A chuva ensopou o Santa Clara-FC Porto e o jogo da Taça de Portugal foi adiado
EDUARDO COSTA/Lusa
O primeiro jogo dos quartos de final da Taça de Portugal durou 27 minutos, e foram 27 minutos a mais. A chuva que caiu a potes em Ponta Delgada obrigou à interrupção e, depois, ao adiamento (quando havia um 0-0) da partida entre Santa Clara e FC Porto que ninguém terá entendido como é que sequer pôde começar. O jogo será retomado a 27, 28 ou 29 de fevereiro, segundo a FPF. Ou seja, logo se vê
Os Açores que não são verdes por obra do acaso, os socalcos e encostas verdejantes da “região mais bonita do país”, palavras ditas, à porta do estádio, por um agasalhado presidente do Santa Clara, devem-se à natureza na terra e à água que cai dos céus sobre o arquipélago dono de um sorriso verde, cor tida pela sabedoria popular como a da esperança, mas ainda os jogadores de Santa Clara e FC Porto aqueciam os músculos no campo de Ponta Delgada, as suas caras franzidas pelo chorrilho de gotas, e o cenário já ensopava de desesperação.
O feitio da depressão Karlotta, estranha no seu kapa e duplo tê, deprimia o ambiente na ilha de São Miguel e no estádio que encharcava sem dó. Os desconfortáveis jogadores tinham as mesmas feições ao irem e virem dos balneários, eram máscaras de quem abdicaria de um dia de salário para estar no quarto de hotel com uma manta nas pernas, chá quente nas mãos e o aconchego de ver o temporal pela janela. Mas, no cabimento de alguém, o frio, o vento e a chuva que alagavam o relvado com poças não impediam que se jogasse futebol. Pelo menos, que vinte e dois desalmados o tentassem fazer.
Tiveram de passar 27 minutos para o árbitro pegar na bola e largá-la sobre um lago em miniatura na área do FC Porto, por momentos encenando um momento de peritagem científica. Os jogadores aglomeraram-se em torno do dono do apito, que deu um par de ligeiros pontapés na bola, constatou o óbvio e apitou para a interrupção da prova de que um inferno pode ser alagado em vez de chamuscado. Até então, o que se vira não tinha sido futebol, era uma mestiçagem desportiva, algo entre o pólo aquático e a natação com toques de tudo à molhada, sem esquemas táticos nem dinâmicas ou movimentos treinados de execução possível num jogo dos quartos de final da Taça de Portugal.
Cada jogador que contactava com a bola era para a levantar, nunca se viram dois passes seguidos e frequente era que alguém se esquecesse de ajustar o chip às ensopadas condições. ‘Chico’ Conceição tentou atrasar um passe a Pepe que a relva encravou, obrigando o capitão a ir de sola à bola e ver um cartão amarelo. Vários jogadores do Santa Clara olvidaram o mesmo na sua área, dando a bola Nico que a picou para Evanilson a rematar de bico, sem olhar, quase acertando na baliza. Sem sequer se virar como deve ser para a área, Wendell tirou um cruzamento que o avançado brasileiro quase chegou e isso foi antes de Vinicius, plantado em fora de jogo, marcar um golo que seria anulado após o enésimo despejo para a área tentado pelos açorianos. Se este parágrafo foi custoso de ler, imaginem de ver.
EDUARDO COSTA/Lusa
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Quando os jogadores se foram abrigar para os balneários, muitos adeptos também abandonaram a bancada descoberta e foram procurar guarida fora do estádio, outra mostra da desesperança depositava na natureza. Interrompido o jogo, teve que se esperar a protocolar meia-hora para o árbitro, já encasacado, regressar ao campo com a bola nas mãos. A relva demonstrou-lhe o mesmo. Para onde quer que a lançasse ela frenava mal aterrava na relva, nem ao pontapé viajava mais do que um, dois metros. Estava visto que mais valia gastar a vista nos regulamentos da Federação Portuguesa de Futebol.
Se por “qualquer razão” um jogo “não puder” ser concluído, o documento que rege a vida à Taça de Portugal dita que este se terá de reiniciar “no mesmo local e à mesma hora do dia imediatamente a seguir”, exceto se nas conversas que decorriam nas catacumbas do recinto entre os responsáveis dos clubes saísse um acordo para se realizar noutra data que não esta quinta-feira. O que seria improvável: o próximo compromisso do FC Porto era só na segunda-feira, à semelhança do Santa Clara. E salvas as naturais diferenças, era do interesse de ambas despachar o assunto com celeridade porque as duas equipas lutam por conquistar os respetivos campeonatos e dispensariam encafuar o calendário lá mais para a frente.
O Estádio de São Miguel era só um esqueleto desprovido de gente quando o adiamento, sugerido pela chuva antes da hora marcada, se confirmou. Os responsáveis por estas decisões lá perceberam, a mal, o quão impraticável estava o relvado e como nada se pode quando a chuva decide ter um dia de inclemência. Foram 27 minutos a mais de ‘futebol’.