Ténis

O grande coração da pequena Jasmine Paolini, que aos 28 anos encontrou o caminho para a final de Roland-Garros

O grande coração da pequena Jasmine Paolini, que aos 28 anos encontrou o caminho para a final de Roland-Garros
DIMITAR DILKOFF/Getty

No corpo diminuto da tenista italiana mora uma tenacidade admirável que subiu paulatinamente na cadeia alimentar o ténis até chegar, já tarde, a uma primeira final de Grand Slam. Sempre de sorriso na cara, a toscana com sangue polaco e ganês a correr-lhe nas veias vai encontrar a quase compatriota Iga Swiatek no sábado (14h, Eurosport), uma surpresa que lhe assenta bem

Está tudo no sorriso. É pelo menos essa a explicação dada por Ugo Paolini, pai de Jasmine Paolini, para a paulatina e paciente evolução da filha. “Sempre a sorrir, o sorriso como ponto de partida”, sublinhou ao jornal regional “La Nazione”, toscano como a tenista que aos 28 anos, muito tarde para as contagens sempre relativas do ténis, apareceu finalmente nos grandes palcos, depois de anos de picareta na mão a trabalhar o seu caminho até aqui chegar. E aqui leia-se final de Roland-Garros, o auge dessa luta sempre travada de sorriso na cara, mesmo nos momentos menos cintilantes.

Nas meias-finais, Paolini, do alto do seu pouco mais de 1,60m, derrotou o seu contrário: Mirra Andreeva, de 17 anos, gigante, atlética, uma dessas tenistas que aparecem cedo e a quem chamamos de “prodígio”, por terem impacto imediato. Tornou-se, em Paris, na mais jovem semi-finalista em torneios do Grand Slam desde 1997, mas caiu frente a uma quase veterana, experiente num circuito nem sempre glamoroso, para quem nada foi instantâneo.

Jasmine anda desde 2015 de mochila às costas por esse circuito fora, que nem uma formiguinha a reunir pontos com umas vitórias no circuito Challenger aqui, uns quartos de final ou umas meias-finais WTA ali. Só chegou ao top 100 em 2019 e ao top 50 em 2022. Até 2024, só contava com uma conquista no currículo, no modesto Open da Eslovénia, em 2021.

Este ano, tudo mudou com uma entrada forte no Open da Austrália, onde fez 4.ª ronda, antes de vencer o torneio do Dubai, de categoria 1000, a principal do circuito. Seguiram-se resultados fortes nos importantes torneios de Indian Wells e Madrid, que a deixaram às portas do top 10 do ranking. A subida firme, regular, na sombra, a melhorar ano após ano, tem agora o seu auge, provando que nunca é tarde para se chegar ao máximo das nossas capacidades. Na final de Paris, terá pela frente a favoritíssima Iga Swiatek, número 1 mundial, com quem partilha muito mais do que a apetência para a terra batida. Mas já lá vamos.

Uma vida calma

Mas afinal quem é e de onde veio Jasmine Paolini, que apenas aos 28 anos se assumiu como uma das mais impactantes jogadoras do circuito feminino? Filha de um italiano e de uma polaca com sangue ganês, Jasmine Paolini nasceu na calmaria do interior da Toscana, crescendo na vila de Bagni di Lucca, onde apenas havia um clube de ténis e uma piscina. Paolini escolheu o ténis, aos 5 anos, influenciada pelo pai e pelo tio.

A vitória mais importante da carreira, este ano no Dubai
Robert Prange

Da infância, recorda-se do ambiente “relaxado” do sítio onde cresceu. “Há um rio e também podes ir para as montanhas. Tive uma vida muito calma quando era criança. O clube de ténis era muito pequeno e podia desfrutar sem qualquer limitação”, disse ao site do WTA. Já aí, Paolini sabia que não era preciso ter pressa.

A paixão pela terra batida também vem da modéstia das condições que tinha na região central de Itália. Só jogou num court de piso rápido aos 14 anos e assume que teve dificuldade em adaptar-se à superfície. Isso obrigou-a a trabalhar mais: insistiu no serviço, na direita, nas pancadas do fundo do court. Mas o pó de tijolo, como se está a ver em Paris, continua a ser a sua praia. Porque é aí que vêm ao de cima as suas melhores qualidades: a forma como se move, como consegue chegar a qualquer bola, o caráter operário e tenaz de quem sempre subiu com humildade, dos torneios mais obscuros até à final de Roland-Garros.

“Corro por cada bola, aproveito a minha velocidade. Mesmo quando estou abaixo no marcador penso: ‘Posso dar a volta a este jogo se quiser’”, assumiu ao “Corriere della Sera” em fevereiro, depois da maior vitória da carreira, no Dubai. Itália descobriu aí que, além de Jannik Sinner ou Lorenzo Musetti, tinha também no circuito feminino uma tenista pronta para o topo. É um momento histórico para o ténis transalpino.

Encontro em polaco

Ao site da WTA, Jasmine Paolini disse acreditar que a sua determinação vem do lado polaco da família. A sua avó materna mora em Lodz e em criança era nessa cidade da Polónia que passava algumas semanas do ano. A menos de 150 quilómetros dali, em Varsóvia, nascia a sua adversária da final de sábado, Iga Swiatek, a quem determinação também não falta: a número um mundial esteve quase a cair na 2.ª ronda num dos melhores jogos do torneio, frente a Naomi Osaka, mas daí para a frente foi um tal distribuir de violência - incluindo um duplo 6-0 a Anastasia Potapova na 4.ª ronda.

Em Roland-Garros, Paolini vai jogar pela primeira vez uma final de um Grand Slam
BERTRAND GUAY

As duas poderão comunicar em polaco, língua que Paolini fala e entende, desde que lhe falem devagar. No sábado, o país do leste europeu ganhará sempre. Da parte italiana, Paolini diz ter “a energia”, do sangue ganês a fortaleza física, a rapidez. “É uma mistura e eu tenho muito orgulho nela”, frisou à WTA.

Uma mistura que dá também um carácter especial à jogadora que está ainda nas meias-finais do torneio de pares, ao lado de Sara Errani. No final do jogo da 4.ª ronda de singulares, em que bateu Elina Avanesyan, aplicando-lhe um 6-0 e 6-1 depois de perder o primeiro set, Paolini ouviu de Mats Wilander uma frase curiosa: “O teu coração é tão grande, não sei como é que cabe no teu corpo.” O antigo campeão sueco teve resposta imediata, entre sorrisos: “Tem de ser grande, porque eu sou muito pequena!”

Pequena ou despiciente não será a subida no ranking para a atual 15.ª da lista WTA: aconteça o que acontecer, Paolini já tem garantido que será no mínimo número 7 do mundo na próxima atualização do ranking. Nada mau para quem começou a jogar num pequeno clube na Toscana e soube ter a paciência para chegar ao topo.

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