Crónica de Jogo

A fome do Sporting transformou-se em fartura de golos contra o Casa Pia

A fome do Sporting transformou-se em fartura de golos contra o Casa Pia
Gualter Fatia/Getty

Depois da derrota contra o SC Braga na Taça da Liga, os leões trocaram o desperdício pela eficácia, conseguindo uma vitória gorda (8-0) numa noite inspirada

A fome do Sporting transformou-se em fartura de golos contra o Casa Pia

Pedro Barata

Jornalista

Rúben Amorim sabe o valor da Taça da Liga. Vencedor do troféu em nove ocasiões, seis como jogador e três como treinador, a experiência ensinou-lhe que vencer a competição que se decide a meio da época pode funcionar como vitamina para o resto da temporada, como injeção de confiança, como boost que ajuda a terminar a maratona com êxito.

Também por isso, Amorim sentiu a derrota contra o Sporting de Braga. E, tal como o dono do banco, também o plantel a acusou, encarando-a com o silêncio triste que foi confessado pelo técnico. A eliminação de Leiria nasceu num desperdício em catadupa, na ineficácia na finalização, na dificuldade em marcar.

Poucos dias passados, o Casa Pia pagou a fatura. A fome da Taça da Liga, a escassez de golos, transformou-se em fartura no regresso do campeonato, como se em Alvalade morasse uma equipa que não sabe redistribuir a riqueza durante o mês de janeiro: cinco golos marcados ao Estoril, quatro ao Tondela, três ao Chaves, cinco ao Vizela, zero ao SC Braga, oito ao Casa Pia.

A goleada partiu de uma primeira parte esfomeada, cheia de agressividade leonina. Com 4-0 no marcador, Nuno Santos reagiu ao golo de Gyökeres indo a correr buscar a bola ao fundo da baliza, como se houvesse que correr atrás do prejuízo, que provar algo, que tirar da cabeça a mágoa da Taça da Liga para a encher de golos.

Nas seis primeiras vezes em que os verde e brancos remataram à baliza, acertaram no alvo quatro vezes, resultando em quatro golos. Da fome à fartura, da atração pelos postes de há dias para chegar a uma vantagem de mão-cheia ao intervalo pela primeira vez desde 1973.

O 8-0 final permite manter a margem no topo da tabela, com mais um ponto que Benfica e quatro que FC Porto. E amplia a força caseira da equipa na I Liga 2023/24: 10 rondas realizadas em Alvalade, 10 vitórias.

RODRIGO ANTUNES/Lusa

No reencontro de Amorim com o clube onde iniciou o percurso como treinador, o Casa Pia tentava matar um borrego que dura quase desde a Primeira República. Desde 1929/30 que os gansos não derrotam os leões. Ainda não foi desta.

Pedro Moreira, ainda a dar os primeiros passos na equipa, mudou cinco titulares, mas a abordagem dos visitantes ao encontro foi desastrada. Com Tiago Dias a tentar fazer uma linha de cinco atrás e Lelo como central pela esquerda, pareceu haver a tentativa de compor um quinteto defensivo para contrariar a força atacante dos locais.

As intenções do técnico do Casa Pia esbarraram na voragem dos líderes do campeonato. Os jogadores do Sporting entraram como que possuídos no relvado, pressionando, correndo, atacando os espaços atrás da defesa, rematando com acerto.

O primeiro e o sétimo golos foram do mesmo homem. Coates, o capitão, foi à área adversária abrir o marcador, aos 14', respondendo a livre de Nuno Santos, e ampliou-o aos 82', após canto da esquerda. Pelo meio, houve um Sporting em sprint constante até ao intervalo e em relativo tirar do acelerador no segundo tempo, ainda que esse ritmo menos intenso não tivesse impedido que a goleada fosse engordando.

A fartura que afastou a fome de Leiria deu-se, sobretudo, entre os 23' e os 43', quando se marcaram quatro golos. Com o Casa Pia desastrado, o sueco do costume aproveitou para voar rumo à baliza de Ricardo Batista.

Aos 23', uma perda de bola de João Nunes permitiu a Gonçalo Inácio lançar Pedro Gonçalves, que assistiu Gyökeres com precisão. Dois minutos depois, Hjulmand lançou Pote, que finalizou com tranquilidade. Sete minutos passados, Gyökeres arrancou à Gyökeres, como se a salvação do mundo dependesse daquela corrida e nada fizesse sentido além daquela cavalgada. O matador foi derrubado por João Nunes e transformaria o penálti no seu 24.º golo pelo Sporting na campanha.

RODRIGO ANTUNES/Lusa

Com o Casa Pia sem perceber bem o que lhe estava a suceder, sem entender de onde surgiam tantos homens de verde e branco a galopar, o 5-0 ainda chegaria antes do intervalo, com Trincão, de pé direito, a culminar bom trabalho de Edwards. Foi a quarta jornada seguida do internacional português a marcar, desta feita com direito a bis a fechar o desafio.

Na segunda parte, Rúben Amorim aproveitou para gerir a equipa. Pote nem saiu dos balneários (entrou Bragança), Edwards, Esgaio ou Inácio também foram sendo substituídos.

O ritmo do líder não foi tão esfomeado, mas não foi, de todo, de passeio. O Casa Pia continuou desaparecido — só um remate em cada parte — e o Sporting manteve-se eficaz, com oito golos em 11 remates enquadrados com a baliza rival.

Aos 65', Geny Catamo, que acabou de voltar da participação na CAN ao serviço de Moçambique, fez o 6-0 com um belo remate em arco. Aos 82', o canhoto serviu Coates para o 7-0, no 36.º golo do uruguaio pelo clube a que chegou em janeiro de 2016.

Com goleada garantida, Gyökeres lá ia jogando em loop, correndo como sempre, pressionando como sempre, tentando marcar como sempre. Em tempo de compensação, forçou Batista a uma defesa apertada para canto. Desse momento surgiu o 8-0, num remate estético de Trincão, um carimbo que atesta a qualidade na finalização do canhoto que vai perdendo a timidez. O fechar perfeito para a noite em que Alvalade esqueceu a tristeza de Leiria, a hipótese frustrada de festejar em janeiro, para se centrar nos objetivos que se decidem em maio.

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