O dono do Hoffenheim, “homem mais odiado do futebol alemão”, abdicou gratuitamente do clube e já não é uma exceção à regra do ‘50+1’
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Dietmar Hopp anunciou que irá devolver ao emblema a maioria dos direitos de voto, revertendo a exceção que lhe foi concedida em 2014. Já apelidado de “homem mais odiado do futebol alemão”, o bilionário cujo investimento levou o Hoffenheim dos escalões amadores à Liga dos Campeões toma a decisão depois de um tribunal ter considerado a exceção “problemática”
A 14 de dezembro de 2014, a Bundesliga decidiu permitir que o Hoffenheim se tornasse numa exceção à regra ‘50+1’, que na Alemanha dita como os clubes e os seus sócios — não um investidor externo — devem sempre deter a maioria do capital e direitos de voto. A isenção foi justificada pelos 20 anos de investimento contínuo que o bilionário Dietmar Hopp fizera no clube, permitindo que este se tornasse numa terceira “exceção histórica”, a par de Bayer Leverkusen, financiado pela farmacêutica Bayer, e Wolfsburgo, da Volkswagen.
No entanto, Dietmar Hopp comunicou que irá renunciar à maioria dos direitos de voto no Hoffenheim, os quais passarão, novamente, para o clube. A operação será feita, garante Hopp, sem custos financeiros para o emblema, que regressará ao normal grupo dos ‘50+1’.
Outro clube que foge, na prática, à lógica do ‘50+1’ é o RB Leipzig, financiado pela Red Bull. Para cumprir com os regulamentos, o Leipzig está dentro dos ‘50+1’, mas ser sócio da entidade é burocraticamente difícil e caro, pelo que os poucos membros são todos ligados à Red Bull, que detém o controlo efetivo das operações.
A exceção foi dada ao Hoffenheim devido ao “considerável compromisso financeiro de Hopp com o futebol profissional e amador durante mais de 20 anos”. Agora, o bilionário, que diz sempre ter agido no espírito do ‘50+1’, um “grande trunfo do futebol alemão”, assegura que o investimento no Hoffenheim “nunca teve o poder como ponto fundamental”. “Sempre esteve fora de questão para mim impor todas as decisões, sempre quis criar consensos e agir em harmonia”, assegura Hopp, de 82 anos.
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Com o investimento de Hopp, o Hoffenheim foi subindo desde as divisões amadoras para chegar, em 2008, à Bundesliga, de onde não mais saiu. Com o trabalho de nomes como Ralf Rangnick ou Julian Nagelsmann a ter um papel fundamental no êxito desportivo, a entidade de uma vila de 3.000 habitantes — ainda que o estádio esteja em Sinsheim, com capacidade para 35.000 pessoas — chegou a disputar a Liga dos Campeões, em 2018/19.
Nas últimas seis temporadas, esteve sempre entre os 11 primeiros da Bundesliga. No entanto, esta campanha tem sido bem mais atribulada para o clube ao qual o Sporting emprestou Eduardo Quaresma. Está em 16.º, posição que, no final da temporada, obriga à disputa de um play-off de manutenção contra o terceiro da 2.Bundesliga, a segunda divisão.
Problemas legais
A decisão de Dietmar Hopp abdicar do controlo do Hoffenheim surge no contexto de uma discussão na Alemanha sobre as exceções ao ‘50+1’. Desde há muito que adeptos de outros clubes criticam essas isenções, num debate que foi reforçado com a proposta da Superliga, que encontrou forte oposição no país.
O Tribunal Federal da Concorrência pronunciou-se, recentemente, contra as exceções, que considera poderem ser “problemáticas”. A direção da Bundesliga prometeu uma revisão da norma até ao final do primeiro semestre de 2023.
Com ajuda do dinheiro de Hopp, o Hoffenheim chegou a jogar na Liga dos Campeões
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Mantendo-se a atual política de dar isenções ao ‘50+1’ depois de 20 anos de investimento continuado, a Red Bull poderia passar, em 2029, a ser o proprietário efetivo do RB Leipzig que já controla, por exemplo.
Dietmar Hopp, no comunicado a anunciar que abdicava dos direitos de voto, assumiu que os “acalorados debates” dos “últimos tempos” o “levaram a querer desistir do estatuto especial” que lhe foi concedido. “Importa-me criar condições claras para o Hoffenheim em termos de regulamentação”, indica.
“O homem mais odiado do futebol alemão”
Dietmar Hopp jogou, quando era adolescente, no Hoffenheim, antes de entrar no mundo dos negócios. Em 1972, associou-se a quatro empresários para criar a empresa de software SAP, que presidiu entre 1988 e 1998, tornando-se na terceira maior informática do mundo, atrás da Microsoft e da Oracle. Deixou a SAP em 2003, mas manteve 5,52% do capital social.
Adeptos do Hannover mostram uma tarja com um alvo com a cara de Dietmar Hopp, em março de 2020. São recorrentes as críticas de outros clubes ao bilionário
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Investidor na área da investigação científica e medicina, fez a primeira doação ao clube da sua infância em 1989, aumentando, ao longo dos anos, a quantidade de dinheiro que foi injetando no clube. Construiu modernos estádios e centros de treinos.
Dono de um resort no sul de França comprado a Sean Connery, Dietmar Hopp e a exceção dada ao Hoffenheim sempre foram muito criticados pelos adeptos dos restantes clubes alemães. Adeptos do Hannover, Bayern ou Dortmund já organizaram protestos visando o bilionário, várias vezes descrito como “o homem mais odiado do futebol alemão”.