Sérgio Conceição, um treinador de fúrias em tempos de cólera

Após a nega de Marco Silva, Pinto da Costa virou-se para Sérgio Conceição, disposto a contrariar a Lei de Murphy na pior fase dos seus 35 anos de liderança
Após a nega de Marco Silva, Pinto da Costa virou-se para Sérgio Conceição, disposto a contrariar a Lei de Murphy na pior fase dos seus 35 anos de liderança
Jornalista
A história é contada por um antigo dirigente do Vitória de Guimarães: “À sobremesa pediu kiwi, não havia, desatou aos gritos ao ponto de terem ido a correr ao supermercado. Quando chegaram, disse que afinal já não lhe apetecia”. Outra história: Sérgio Conceição embrulhou-se com José Eduardo Simões, então presidente da Académica, gritando-lhe para que este lhe pagasse o que devia do tempo em que liderava a equipa de Coimbra. E ainda outra história: o Braga instaurou um processo disciplinar a Sérgio Conceição por “falta de lealdade e respeito”, na sequência “de graves factos ocorridos após o jogo no Jamor”. António Salvador, o presidente dos bracarenses, falou do caráter “agressivo e conflituoso” de Conceição.
Este é o lado de Sérgio Conceição que se teme no FC Porto, agora que as partes negoceiam o desfecho previsível: ele está em vias de tornar-se o treinador do Dragão. Não se põem em causa a qualidade ou o a capacidade técnica, mas a agressividade e falta de experiência.
A confirmar-se este acordo, será o terceiro regresso de Sérgio Conceição ao FC Porto, antigo jogador daquela casa com a qual sempre se identificou. Acontece que Sérgio Conceição é a segunda escolha de Pinto da Costa, após a nega de Marco Silva, e acontece também que a situação não está fácil -– há um mês, Conceição renovou com o Nantes um contrato até 2020.
Esta não é a primeira vez que o presidente do FC Porto tenta contratar o técnico que exibe como melhor cartão de visita a salvação do Nantes da descida de divisão, e ter sido finalista vencido da Taça de Portugal pelo Braga frente ao Sporting, na época 2014/15. Em janeiro do ano passado, o treinador de 42 anos foi um dos nomes mais insistentemente falados para suceder a Julen Lopetegui, tendo acabado por ser preterido a favor de José Peseiro, não só por ter contrato como o Vitória de Guimarães, mas pelo pedido de namoro ter acontecido na semana anterior á deslocação do FC Porto ao Estádio D. Afonso Henriques.
Agora, o convite ao admirador jurado de Jorge jesus, o seu primeiro técnico como profissional, volta a gerar polémica por suceder um mês após a renovação de contrato por mais três anos.
Waldemar Kita, presidente do Nantes, já avisou em entrevista ao jornal “O JOGO” que não lhe irá facilitar a vida, afirmando estar estupefacto com o comportamento de Sérgio Conceição. Para o deixar sair, o Expresso apurou que terá de indemnizar os franceses em €6,5 milhões, a cláusula contratual assinada há um mês. A “traição” do treinador não é a única que Kita lamenta, ao referir que, pelo menos até ontem, não fora contactado pelo FC Porto.
Além da indemnização, o FC Porto terá ainda de convencer Conceição a baixar o salário anual de 4,5 milhões de euros, mais do dobro do que ganhava NES, numa altura em que a meta da administração é emagrecer a massa salarial do clube, superior à dos campeões nacionais. A abordagem ao ex-portista já se prolonga há mais de uma semana e na mesa de negociações deverão estar as condições que o clube oferece ao treinador. Convém não esquecer que, além da crise desportiva, o Porto atravessa dificuldades financeiras, cenário que obriga a vender até 31 de junho, prazo de fecho das contas anuais 2016/17, as suas joias da coroa para realizar mais valias próximas dos €100 milhões.
Ao que apurou o Expresso, Marco Silva não rejeitou liminarmente a ida para o Dragão, mas “apresentou um caderno de encargos na formação do plantel que inviabilizou as negociações”, adianta fonte afeta ao administração. A aproximação a Marco à revelia do seu empresário, Carlos Gonçalves, amigo de Antero Henrique, “foi algo que não facilitou a contratação”.
De acordo com um ex-dirigente do FC Porto, a resistência de Marco Silva é, de resto, um sinal dos tempos, longe dos anos em que os treinadores faziam fila para treinar o FC Porto, uma época marcada pelo desnorte fora e dentro das quatro linhas, como se prova pela queima de cinco treinadores em quatro anos, e “pelas notícias que circulam que o clube ainda tem salários em atraso a Lopetegui e Peseiro”.
Caso troque o Nantes pelo Porto, Sérgio Conceição, opção defendida por Luís Gonçalves, diretor-geral do futebol azul e branco, tem pela frente uma missão de risco: impedir que o Benfica conquiste o título de pentacampeão nacional.
José Martins Soares, numa carta aberta a Pinto da costa, após o tetra da Luz, alertou Pinto da Costa que esse será um pecado que os portistas jamais perdoarão ao presidente que ganhou tudo o que havia para ganhar a nível nacional e internacional. Soares, o único candidato que enfrentou Pinto da Costa nas urnas no final da década de 80 e no início dos anos 90, afirmou ao Expresso que voltará a desafiar o líder dos dragões nas urnas.
Jorge Manuel Mendes, agente que tem acompanhado Sérgio Conceição desde os tempos de jogador, foi evasivo quando há uma semana foi contactado pelo Expresso sobre o interesse do FC Porto. “Tem contrato com o Nantes, mas tal como os jogadores os treinadores também são transferíveis”, disse.
Apesar de várias tentativas, o empresário mantém-se desde então incontactável. No Porto, a reação ao nome do possível sucessor de Nuno é de desconfiança, e comenta-se à boca pequena o que referiu o presidente do Nantes, Waldemar Lita, a “O JOGO” : “O Sérgio Conceição não está preparado para treinar o FC Porto. Vai meter-se na boca do lobo”.
A resistência a Sérgio Conceição prende-se ainda com a fama que ganhou em Braga e em Guimarães. Dos Guerreiros do Minho, foi despedido em junho de 2015, após a SAD lhe ter instaurado um processo disciplinar “por falta de lealdade e respeito”, na sequência “de graves factos ocorridos após o jogo no Jamor”. António Salvador, apesar de não colocar em causa os seus méritos como treinador, queixou-se do caráter “conflituoso, autoritário e agressivo”.
O litígio acabou num acordo extrajudial, tendo o Sporting de Braga pago 87 mil euros a Sérgio Conceição, que pediu inicialmente 1 milhão de euros de indemnização por despedimento sem justa causa.
No Vitória de Guimarães o presumível futuro técnico portista também não deixou saudades. Além do 10º lugar, foi fora do banco que menos empatia causou. Segundo um ex-dirigente vimaranense, próximo da atual da direção, Sérgio Conceição “não tem pulso natural no balneário, criando mau ambiente por ser quezilento e dado a fúrias na relação com os jogadores”.
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