O Giro d'Italia 2023 ainda não tinha visto João Almeida em verdadeiros apuros. À 18.ª etapa, na entrada nos Dolomitas, cordilheira de montanhas duríssimas que será o palco de decisões da corrida, o português sofreu como ainda não sofrera nesta corsa rosa. Vítima de um ataque de Primoz Roglic, campeão determinado a mostrar que está vivo, o caldense tremeu, perdeu tempo, mas não foi ao tapete.
Os 161 quilómetros entre Oderzo e Val di Zoldo tinham diversas ascensões, com uma primeira categoria e duas subidas curtas mas duras na parte final. Foi na inclinada Coi, 5,5 quilómetros a 9,5% de pendente média, que a Jumbo-Visma, de Roglic, desferiu a ofensiva que levou o campeão nacional a descolar.
Até àquele momento, Almeida pareceu confortável, tranquilo, sem esgar de dor. Mas, a 7,3 quilómetros da meta, Sepp Kuss, norte-americano companheiro de Roglic, imprimiu um ritmo que o português não conseguiu acompanhar. A aceleração partiu o grupo dos favoritos. Thomas acompanhou, João não.
Era preciso uma das recuperações que nos habituámos a ver o homem do bigode de A-dos-Francos fazer. No fim da penúltima contagem de montanha, a distância parecia que ia ser eliminada, mas os últimos dois quilómetros de subida voltaram a acentuar diferenças.
Contas feitas, Roglic e Thomas chegaram 21 segundos à frente do líder da UAE-Emirates. O português cai uma posição na geral, estando 10 segundos atrás do esloveno e a 39 do britânico da INEOS, que conserva a rosa. Filippo Zana, italiano da Jayco, ganhou a tirada depois de integrar a fuga do dia.
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No dia do 37.º aniversário de Thomas, a fuga teve Thibaut Pinot, o francês atacante que tem cabras como animais de estimação e que se retirará no final da época. Tal como na 13.ª tirada, o homem da Groupama-FDJ foi batido na meta.
Mais atrás, Almeida foi na roda do camisola rosa durante todo o dia, numa marcação cerrada. Mais distante foi andando sempre Roglic, em certos momentos revelando mesmo um ar de desconforto, bebendo água com sofreguidão no primeiro dia do Giro em que o calor foi incómodo. Tudo não terá passado de bluff.
O guião saiu do controlo do caldense de 24 anos quando a Jumbo arrancou. Sepp Kuss é um homem de equipa fenomenal, um norte-americano que parece subir de fato de gala vestido e que ajuda líderes como pouco se vê. Agradeceu Roglic, que na roda do colega de equipa conseguiu fazer Almeida descolar.
Roglic na frente, Almeida atrás, no guião oposto de há dois dias. A constante foi Geraint Thomas, o galês de regularidade perfeita neste Giro, mesmo se, ao contrário dos companheiros de pódio, não teve auxílio direto nas dificuldades finais do dia.
Roglic e Thomas, ganhando tempo a João Almeida
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A ajuda de Vine a Almeida foi digna de um gregário de luxo, um minimizador de perdas quando o português teve os primeiros minutos de quebra deste Giro. No topo da penúltima subida a diferença parecia que se reduziria a nada, mas uma saída de estrada do australiano na descida prejudicou a perseguição.
As rampas rumo à meta repuseram a diferença. Aquele é o terreno de Roglic, o esloveno que, mesmo quando perde, perde de pé. Lutará até final.
Por aqui também se vê o tamanho do Giro de João: competindo contra Thomas, regular ao longo de três semanas que já subiu ao alto do pódio de Paris no Tour, e Roglic, explosivo dinamitador de corridas com três Vueltas no palmarés, ajudado por Kuss.
Cerrando os dentes e apoiado por grupos de portugueses perto da meta, Almeida cortou a meta confirmando a queda ao 3.º lugar. Mas o sofrimento não resultou em perdas significativas e até teve boas notícias: o pódio está mais perto, já que a margem para o 4.º aumentou. O irlandês Eddie Dunbar, que ultrapassou Damiano Caruso, está agora a três minutos de distância.
A 19.ª etapa será “o dia D”, como o português lhe chamou antes da 18.ª jornada. Serão duas contagens de montanha de primeira categoria, duas de segunda e uma categoria especial, coincidente com a meta. Tudo antes do contra-relógio de sábado, também com uma ascensão final.
A classificação geral do Giro
Giro d'Italia