A conversa é no lóbi de um hotel em Peniche, bastante abeirado da baía do Baleal, mas Teresa Bonvalot está agasalhada. Chove, venta e muito cinzenta está lá fora, de onde viera pouco antes de um treino algures no mar que não em Supertubos: a intempérie que sopra contra a areia ainda mantinha essas ondas impróprias para consumo do Championship Tour (CT), onde ela se tornou a primeira portuguesa na história a competir entre a elite. E isso, mesmo que histórico, é-lhe estranho.
Com um casaco invernal fechado até ao queixo, boné na cabeça e cara com bronzeado à moda de estações do ano, Teresa está no circuito mundial de surf não estando. À semelhança das duas etapas que arrancaram a época, recebeu um injury wildcard para o MEO Rip Curl Pro Portugal e está a “tentar retirar o máximo de sumo” para “crescer no meio das melhores”. Só tem 23 anos, mas é falada e destinada a qualificar-se para ali estar desde a sua adolescência.
Não o fez, em dezembro, por menos do que um triz. Chegou à final da última prova de qualificação de 2022 e terminou com os mesmos pontos que Sophie McCulloch, a quem a World Surf League depositou a bênção de se apurar com o critério de mais heats ganhos durante a época. Teresa Bonvalot teve de arranjar forma de mastigar algo que não digeriu. “Foi estranho, é duro, mas faz parte e as coisas acontecem por alguma razão. Foi sempre a isso que me agarrei”, resume na conversa que fluiu para a personalidade “muito reservada”, mas já menos tímida, a referência que tem em Patrícia Mamona ou como, às vezes, importa um atleta “demonstrar um bocadinho da parte mais pessoal” para ser “um exemplo”.
Como Teresa o fez, sem o planear e sentido “algo” de dentro, deu uma pista emocional que a obrigou a inventar comportas para as lágrimas no Havai, no pódio da tal derradeira etapa onde figurativamente morreu na praia e obrigações protocolares lhe pediram que falasse em público - dois dias antes, falecera uma familiar. E ela, longe do outro lado do mundo, agarrou-se ao que podia, surfou e quase entrou para a elite em mais uma prova de como os atletas “não são robôs”. Nem as pessoas deveriam achar que sim.
De repente, vais para a tua terceira etapa a seguir no CT. Como é que tem sido a experiência?
Sinto-me bem, tem sido non-stop, basicamente. Sem tempo pensar. Ainda não parei quase desde o ano passado. Mas sinto-me feliz, estou a ter esta experiência mesmo não estando de certa forma no CT. E realmente quero, e estou a tentar tirar o máximo do que vai, porque isto são sempre aprendizagens, estamos sempre a aprender. Como é óbvio que estou a aprender muito mais por estar uma coisa nova. O surf também é uma coisa que nunca é certa, está-se sempre, sempre, sempre a aprender. É algo que me fascina através do surf, estar no meio dessas experiências. Porque nós temos sempre coisas a melhorar e conseguimos sempre melhorar. É sempre uma evolução.
No fundo, competes no CT não estando lá, porque estás a substituir uma surfista lesionada. É estranho? Às vezes esqueces-te?
Estou e não estou, sou a primeira substituta em que posso fazer pontos, por isso estou a fazer pontos. Mas sim, também de repente posso já não ser chamada por as miúdas que estão magoadas voltarem a estar boas. Mas pronto, estou bem com isso e tento realmente tirar o máximo de sumo nas alturas que realmente posso, que são estas, por estar dentro do evento.