Antoine, o todo-o-terreno
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12.12.2022
Um dos vídeos mais bonitos que a internet - e aqui falo em modo sinédoque - já produziu é assim: Moutinho ganha a bola, dá para William Carvalho, este, com aquela leveza que ainda hoje traz no pé, passa para Ricardo Quaresma que devolve de primeira para João Moutinho. O médio vê Éder, entrega a bola ao avançado, que ganha posição a Koscielny e remata. Explodem os festejos.
Tudo isto fica mais emocionante em slow motion, com “Acção” de Carlos Paredes como pano de fundo, porque dá-lhe aquela aura de vídeo mais português de sempre sobre o acontecimento menos português de sempre. Volto a ele amiúde, principalmente nestes momentos em que somos portugueses quando tínhamos tudo para não sermos portugueses, mas sobre a eliminação da seleção nacional já aqui versámos.
Mas trago este vídeo porque nele há um outro protagonista involuntário, com sangue português também. Antoine Griezmann é o francês que perde a bola na disputa com João Moutinho. Nos dias seguintes àquela final de 2016, terá acordado a desoras, levantado por suores frios e recordações daquela bola que lhe fugiu. Mas dois anos depois estaria a levantar a taça de campeão do mundo no imponente Luzhniki de Moscovo, sob chuva diluviana.
E quatro anos depois do Mundial da Rússia, não sei se Antoine Griezmann não é o meu jogador preferido do Mundial do Catar.
OK, não será a opinião mais popular e eu percebo. Há Messi, há Modric, há Mbappé. Talvez tenha ficado demasiado agarrada ao lance do primeiro golo de Mbappé frente à Polónia, que começa num alívio do avançado, que forjado junto ao mar em San Sebastian, na área adversária. Porque esse lance diz-nos tudo sobre o que tem sido Griezmann neste Mundial: um todo-o-terreno que assumiu um papel mais recuado face à escassez de talento no meio-campo gaulês, tornando-se médio de ligação, de equilíbrios, segundo avançado, extremo direito, primeiro homem da defesa, distribuidor de jogo, entregador de bolinhas redondas para golo. Contra a Inglaterra, foram mais duas assistências, tem agora 28 com a camisola francesa, mais que Henry, mais que Zidane.
Se esta França se arrisca a ser novamente campeã mundial é também porque tem Griezmann. Nisso, todo o mérito para o jogador, perfeitamente adaptado a qualquer papel, depois de um início de época irregular no At. Madrid, amarrado pelos ditames de uma luta contratual entre os colchoneros e o Barcelona. No Catar, libertou-se. E mérito de Didier Deschamps que, entre as mil e uma lesões de centrocampistas gauleses, sacou a melhor das soluções dentro do próprio grupo.
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Este é mais um daqueles chatos dias de transição do Mundial, antes das meias-finais arrancarem a todo o gás amanhã. Mais tempo para nos prepararmos psicologicamente para o duelo Messi/Modric. Ou chorar, porque um deles irá embora.
A foto

O avião da seleção nacional regressou a Lisboa com boa parte dos lugares vazios e sem taça, mas com Pepe a dar a cara por uma equipa que encantou e desiludiu e sobre a qual há muito por definir nos próximos dias. O Mundial que se joga já bem longe de Doha
TIAGO PETINGA
O nosso Hugo Tavares da Silva já está de regresso a Portugal, mas a atualidade e as grandes histórias do Mundial continuarão a ser protagonistas aqui na Tribuna e nesta nossa/vossa newsletter diária.
Muito obrigado por continuar aí desse lado no dia que marca o arranque da última semana do Mundial do Catar.