Que Pedro Pablo Pichardo e Nélson Évora não eram, propriamente, a chavena de chá predileta um do outro seria novidade para ninguém face à troca pública de mimos nada simpáticos que ambos protagonizaram ao longo dos anos. A mais recente acontecera nos Jogos Olímpicos, em Tóquio, quando se viu o segundo a torcer por Hugues Fabrice Zango, um atleta de Burkina Faso que competia na final do triplo salto contra o primeiro, que acabaria por trazer a medalha de ouro na bagagem para Portugal. À vista de toda a gente, a animosidade era clara.
Na altura, até José Manuel Constantino, presidente do Comité Olímpico de Portugal, se teve de pronunciar acerca da polémica demonstração pública de desafeto de um atleta que representava o país face a outro. Agora, veremos as consequências do provável pior dos casos, visto não durante uma competição, mas nas redes sociais, após uma entrevista de Nélson Évora ao “Observador”. Reagindo ao recente ouro de Pichardo nos Europeus de pista coberta, o antigo campeão olímpico (Pequim, em 2008) ressuscitou a fervura entre ambos:
“Não temos um atleta júnior que salte 16 metros, que possamos dizer que saltará 17 metros em sénior ou que possa ganhar uma medalha. Fico contente que ele trazer uma medalha, mas isto espelha o quê? Interesse de quem? Quem é que lucrou com isso? Foi Portugal! Claro, é bom, no curto prazo. Foi um investimento feito no curto prazo. Foi comprado um atleta para poder ter resultados a curto prazo. É uma referência. É como é! Não tenho nada contra ele e nunca tive. Estive 11 anos em Portugal, não competi por Cabo Verde e Costa do Marfim, e até me sinto envergonhado quando dou de caras com as federações das minhas origens. Até baixo a cabeça. São as minhas raízes mas não quis porque vim para cá com seis anos. Não sei nada sobre Cabo Verde e a Costa do Marfim. Tinha duas pessoas em casa que me deram educação conforme os costumes cabo-verdianos. À parte disso, todos os meus amigos são portugueses. Quando me foi dado a escolher em juvenil, eu recusei. Disse que não me ia sentir bem a vestir a camisola de um país no qual não me sentia.”
As palavras de Nélson Évora, de 38 anos, provocaram uma reação em Pedro Pichardo, de 29, que recorreu à sua página de Instagram para escrever uma resposta, iniciada com um “Ainda 🤦🏾♂️ #NELSONEVORA” e “What the fuck bro”. Pegando na deixa da reabertura das hostilidade, o campeão olímpico, mundial e europeu com Portugal começou por apontar que Évora lhe está a “faltar ao respeito”, indicando: “Não sou uma prostituta, nem sou como tu que saíste a mal do clube porque te ofereceram mais. Não sei que problemas tens na cabeça ou se tens problemas com alguém que está no Benfica, mas não deves misturar-me nessas coisas e falar de mim. Mas deixa-me explicar-te algumas coisas e também aos que te apoiam”.
De seguida e numa série de stories que publicou, o atleta nascido em Cuba e naturalizado português - como Nélson Évora, que nasceu na Costa do Marfim -, continuou a ripostar contra as declarações do antigo número 1 do triplo salto do país. “Saí de Cuba pelos problemas que toda a gente sabe, estava na Suécia e o Benfica fez-me uma proposta, como fizeram outros clubes de outros países. Cheguei a Portugal sem saber nada dos teus problemas, simplesmente focado na minha carreira. Até porque tu já eras campeão mas nunca me tinhas ganho, na tua carreira só me ganhaste duas vezes e a tua melhor marca, 17.74, eu salto mais do que isso de leggings compridas e de chapéu. Nunca foste a minha referência como atleta nem como pessoa, ficas a falar de Tóquio, ok…”, escreveu Pichardo.
“Quando saíste lesionado [nos últimos Jogos Olímpicos] eu já não estava na pista porque fiz a qualificação logo no primeiro ensaio, então como queres que fale contigo? Passar 11 anos para teres o documento português não te faz mais português do que ninguém, nenhum de nós nasceu cá, ou seja, do que eu (...). Afinal, os dois adquirimos nacionalidade portuguesa, o que quer dizer que não nascemos cá. Dizes não ter nada contra mim (...) sempre que tens uma oportunidade falas do Pichardo. Sê homem e fala directamente para a pessoa ou para o clube com o qual tens problemas e pára de falar de mim, que já pareces uma menina quando gosta de um rapaz (és bonito mas não sou gay)”, continuou o detentor do recorde nacional do triplo salto.
Pedro Pichardo encerrou a sua resposta assegurando que “sempre ficou” no seu “cantinho”, mas “chega de humildade e de ficar calado”. O confesso perseguidor do recorde mundial da modalidade - os 18,29 metros pertencentes a Jonathan Edwards desde 1995 - disse ainda a Nélson Évora que quando for “vencedor das Diamond League”, salte “18 metros” e tenha os seus títulos “num ano”, então falarão “de campeões”. E fechou com uma frase: “Sou melhor do que tu, aceita”.