Ciclismo

O Tour de France 2024 entra em território desconhecido: final com contrarrelógio em Nice, gravel e o “início mais duro de sempre”

O Tour de France 2024 entra em território desconhecido: final com contrarrelógio em Nice, gravel e o “início mais duro de sempre”
Tim de Waele/Getty

Devido aos Jogos Olímpicos, a corrida fugirá de Paris. Com arranque em Itália e passagem por quatro estados, a organização admite que o percurso tem menos alta montanha, mas isso não retira dificuldade a uma Volta à França que fecha em luta contra o tempo pela primeira vez desde 1989 e que poderá ter a estreia de João Almeida e Remco Evenepoel

O Tour de France 2024 entra em território desconhecido: final com contrarrelógio em Nice, gravel e o “início mais duro de sempre”

Pedro Barata

Jornalista

Já se sabia que a proximidade temporal entre o final do Tour de France 2024 e o começo dos Jogos Olímpicos de Paris levaria a que a 111.ª edição da Grand Boucle fosse diferente. Com a última etapa da maior das corridas do ciclismo a disputar-se a 21 de julho e as competições olímpicas a iniciarem-se cinco dias depois, a Volta à França quis evitar Paris, o que implicaria, desde logo, um desenlace diferente do clássico nos Campos Elísios.

Ora, além disso, a ASO, que organiza o Tour, quis ir mais longe nas inovações, desenhando um percurso para 2024 com várias novidades, uma viagem por espaços pouco conhecidos no epicentro do calendário das duas rodas não motorizadas.

Começando pelo final: a 21.ª e derradeira etapa será um contrarrelógio que ligará o Mónaco a Nice, na primeira vez que a corrida se fecha na luta contra o tempo desde 1989, a traumática edição para os franceses. Naquele ano, Laurent Fignon chegou ao contra-relógio final com 50 segundos de vantagem para o norte-americano Greg Lemond. Na tirada definitiva, Lemond ganharia 58 segundos ao francês, triunfando no Tour com 8 segundos de vantagem e dando, emocionalmente, início à impossibilidade dos gauleses vencerem a sua corrida, algo que não se verifica desde 1985, com Bernard Hinault.

Mas não só no final estão novidades. O Tour parte de Florença, com uma jornada inaugural que ligará a cidade-museu a Rimini, a terra balnear na costa do Adriático. Com 206 quilómetros e 3.600 metros de desnível positivo, é a etapa 1 mais empinada da história do Tour, o que leva a organização a classificar este como “o início mais duro de sempre”.

Para compor este cenário de exigência a abrir, temos a etapa 2, com chegada a Bolonha e uma dupla ascensão ao santuário de San Lucca, palco de rampas empinadas rumo a um dos cenários mais icónicos da Emilia-Romagna. No quarto dia de corrida, já em França, chega a passagem pelo Galibier e os seus 2.642 metros de altitude.

Sem haver uma verdadeira sequência de etapas de alta montanha até à segunda metade do Tour, teremos um contrarrelógio de 25 quilómetros, entre Nuits-Saint-Georges e Gevrey-Chambertín, uma trajeto entre as vinhas da região. Duas etapas depois, chega outra das novidades desta edição, conectando o Tour com uma das últimas tendências do ciclismo.

O gravel, disciplina em que se vai misturando o andar em estradas asfaltadas com outras de gravilha, entrou, no último par de anos, em força no ciclismo. O Mundial de gravel até já reúne a elite da estrada, como Matej Mohoric, campeão, ou Wout Van Aert. Na etapa 9, à volta de Troyes, haverá 32 quilómetros de pó, pedras soltas e sterrato, como lhe chamam os italianos.

Com quatro chegadas em alto, há menos montanha de enorme dificuldade do que noutros anos. Christian Prudhomme, diretor do Tour, admite que o percurso tem menos alta montanha, mas isso “não implica que não seja muito exigente”, assumindo que se tentou quebrar a monotonia e procurar fórmulas diferentes.

Mark Cavendish concorda, dizendo que é o “percurso mais difícil” que já viu no Tour. O britânico, que deu marcha-atrás na intenção de se retirar em 2023, procurará, em 2024, uma 35.ª vitória de etapa que desempate a igualdade que, de momento, tem com Eddy Mercx no topo do ranking dos homens que mais vezes levantaram os braços no final de tiradas.

O percurso do Tour de France 2024
ASO/Tour de France

A grande sequência montanhosa chega nas últimas sete etapas. Na 14, os Pirenéus mostram o que de melhor têm, como o Tourmalet, Horquette d'Ancizan e Pla d'Adet; na 15, há a chegada a Plateau de Beille.

Se o começo é exigente, o final não é menos complicado. A etapa 19 cruza a Cime de la Bonette, com uns anormais 2.802 metros de altitude em grandes voltas, e a 20 apresenta ascensões clássicas do Paris-Nice, com chegada ao Col de la Couillole.

Para fechar, o tal contrarrelógio entre o Mónaco e Nice, que está longe de ser plano. Com Itália, San Marino, Mónaco e França, o Tour atravessa quatro estados.

As possíveis estreias de Almeida e Remco e o favoritismo de Jonas Vingegaard

Vencedor das duas últimas edições, Jonas Vingegaard entrará, sempre, no Tour 2024 como favorito para fazer o hat-trick, até pela força coletiva da Jumbo. Candidato a grande rival do dinamarquês será Tadej Pogacar, o homem dos triunfos em todos os terrenos, apesar de existirem algumas incógnitas sobre o calendário do esloveno para 2024.

João Almeida já disse que gostaria de se estrear na Grand Boucle, ficando por saber qual será o seu papel numa Emirates que tenha, também, Pogacar — e ainda há Adam Yates, terceiro em 2023, e Juan Ayuso. Remco Evenepoel, o fenómeno belga, também parece apontado a fazer o Tour, pela primeira vez, nesta edição cheia de novidades.

Para outro português, este percurso trará boas recordações. Rui Costa foi campeão do mundo, em 2013, em Florença, palco da partida do Tour. Depois de um 2023 em grande, o poveiro mudou-se para a EF-Education e, se o seu calendário o levar a França, certamente andará em fugas para tentar uma quarta vitória de tirada na maior das competições.

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