Em Alvalade não há nordic noir, só alegria escandinava
PATRICIA DE MELO MOREIRA
Vitória por 3-0 do Sporting frente ao Moreirense num encontro em que a sociedade do norte da Europa constituída por Hjulmand e Gyokeres colocaram o jogo leonino num patamar talvez ainda não visto esta época
Tensão sombria, penumbra permanente, um eterno nevoeiro, complexidade gélida. Tudo isto são características da literatura nórdica noir, feita de polícias soturnos e assassinos despojados de sentimentos. Mas, ao nível da Escandinávia, não é nada disso que se vê por Alvalade.
E daí talvez seja. É difícil olhar para Hjulmand e não ver ali uma frieza admirável, a cada corte corajoso e providencial, a cada risco calculado e ao mesmo tempo afoito no passe longitudinal. No ritmo de roda dentada oleada que dá ao jogo. Ou não ficar assustado com a força inesgotável de Gyokeres, da luta que dá a cada duelo, a cada movimento, com as arrancadas potentes que abrem espaços para que outros, não só ele, também possam brilhar, na mais perfeita social-democracia do norte da Europa em versão futebol.
Acontece que aqui não há sombras ou sustos, o brilho nórdico desta equipa é alegre quando se olha para o resultado, para o que ele traz ao Sporting, às bancadas de Alvalade que já os veneram. São de Hjulmand e de Gyokeres os dois primeiros golos que desbloquearam o jogo com o Moreirense, ainda dentro dos primeiros 20 minutos da 2.ª parte, e foram esses golos que resolveram o mistério e o quebra-cabeças em que se estava a tornar um encontro em que o Sporting foi surpreendido logo à entrada pelo Moreirense - forte numa primeira linha de pressão a dois e com um par de remates, um deles ao poste, a abrir o jogo - e, depois de estancar o mau arranque, se viu desesperado em falhanços, bolas aos ferros e duas ou três intervenções de nível do guarda-redes Kewin Silva.
PATRICIA DE MELO MOREIRA
Nessa 1.ª parte, já o meio-campo do Sporting era dirigido, numa chefia discreta mas eficaz, por Hjulmand, a servir como uma espécie de pivô no corredor central, um gasoduto por onde passava boa parte da corrente atacante da equipa da casa. Morita, braço direito no meio-campo, esteve também sempre muito em jogo, e é dele a primeira grande oportunidade do Sporting (14’), com uma bola ao poste e uma recarga que Kewin defendeu. Hjulmand teve também a sua muito particular bola ao ferro (29’), num remate cheio de efeito, dando evidências, confirmadas mais tarde, que o dinamarquês tem golo, algo que o distingue de Palhinha e Ugarte.
À meia-hora de jogo, o Sporting teve um golo anulado e anulado seria mais uma vez por Kewin Silva, que pouco antes do apito para o intervalo defendeu um primeiro remate de Nuno Santos para depois fazer novamente frente a Morita, no tiro de ressaca.
O início difícil parecia ultrapassado, mas o Sporting da 1.ª parte estava entre o perro do início e o pouco eficaz do final. De regresso para a 2.ª parte, Gyokeres falhou por pouco um remate de cabeça, mesmo antes de Gonçalo Franco quase surpreender o Sporting após uma saída de Adán da baliza para um corte. Um aviso para o Sporting de que este podia ser um daqueles dias.
PATRICIA DE MELO MOREIRA
Não seria. Aos 55’, um alívio para zona complicada e uma tentativa atrapalhada de Gyokeres de reaver a bola tornaram-se, subitamente, numa assistência involuntária para o aparecimento de Hjulmand à entrada da área. O remate saiu tenso e rasteiro e, à segunda, o dinamarquês marcava mesmo. Poucos minutos depois, Gonçalo Inácio lançou Nuno Santos na profundidade, onde voltou a fazer estragos, o ala picou o cruzamento e lá estava o tanque Gyokeres para o 2-0.
Ao contrário de outros jogos, a vantagem de 2-0 deu força ao Sporting, que buscou intensamente mais golos. O Moreirense audaz do início da 1.ª parte mal se viu, mas mérito para a equipa minhota, que foi a Alvalade tentar discutir o jogo. A barra ainda negou, novamente, mais um golo ao Sporting, por Paulinho aos 79’, e o 3-0 apareceu no último lance do jogo, por Diomande (curiosamente com formação nórdica também), após um canto.
Jogo muito bem controlado pelo Sporting, principalmente na 2.ª parte e depois de afastar o arranque forte do Moreirense no jogo. Sem nevoeiros ou suspense, mas com dois nórdicos capazes de enterrar um adversário à base de planos bem gizados e uma força inesgotável.