O sol raiava, tórrido e implacável, em setembro de 2021, derretia a Praia de Carcavelos onde Francisca Veselko aguardava no paredão, boné na cabeça, mochila num ombro e a prancha atrelada. Pouco passara desde que na sua pessoa acumulara um feito precoce, raro também, mas sobretudo elogiável: era campeã nacional de surf em duas categorias distintas, a sua de sub-18 e a sénior.
No fundo, era a campeã das adolescentes e das mulheres, duas horas juntas num corpo talentoso para rasgar ondas com as quilhas de uma prancha. Ainda de parcas palavras, talvez na timidez vinda do desábito de entrevistas, demorou a soltar-se no discurso mas quando lá o fez, deixou uma garantia - “não tenho medo nenhum de ir contra elas”.
Francisca Veselko jamais tinha competido em alguma prova do circuito mundial de surf quando deu a dita entrevista à Tribuna Expresso. Hoje, um ano e meio volvido, tão pouco o fez, mas a frase exteriorizada na direção do “elas” era aplicável às estrangeiras, às surfistas vindas ao mundo noutras latitudes contra quem queria medir-se. E na noite desta sexta-feira, fez mais do que isso.
Rumo à praia de Seaside de San Diego, na Califórnia, a portuguesa viajou e sagrou-se campeã mundial júnior, sendo a melhor de 24 surfistas internacionais. Na final ganhou a Sawyer Lindblad, apanhando mais uma onda do que a norte-americana e foi essa que lhe valeu ser erguida em ombros quando pisou o areal: Francisca ganhou por 0.13 pontos.
Natural da linha de Cascais, a surfista de 19 anos regressará a Portugal com um título inédito no surf em feminino e que, cá do burgo, apenas Vasco Ribeiro logrou tocar no masculino, em 2014. O igualmente natural das beiças cascalenses que repousam sobre o mar, contudo, festejou em Ribeira d'Ilhas, na Ericeira, perto de casa e sem necessidade de atravessar meio-mundo para conquistar o título.
Eis então que Portugal, o felizardo país banhado a oeste e a sul por mar, felizardo por ter praias em tudo quanto é lado onde é fácil aparecerem ondas de vigor mundial tem agora em Francisca Veselko a melhor do mundo do escalão júnior. Ela será mais um nome e uma façanha para chamar atenção à modalidade.
E a surfista agora terá ainda mais propriedade para ir atrás do objetivo que já tinha há ano e meio: entrar no Championship Tour, o circuito mundial de surf para o qual nunca uma portuguesa se qualificou.