Tribuna 12:45

Nos Jogos Olímpicos somos todos iguais, mesmo que uns sejam mais iguais do que outros

Aqui estão algumas das estrelas dos Jogos Olímpicos de Paris, nas fotos que figurarão nas suas acreditações

Como pessoa que já teve a oportunidade de cobrir dois Jogos Olímpicos, posso garantir-vos que uma das partes mais arreliadoras e que demoram mais tempo na preparação para a aventura é o aparentemente simples processo de enviar uma foto para a acreditação que esteja em conformidade com as regras do Comité Olímpico Internacional. Tem de ser em fundo branco. A cara tem de estar totalmente visível, sem anárquicos fios de cabelo a visitarem milímetros do rosto. Mostrar dentes é ultrapassar uma linha vermelha gravíssima. Não pode haver a mínima sombra na imagem, que não pode ter alterações photoshopeicas e que tem de chegar aos headquarters do COI com medidas padrão específicas, com um número de pixels que não ultrapassem valor xis. Muitas vezes, a primeira foto vem para trás, devolvida por ciosos burocratas do COI. Nem sempre a segunda versão leva visto bom e damos por nós, vencidos pelo cansaço, a enviar finalmente uma foto em que nem sequer estamos bem, mas que cumpre com as regras. Durante as semanas seguintes, aquele será o nosso cartão de visita, colocado ao peito, que abre portas e nos permite navegar na complexa rede olímpica de uma cidade específica.

O mesmo acontece com os atletas. As fotos das acreditações dos homens e mulheres que durante duas semanas (às quais eu normalmente chamo de “Natal”) vão desunhar-se para darem a melhor versão de si próprios na maior competição desportiva planetária são por isso uma espécie de atestado de democracia: até as maiores estrelas, habituadas aos holofotes e às sessões fotográficas mais profissionais, com maquilhagem e iluminação perfeitas, dão por si de olhar vago, cor de pele algo pálida, de olheiras proeminentes, cara indefinida e encostados a uma indistinta parede branca. Seja uma estrela do ténis, como são Carlos Alcaraz, Novak Djokovic ou Rafael Nadal, seja Simone Biles, Tadej Pogacar ou LeBron James, só para falar de alguns dos exemplos que estão na foto que embeleza esta newsletter, ou um qualquer atleta anónimo do pentatlo moderno ou da luta greco-romana, todos os olímpicos são, pelo menos aqui, iguais.

E isso é uma das coisas maravilhosas dos Jogos Olímpicos, que arrancam já na sexta-feira (antes já há futebol, andebol e râguebi), com uma cerimónia de abertura que vai assaltar o Rio Sena. Talvez isto também faça parte do tal “espírito olímpico”, conceito complexo. Muitas das maiores estrelas do desporto, que não precisariam de medalhas olímpicas para o serem, chegam aos Jogos com o brilho nos olhos de uma criança sonhadora. O torneio olímpico de ténis não oferece pontos para o ranking mundial, mas ainda assim os melhores estarão em Paris, porque o peso de uma medalha olímpica ao peito, conquistada pelo país, uma oportunidade que aparece apenas de quatro em quatro anos, é diferente de tudo, até de ganhar Wimbledon. Mas um Djokovic ou um Stephen Curry, quatro vezes campeão da NBA, não serão necessariamente mais vistos na televisão do que um atleta que muito boa gente nem sabe quem é, mas que estará na final dos 100 metros, a prova-rainha dos Jogos Olímpicos, que em menos de 10 segundos aglutina milhões em frente a um ecrã.

É claro que, mesmo nos Jogos Olímpicos, há atletas que são mais iguais do que os outros, mas naquelas semanas, em que uma jovem atleta da ginástica dará por si na cantina da aldeia olímpica a almoçar ao lado de Rafael Nadal ou que um qualquer miúdo do polo aquático estará a desfilar na companhia de uma Simone Biles, os desportistas serão todos um pouco mais iguais uns aos outros.

Para quem gosta de desporto, não há nada como uns Jogos Olímpicos. Numa nota mais pessoal, digo-vos que profissionalmente nunca fui tão feliz quanto naqueles dias no Rio ou em plena pandemia em Tóquio, fosse fugindo à chuva torrencial ou com sol de 40 graus a provocarem-me escaldões épicos, caminhando quilómetros com quilos às costas de máscara na cara, festejando o meu aniversário longe da família enquanto assistia a provas de dressage ou sentada na zona internacional da aldeia olímpica vendo passar Pau Gasol (disse-lhe olá e disse olá de volta, simpático) ou Novak Djokovic. Para um atleta nada é tão intenso quanto estar ali, as vitórias são mais epopeicas, porque foram quatro anos a preparar aquilo, e as derrotas são mais agonizantes, porque foram quatro anos a preparar aquilo. Na aldeia olímpica, uma estrela da NBA terá as mesmas condições para viver e dormir que um atleta da natação que talvez nem das eliminatórias passe - bem, talvez uma cama ligeiramente maior - e um norte-americano estará no mesmo ambiente que alguém do Uzbequistão. Há três anos, em Tóquio, o jogo de basquetebol entre os Estados Unidos e o Irão deve ter feito mais pela diplomacia internacional do que décadas de cimeiras.

Posto isto, aproveitem o melhor do desporto nos próximos dias, de 26 de julho a 11 de agosto, que por cá serão de trabalho intenso, mas também muito prazer, a descobrir novas estrelas e a confirmar o brilho de outras mais consolidadas. Acompanhe aqui toda a cobertura da Tribuna Expresso, que terá o Pedro Barata na cidade luz a trazer luz sobre tudo o que se passa nos Jogos Olímpicos de Paris 2024.

O que se passou

Sporting, Benfica e FC Porto já preparam a nova época, com miúdos, caras novas e resultados, para já, positivos

Mbappé chegou ao Santiago Bernabéu, onde sempre parece ter pertencido, e foi apresentado como reforço do Real Madrid

A seleção nacional de râguebi perdeu contra a bicampeã mundial África do Sul, mas voltou a mostrar que é uma equipa sem medo

Aos 23 anos, Oscar Piastri tornou-se no primeiro piloto nascido no século XXI a vencer uma corrida na Fórmula 1

Zona mista

Nos últimos dois anos temos ouvido que esta é a melhor era do ciclismo e, se não estivesse eu próprio a competir, diria o mesmo

E mesmo competindo nela, Tadej Pogacar pode dizer isto e muito mais. O indomável esloveno alambazou-se de seis etapas no Tour, depois de outras seis do Giro, fazendo a dobradinha nas duas mais importantes provas por etapas do ciclismo e acabando aparentemente fresco que nem uma alface na sua terceira vitória na Volta a França. Mas além dele há Vingegaard, Evenepoel, João Almeida, Ayuso, Roglic, Van der Poel, Philipsen, Wout van Aert e tantos outros que nem há espaço para escrever.

O que aí vem

Segunda-feira, 22
🎾 ATP 250 Kitzbuhel (14h, Sport TV2) e de Umag (15h30, Sport TV5)

Terça-feira, 23
⚽ O FC Porto joga com o Sturm Graz (18h, Sport TV1) e o Sporting com o Sevilla (20h30, TVI) em jogos de preparação para a nova época

Quarta-feira, 24
⚽ Os Jogos Olímpicos só começam oficialmente na sexta-feira, mas o torneio olímpico de futebol antecipa-se: acompanhe o Argentina-Marrocos (14h, Eurosport), o Egito-Rep. Dominicana (16h, Eurosport), o Iraque-Ucrânia (18h, Eurosport) e o França-Estados Unidos (20h, Eurosport)
🚴 Começa a Volta a Portugal 2024, com o prólogo em Águeda (15h, RTP1)

Quinta-feira, 25
⚽ O SC Braga inicia a sua caminhada europeia na 2.ª pré-eliminatória da Liga Europa, frente ao Maccabi Petah Tikva (20h30, Sport TV1)
⚽ Euro 2024, torneio feminino de futebol: Espanha-Japão (14h, Eurosport), Alemanha-Áustria (18h, Eurosport) e França-Colômbia (20h, Eurosport)
🤾 Paris 2024, torneio feminino de andebol: Países Baixos-Angola (9h30, Eurosport)

Sexta-feira, 26
⚽ A Cerimónia de Abertura de Paris 2024, em pleno Rio Sena, dá o tiro de partida aos Jogos Olímpicos (18h30, RTP1/Eurosport 1)

Sábado, 27
⚽ Torneio Cinco Violinos: Sporting-Ath. Bilbao (19h30, Sport TV1)
🤸🏿 Paris 2024, ginástica: qualificação masculina (1oh e 14h30, Eurosport)
🏊 Paris 2024, natação: eliminatórias (10h, Eurosport)
🛹 Paris 2024, skate: Gustavo Ribeiro tenta qualificação para a final, à tarde (11h, Eurosport)
🥋 Paris 2024, judo: finais (15h, Eurosport)
🏁 F1: GP Bélgica, qualificação (15h, Sport TV4)

Domingo, 28
⚽ Apresentação do FC Porto, frente ao Al Nassr (18h30, Sport TV1)
🤸🏿 Paris 2024, ginástica: qualificação feminina, com Filipa Martins (8h30, Eurosport)
⚽ Euro 2024, torneio feminino: Brasil-Japão (16h, Eurosport)
🏁 F1: GP Bélgica, corrida (14h, Sport TV4)

Hoje deu-nos para isto

Chamem-lhe 10 de junho do desporto, talvez até 29 de setembro (nesse dia, em 2013, Rui Costa foi campeão mundial de ciclismo horas depois de João Sousa se tornar no primeiro português a vencer um torneio ATP). O dia 21 de julho de 2024 ficará também na história do desporto português, porque será para sempre o dia em que João Almeida confirmou o histórico 4.º lugar na Volta a França, o melhor resultado de um ciclista nacional em 45 anos num dos mais importantes eventos anuais do desporto - e o ciclista das Caldas já sabe o que é ser top 5 nas três principais voltas, o que é obra.

Será também o dia em que Nuno Borges se tornou apenas no segundo português a vencer um torneio ATP, em Bastad, com o lacinho no topo do presente a ser o adversário que estava do outro lado da rede: um tal de Rafael Nadal. É certo estamos a falar de um Nadal diminuído fisicamente, em plena digressão de despedida, mas os nomes têm força e não tremer contra o melhor jogador de terra batida da história impressiona.

E ainda houve um título de campeões da Europa sub-17 em hóquei em patins, onde sempre tivemos tradição e, por isso mais impressionante, novamente um 2.º lugar no Europeu sub-20 de andebol, modalidade onde o crescimento de Portugal nos últimos anos é assinalável.

Melhor ainda é percebermos que vêm aí mais nomes, mais gente cheia de talento. Hoje falamos de João Almeida e amanhã poderemos estar a falar de António Morgado, que aos 20 anos já tem resultados de relevo no ciclismo sénior. E na caminhada para o título em Bastad, Nuno Borges sofreu contra o compatriota Henrique Rocha, de 20 anos, seu companheiro de treinos no Jamor.

A poucos dias dos Jogos Olímpicos, o desporto dá-nos motivos de orgulho. Mais virão nas próximas semanas, esperemos!

Tim de Waele

Tenha uma boa semana, a melhor semana a cada quatro anos para aqueles que amam os Jogos Olímpicos, e obrigado por nos acompanhar aí desse lado, lendo-nos no site da Tribuna Expresso, onde poderá seguir a atualidade desportiva e as nossas entrevistas, perfis e análises. Siga-nos também no Facebook, Instagram e no Twitter.

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