Tribuna 12:45

O principio do fim de uma era da Liga dos Campeões

O principio do fim de uma era da Liga dos Campeões

Pedro Barata

Jornalista

Desta época para a próxima, só o troféu orelhudo da Champions permanecerá inalterado na prova-rainha da UEFA
Valerio Pennicino - UEFA/Getty

É simples: 32 equipas divididas em oito grupos de quatro, apurando-se as duas melhores de cada pool para o mata-mata, composto por três eliminatórias em sistema de casa e fora antes da final. Nos últimos 20 anos, foi este o formato da Liga dos Campeões. Houve ajustes — as ligas mais poderosas foram tendo cada vez mais vagas diretas, o pote 1 deixou de ser escolhido por coeficiente e passou a ter os vencedores dos campeonatos mais cotados e o da Liga Europa, as míticas 19h45 deixaram de ser o único horário dos encontros —, mas, no essencial, a Champions está igual desde 2003/04, a época da glória do FC Porto.

Pois bem, quando amanhã o Young Boys - RB Leipzig e o AC Milan - Newcastle começarem, esta Liga dos Campeões terá o começo do seu fim. Assistimos, há semanas, ao último sorteio da fase de grupos da história; agora, até dezembro, veremos a derradeira fase de grupos.

A partir de 2024/25, a competição mudará. O primeiro câmbio será no número de participantes, crescendo de 32 para 36. Duas das quatro vagas adicionais irão para as duas ligas cujas equipas tiverem obtido mais pontos na anterior época europeia. Acrescentar-se-á também o terceiro classificado do quinto melhor campeonato do ranking, que neste momento é a Ligue 1, e mais um conjunto do chamado caminho dos campeões nas pré-eliminatórias, destinado a vencedores de ligas fora da elite continental.

Mas a maior alteração será outra. A fase de grupos será substituída por uma classificação corrida de 36 equipas. Cada uma jogará oito partidas para tentar aceder à fase a eliminar, ao contrário das atuais seis. Os primeiros oito dos 36 irão para os oitavos de final. Os colocados entre a nona e a 24.ª posição irão competir num play-off para apurar os oito restantes integrantes dessa eliminatória.

O novo formato da Liga dos Campeões, numa ilustração do The Athletic.

Ilustração do formato da Liga dos Campeões a partir de 2024/25
The Athletic

A grande justificação para estas mexidas? Bem, é simples. Mais jogos significam mais dinheiro. Os atuais 125 encontros darão lugar a 189 e a UEFA estima que a atual receita de €3,6 mil milhões possa crescer cerca de 33%.

A confeção deste modelo surgiu depois de uma das mais importantes guerras já travadas no futebol europeu — e que ainda não terminou. Em 2019, quando a UEFA começou as negociações para o novo modelo da Liga dos Campeões, a Superliga pairava como um perigo não propriamente visível, uma carta na manga dos mais poderosos para que a nova Champions fosse do seu agrado, sempre chantageando com a possibilidade de, caso o desenho renovado do torneio não fosse o desejado, abandonarem o barco e criarem a sua prova.

O figurino inicial da competição pós-2024 pretendia agradar aos chamados super clubes. Havia 10 partidas na primeira fase, e não oito, e, sobretudo, uma particularidade. Eram reservadas vagas para o coeficiente histórico, isto é, os clubes com mais pontos acumulados nos últimos cinco anos de ranking UEFA que não tivessem garantida qualificação tinham, à mesma, bilhete assegurado. Uma forma encapotada de proteger um Real Madrid ou uma Juventus de um mau ano que os colocasse de fora.

Só que, na primavera de 2021, o que era um jogo de póquer, cheio de insinuações e bluffs, tornou-se num conflito aberto. A criação da Superliga ditou que Aleksander Ceferin rompesse com as negociações com os super clubes, cortando relações com o seu outrora grande amigo Andrea Agnelli, pondo fim a uma relação que até levou o presidente da UEFA a ser padrinho de uma das filhas do então presidente da Juventus. Desapareceram as ideias dos coeficientes históricos ou da primeira fase com 10 encontros.

A guerra não terminou, os clubes mais poderosos não desistiram de ter mais boias de salvação que os privem da injustiça suprema que é não terem vagas garantidas para uma competição para a qual não se classificaram, a UEFA continuará a tentar explorar ao máximo o seu produto mais rentável, tentando ganhar força no braço de ferro que, por sua vez, tem com a FIFA.

Uma fonte ligada ao grupo que ainda tenta lutar pela existência da Superliga entrou, na semana passada, em contacto com a Tribuna Expresso. “Veja este artigo jurídico sobre o conflito, é interessante”, dizia, cheio das subtilezas destas guerras palacianas. Nos bastidores do futebol europeu, continua a haver uma luta por poder. E dinheiro.

Em 1955, no Jamor, um Sporting - Partizan inaugurou a Taça dos Clubes Campeões Europeus. Com as suas mexidas e revoluções, foi o primeiro passo para décadas e décadas atrás desta ideia de termos os melhores clubes do continente a discutirem um troféu. Dois anos antes do Tratado de Roma, que criou a Comunidade Económica Europeia, já esta parte do mundo, que há bem pouco tempo vivia o horror da guerra, se tentava unir em redor da bola. Armas trocadas por botas de futebol não é um mau avanço civilizacional.

Em 2023, a Liga dos Campeões é, cada vez mais, uma competição elitista. É difícil sonhar com a glória em Lisboa, em Glasgow ou em Belgrado. Com os mais poderosos cada vez mais poderosos — o último clube fora das big 5 a estar na final foi o FC Porto —, o novo formato dará ainda mais margem aos mais ricos para corrigem percalços e deslizes. E há mais coisas a acontecer para lá do campo. Será o próximo ciclo da Champions o último sem a presença de clubes sauditas, que poderão comprar alguns bilhetes na competição? Veremos uma final four em Riade ou Miami?

Bem-vindo, começo do fim desta Liga dos Campeões. Não deixa de ser simbólico que este fechar de ciclo coincida com a primeira temporada em que nem Cristiano Ronaldo, nem Lionel Messi a disputam desde… 2002/03, antes do arranque destes 20 anos. O argentino e o português venceram oito dos 11 troféus entre 2007/08 e 2017/18, são os dois melhores marcadores da história do grande palco continental, marcos indeléveis de um tempo.

O futuro próximo da competição das estrelas está em 2024. Para lá disso, há um horizonte de dúvidas, de questões, de possibilidades desenhadas pela força de interesses além da bola, de geopolítica e sportswashing. Sabe bem sentar-se no sofá a desfrutar do espetáculo de De Bruyne e Mbappé, de João Félix e Bruno Fernandes, de Di María, Taremi e Bruma. Mas há outras guerras mais ou menos conhecidas a serem travadas no futebol europeu. E, por muito que as ignoremos, o seu desfecho ditará o alcance dos sonhos que se poderão, no futuro, ter em Lisboa, em Glasgow ou em Belgrado.

O que se passou

A seleção de râguebi voltou ao Mundial, com uma muito digna exibição na derrota contra o favorito País de Gales. Antes disso, na preparação para França, o Diogo Pombo falou com Patrice Lagisquet, o selecionador, esteve por dentro de um treino da equipa e tentou perceber o que mudou entre as gerações de 2007 e de 2023.

O Benfica bateu o Sporting e venceu a Supertaça, no mais visto jogo de sempre de futebol feminino em Portugal. Antes disso, também houve história no masculino: a seleção registou a sua maior goleada de sempre, num 9-0 contra o Luxemburgo em que se evidenciaram novas virtudes num jogo sem Cristiano Ronaldo.

Neemias Queta foi dispensado pelos Sacramento Kings, mas dizem as notícias do lado de lá do Atlântico que deverá continuar na NBA, nos míticos Boston Celtics. Há um par de semanas, a Lídia Paralta Gomes esteve com o gigante português a falar sobre o mundo da bola laranja norte-americana.

Zona mista

Descobri um novo nível de auto-confiança, um novo eu, uma nova forma de correr, encontrei possibilidades em mim que desconhecia

A frase de Sepp Kuss demonstra como, para o surpreendente vencedor da Vuelta 2023, as últimas três semanas foram mais do que 21 etapas pelos caminhos de Espanha, mas sim uma viagem de exploração do total potencial de um norte-americano que já era um dos melhores trepadores do mundo, mas até agora se dedicava a ajudar nos triunfos dos outros. Prejudicado por um dia em que, engripado, perdeu muito tempo, João Almeida foi 9.º e Rui Costa venceu uma etapa na corrida que, em 2024, partirá de Lisboa.

O que vem aí

Segunda-feira, 18

⚽ A 5.ª jornada da I Liga fecha com o Boavista-Desp. Chaves (20h15, Sport TV1).

Terça-feira, 19

⚽ Arranca a fase de grupos da Liga dos Campeões e o FC Porto joga contra o Shakhtar Donetsk (20h, Eleven Sports1) em Hamburgo, na Alemanha, casa emprestada ao clube ucraniano. À mesma hora, há o apetitoso duelo entre o PSG e o Borussia Dortmund (Eleven Sports3). Mais cedo, destaque para a receção do AC Milan ao Newcastle (17h45, Eleven Sports2).

Quarta-feira, 20

⚽ Na Liga Conferência, um duelo entre treinadores portugueses: o Lille de Paulo Fonseca recebe o Olimpija Ljubljana de João Henriques (15h30, Sport TV1). Na Champions, temos o invulgar de duas equipas portuguesas a jogarem no mesmo dia, à mesma hora (20h): o SC Braga acolhe o Nápoles (TVI) e o Benfica é anfitrião do RB Salzburgo (Eleven Sports1).
🏉 Feita a segunda paragem para o descanso dos matulões, regressam os jogos no Mundial de râguebi, ainda na fase de grupos, com o Itália-Uruguai (16h45, Sport TV).

Quinta-feira, 21

🏉 Mundial de râguebi: França-Namíbia (16h45, Sport TV).
⚽ O Sporting arranca a campanha na fase de grupos da Liga Europa na Áustria, com uma visita ao Sturm Graz (20h, SIC).

Sexta-feira, 22

🏉 Mundial de râguebi: Argentina-Samoa (16h45, Sport TV).
⚽👩 A seleção nacional feminina joga contra a França (20h10, RTP1) no arranque da primeira Liga das Nações jogada por mulheres.
⚽ Arranca a 6.ª jornada da I Liga com o Famalicão-Arouca (20h15, Sport TV),

Sábado, 22

🏉 Dia do segundo jogo de Portugal no Mundial de râguebi, contra a Geórgia (13h, RTP). Depois, também há o Inglaterra-Chile (16h45, Sport TV) e o África do Sul-Irlanda (20h, Sport TV).
⚽ Mais I Liga: Moreirense-Farense (15h30, Sport TV5), Estoril Praia-Vizela (15h30, Sport TV1), Casa Pia-Vitória (18h, Sport TV4) e FC Porto-Gil Vicente (20h30, Sport TV1).

Domingo, 23

🏎️ Grande Prémio do Japão em Fórmula 1 (6h, Sport TV).
🏍️ No Moto GP, é dia do Grande Prémio da Índia (11h, Sport TV).
🏉 Mais Mundial de râguebi: Escócia-Tonga (16h45, Sport TV) e País de Gales-Austrália (20h, Sport TV).
⚽ Mais I Liga: Desp. Chaves-E. Amadora (15h30, Sport TV4), Portimonense-Benfica (18h, Sport TV1) e SC Braga-Boavista (20h30, Sport TV2).

Hoje deu-nos para isto

Não devem ter havido muitos acontecimentos desportivos que, no século XXI, tenham tido tanto impacto no crescimento de uma modalidade como o Mundial de râguebi de 2007. A emoção daqueles gigantes sensíveis a cantar o hino, a audácia de um grupo de amadores a medir forças contra a Nova Zelândia, o poder de comunicação de Tomaz Morais, a identificação nacional com uma equipa de advogados e médicos no maior palco de todos: aquela estreia em França foi um cacharolete de ingredientes que deu um enorme impulso ao jogo da bola oval.

Subitamente, entre os adolescente e pré-adolescentes daquela altura, entre os que constava o autor destas linhas, o râguebi tornou-se uma moda. Houve colegas de escola a trocar o sempre presente futebol pelo râguebi, gente que foi atrás do entusiasmo da ocasião para ficar ou somente para andar por lá uns meses e desistir, com a inconsistência própria da idade. Mas, naquele verão/outono de 2007, havia a convicção de que os “lobos” jogaram em mais do que um Mundial — estavam em campo pelo futuro do râguebi nacional.

Era fácil pensar nisto na tarde de sábado. Há quem esteja em 2023 e tenha começado a jogar por causa de quem jogou em 2007. E, no sábado, com transmissão em canal aberto, uma exibição entusiasmante, uma imagem de combatividade, qualidade e garra, a ideia de uma seleção a atuar, também, em nome do futuro estava presente.

Eles continuam a ser, quase todos, amadores. Jogadores em part time a medirem forças contra a elite da elite. Ter estado mais de duas semanas na Nova Zelândia, em julho, deu para perceber a dimensão que o râguebi tem naquela parte do mundo, altamente mediatizado, um jogo e um negócio nacional. É nesse campo de jogo desigual que a seleção entra e, mesmo assim, consegue inspirar. Só por isso merecem a nossa admiração.

A seleção de râguebi a cantar o hino antes do jogo contra a Escócia, em 2007
Richard Heathcote/Getty

Aponte na agenda: Portugal voltará a jogar dia 23 de setembro, às 13h00, contra a Geórgia.

Tenha uma boa semana de começo da Liga dos Campeões 2023/24. Obrigado por nos acompanhar desse lado, lendo-nos no site da Tribuna Expresso, onde poderá seguir a atualidade desportiva e as nossas entrevistas, perfis e análises. Siga-nos também no Facebook, Instagram e no Twitter.

Tem alguma questão? Envie um email ao jornalista: tribuna@expresso.impresa.pt