Crónica de Jogo

João Mário e Galeno contra a tristeza do FC Porto

João Mário e Galeno contra a tristeza do FC Porto
Diogo Cardoso/Getty

Com cada um dos protagonistas da noite a somar um golo e uma assistência, os azuis e brancos voltaram, duas jornadas depois, aos triunfos na I Liga, batendo o Estrela (2-0). Num encontro em que se notou o ambiente pouco crente no Dragão, o FC Porto suavizou o momento que Conceição recusa ser de crise

João Mário e Galeno contra a tristeza do FC Porto

Pedro Barata

Jornalista

Há festejos de golo que escondem mensagens, quais pistas para entender o momento das equipas. Quando Galeno fez o 1-0 contra o Estrela da Amadora, a celebração do FC Porto foi contida, sem euforias nem muitos sorrisos, quase como, mais do que um grito de alegria, houvesse ali um pedido de desculpas.

O 2-0, apontado por João Mário, repetiu protagonistas — Galeno esteve envolvido no 2-0, tal como João Mário estivera no 1-0 —, mas não exatamente celebração. Ali já houve mais raiva, mais descarga emocional, mas também não se viu um transbordar de felicidade.

Sérgio Conceição rejeita haver uma crise no FC Porto e assegura que, aqui, “ninguém atira a toalha ao chão”. Seja como for, dentro do cumprir da obrigação que foi a vitória (2-0) contra o Estrela, o desafio serviu para radiografar o momento triste dos azuis e brancos.

As bancadas, com muitos lugares despidos, parecem descrentes; os jogadores, com um jogo pouco criativo, atuam com timidez; Taremi, o tal cujo “compromisso” é defendido pelo treinador, ficou a noite toda no banco, de mirada perdida; a tabela classificativa, depois de só se somar um ponto em duas jornadas, convida ao pessimismo.

Neste cenário, João Máro e Galeno emergiram para reencontrar as vitórias. Frente a um Estrela da Amadora que só fez dois remates à baliza em toda a partida, foi suficiente para estancar a hemorragia a poucos dias de receber o Arsenal, na primeira mão dos oitavos-de-final da Liga dos Campeões.

Galeno remata para o 1-0
MANUEL FERNANDO ARAUJO/Lusa

Fiel ao ambiente frio e apagado, o arranque de desafio foi, também, cinzento, sem rasgo ou arte. Nos primeiros 30', raros foram os lances de perigo, com os locais a só ficarem verdadeiramente perto do golo logo aos 6', quando Francisco Conceição cruzou e o remate de Evanilson só foi parado por uma grande defesa de Bruno Brígido.

A circulação de bola do FC Porto era quase sempre lenta e previsível, ausente de inspiração. O Estrela da Amadora, que tenta manter-se na I Liga maximizando os (escassos) recursos que Sérgio Vieira tem, procurou ser organizado e espreguiçar-se no terreno em ataques rápidos, justamente a fórmula na génese do momento mais perigoso dos visitantes.

Aos 29', os dragões ficaram a pedir falta sobre Galeno quando o Estrela partiu para o contra-ataque. André Luís, lançado na correria durante metade do terreno, só viu a sua finalização ser travada por Zaidu, titular devido ao castigo de Wendell. Na sequência do corte, o nigeriano teve de sair lesionado, sendo transportado de maca. Nova nota triste para um ambiente carente de alegrias.

Zaidu saiu do relvado de maca
MANUEL FERNANDO ARAUJO/Lusa

Jorge Sánchez estrou para a esquerda da defesa mas, pouco depois do infórtunio, chegou o 1-0. João Mário e Francisco Conceição combinaram na direita, o destro rematou para corte de Pedro Mendes e Galeno, sem problemas, abriu o ativo.

No eixo de defesa do FC Porto, Otávio estreou-se. Com Fábio Cardoso castigado, o ex-Famalicão teve a primeira oportunidade. Na etapa inicial, sofreu com o encorpado Ronaldo Tavares, que forçou Diogo Costa a uma grande defesa perto do descanso. O guardião pouco mais trabalho teria até ao pito final.

Antes do descanso, ainda haveria tempo para Francisco Conceição desperdiçar na cara de Brígido, tal como, no arranque da segunda parte, Galeno não conseguiu bisar. O 2-0 que praticamente selou a vitória seria de outro protagonista.

Otávio estreou-se pelo FC Porto
Diogo Cardoso

João Mário sempre foi tímido. Os que com ele partilharam a formação no FC Porto destacam essa característica, num contraste com o “reguila” Fábio Vieira, que sempre foi um dos seus melhores amigos. Havia até quem achasse que, por detrás desta timidez, havia mesmo falta de confiança.

Certo dia, nos sub-15, os companheiros detetaram uma particularidade em João Mário: parecia que ele via mal. Quando a bola voava, vinda, por exemplo, de um central, ele não a via bem, mas conseguiu perceber onde ia cair. A partir daquele momento, mais porque os outros notaram do que propriamente por se ter queixado, passou a usar óculos e lentes.

Os colegas notavam, também, que João Mário não se irritava se não lhe passassem a bola. Ficava ali, no corredor direito, à espera, não se impondo ao jogo. Ora, alguns anos depois, essa timidez foi posta para trás das costas para amenizar o mau ambiente que — interna e externamente — se respira no Dragão.

Aos 56', Galeno deu para João Mário, que olhou para a baliza, encheu-se de confiança e disparou. 2-0 e a vitória bem encaminhada.

Os 40 minutos restantes foram de escassa emoção. Os treinadores foram mexendo, mas ninguém teve impacto para alterar o estado das coisas, para altera um guião que já parecia fechado. Entre a eficácia de Galeno e a qualidade do tímido João Mário, a vitória do FC Porto não afasta a tristeza.


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