Crónica de Jogo

O duelo de Chico Conceição contra Guitane foi ganho pelo Estoril contra o FC Porto

O duelo de Chico Conceição contra Guitane foi ganho pelo Estoril contra o FC Porto
ESTELA SILVA/Lusa

Grande surpresa no Dragão, com os canarinhos, que partiram para esta jornada no último lugar da I Liga, a vencerem (1-0). Taremi falhou um penálti no começo do jogo, que teve os canhotos dribladores de ambas as equipas em destaque, antes de um livre de Holsgrove selar o triunfo visitante

O duelo de Chico Conceição contra Guitane foi ganho pelo Estoril contra o FC Porto

Pedro Barata

Jornalista

O último a jogar em casa de um candidato ao título. Uma equipa que não vencia na I Liga desde agosto contra outra que vinha no melhor momento da época, com quatro triunfos seguidos. Um clube que só vencera um dos derradeiros 41 desafios disputados contra o seu rival.

Toda a lógica assente nas frases anteriores foi atirada borda fora no FC Porto-Estoril. O 1-0 repete a façanha dos canarinhos em 2013/14, quando um penálti de Evandro deu à equipa de Marco Silva o, até esta noite, único triunfo do Estoril em casa dos dragões. Desta vez, não foi um penálti, ainda que o lance tenha começado por ter sido assinalado como castigo máximo, antes de o VAR o converter em livre e a canhota de Jordan Holsgrove o transformar em golo.

Na noite em que os homens de Vasco Seabra, que partiram para a jornada 10 na 18.ª e derradeira posição da tabela, provaram que o talento deste plantel não condiz com andar nos derradeiros lugares, deu-se um combate individual numa modalidade coletiva. Francisco Conceição contra Rafik Guitane, uma exibição de fintar, da arte de superar adversários, como se o serão de sexta-feira no Porto fosse para ver canhotos deslizarem pelo relvado.

O confronto particular talvez tenha terminado empatado aos pontos, qual combate de boxe. O verdadeiro encontro deu lugar à maior surpresa, até ao momento, do campeonato 2023/24.

O jogo começou com uma soberana oportunidade para o FC Porto marcar. Logo aos 5’, Volnei derrubou Eustáquio na área mas, na transformação do penálti, Taremi deu continuidade à maldição caseira que arrasta nesta temporada. O remate do iraniano, que ainda não marcou no Dragão em 2023/24 e seria substituído aos 63', foi defendido com classe por Marcelo Carné, num prenúncio das dificuldades que estavam por chegar para os azuis e brancos, que, entre outros, cometeram o pecado do desperdício na finalização.

Quality Sport Images/Getty

O lance do castigo máximo começou numa incursão de Francisco Conceição, vindo da direita para o meio para explorar o seu pé esquerdo. Traçando uma diagonal a todo o campo a partir da posição do português, vamos dar à meia-direita do Estoril, onde há outro esquerdino driblador. O Estoril demorou 20’ a chegar à área do FC Porto, mas, quando o fez, foi graças à arte de Rafik Guitane, arrancando o grande duelo particular da noite.

Momentos houve em que o FC Porto-Estoril não pareceu um embate de 11 contra 11, mas sim um confronto entre Francisco Conceição e Guitane, sendo os restantes 20, mais do que adversários, meras testemunhas da magia. Um arranque de um, uma revienga do outro; Conceição via Pedro Álvaro cortar-lhe um remate ou Evanilson falhar um remate após uma assistência, Guitane, rei dos dribladores da I Liga, superava Eustáquio, Taremi e João Mário de uma vez, num golpe de mágica intercetado por David Carmo.

Em cima do intervalo, Marcelo Carné voltou a destacar-se, evitando o golo de Jorge Sánchez, que ainda veria Volnei negar-lhe o 1-0 em cima da linha. Mas o desafio era, na verdade, um mano a mano.

O reatamento trouxe, de novo, a ideia de embate pessoal. Rafik Guitane é cheio de artifícios na condução da bola, girando e rodando como se fosse feito de plasticina, o milagre da agilidade, e foi assim que voltou a obrigar Carmo a cortar in extremis. Na resposta, partindo da ponta do campo oposta, Conceição disparou, no seu elétrico correr para cima dos defesas, para nova defesa de Carné.

O jovem português, depois de tanto driblar, agitar e ganhar amarelos, sairia aos 83’, já com os azuis e brancos em desvantagem. E o 1-0 só surgiu porque, além dos feitiços de Guitane, o Estoril tem talento e personalidade que contrastam com os resultados que, pelo segundo ano seguido, empurram os da linha para a zona de despromoção.

Quality Sport Images/Getty

À medida que o jogo foi avançando, Mateus Fernandes começou a conseguir avançar no terreno e mostrar a sua qualidade, enquanto, na direita, Rodrigo Gomes era, simultaneamente, homem da maratona e artesão, corredor de fundo e trabalhador em precisão. Chegava, embalado de trás, com precisão para tomar boas decisões. Assim, o Estoril foi-se chegando a Diogo Costa, até aos 75' da glória visitante.

Pela enésima, Guitane fintou um adversário, desta feita David Carmo, que voltou a ser precipitado numa arbitragem. O penálti, primeira decisão do árbitro, foi transformado em livre, pois a infração deu-se fora da área. Apenas um pormenor para Jordan Holsgrove, o escocês da canhoto bombástica. Remate, 1-0, o Estoril à beira de uma proeza.

Sérgio Conceição foi mexendo, colocando Nico, Gonçalo Borges, Toni Martínez, André Franco ou Danny Namaso. Se, durante boa parte do encontros, os azuis e brancos dispuseram de oportunidades claras, nos minutos finais foram sôfregos e precipitados, incapazes de terem a classe para desbloquear a defesa adversária, que foi sempre comandada por um Marcelo Carné em noite perfeita.

Já nos descontos, David Carmo teve uma oportunidade para empatar. Mas há, em redor do central, uma aura negativa, quase uma lei de Murphy, um fado que o parece condenar. A finalização do canhoto foi travada por Volnei, que começou o jogo a cometer um penálti e acabou-o com um corte decisivo, uma reviravolta que resume um desafio de desfecho inesperado, que deu as voltas à lógica. E o FC Porto, que parecia em processo de consolidação coletiva, corre o risco de ficar a três pontos de Benfica e a seis de Sporting, recuperando as incertezas do arranque da temporada.


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