews a receber o troféu de vencedor da FA Cup das mãos de uma então muito jovem Rainha Isabel II

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E já agora, se ainda não escutou, temos um novo podcast (esta semana sairá o 6.º episódio) chamado A Culpa é do Árbitro, com Duarte Gomes, onde as regras e as leis do jogo são protagonistas, com o tom pedagógico que tantas vezes falta ao nosso futebol.