A derrota contra Marrocos eliminou Portugal do Mundial 2022, adiando o sonho de juntar o principal título global à conquista europeia de 2016. Se a saída de cena do Catar deixa a seleção cheia de incógnitas, começando na liderança técnica, há a certeza reforçada de que o futuro do futebol nacional está entregue a gerações altamente talentosas.
No Catar, Fernando Santos só utilizou dois jogadores (Ronaldo e Pepe) acima dos 30 anos, já que o também convocado Rui Patrício não teve direito a minutos. Uma quebra no uso de veteranos que confirma a tendência que vem do Mundial passado [ver gráfico], no qual havia oito nomes da lista acima das três décadas de vida.
No Rússia 2018, a seleção tinha uma média de idades de 27,7 anos, tornando-o na 11.ª mais velha; em 2022, a média baixou para 26,8 anos — mesmo com um jogador de 37 e outro de 39 anos —, somente a 19.ª das 32 em competição.
O rejuvenescimento da seleção não se vê só por em 2022 terem ido quase tantos sub-23 (9) como na soma de 2020 com 2018 (5+6), mas também pela importância dessa juventude. Por exemplo, em 2018 só quatro jogadores com menos de 23 anos foram titulares em, pelo menos, uma partida. Já em 2022, houve oito sub-23 — todos menos Matheus Nunes — a jogarem de início, pelo menos, uma vez.
O assalto das novas gerações ao protagonismo é a consequência natural do trabalho feito ao longo dos últimos anos. Se o rendimento dado na elite por várias destes jovens protagonistas é inequívoco — Rafael Leão foi o MVP da última Série A, em Itália, Vitinha é titular no meio-campo da galáxia de estrelas do PSG, Gonçalo Ramos é o melhor marcador da I Liga —, a verdade é que esta qualidade já se vinha anunciando desde as camadas jovens.
Desde 2014, não houve ano em que uma seleção ou clube português não tenha sido campeão ou vice-campeão da Europa de um torneio jovem. A mais destacada geração foi a de 1999, com Diogo Costa, Dalot, Florentino ou Leão a terem sido os primeiros na história do futebol a juntarem um Euro sub-17 (em 2016) a um sub-19 (em 2018), mas a linha dos êxitos na formação tem sido contínua.
O contraste com o passado recente é evidente. Entre 2003, quando a geração de Miguel Veloso ou João Moutinho venceu o Euro sub-17, até 2016, quando a geração de 99 ganhou outra vez essa competição, Portugal não ergueu qualquer troféu internacional em nenhum dos escalões.
Agora, o conhecimento da glória une a maioria dos que estiveram no Catar: entre os 26 que foram ao Mundial, só Nuno Mendes, que falhou competições jovens por já estar nos A, Matheus Nunes e Otávio, que só começaram a representar Portugal na equipa principal, não foram campeões ou vice-campeões internacionais por clubes ou seleções na formação ou em idade sénior.
Um ponto une o passado e o presente: a preponderância dos três grandes na formação dos jogadores. Considerando o último clube que o futebolista representou antes de ascender aos seniores, olhando aos seis grandes torneios que Portugal disputou na última década, houve 18 jogadores diferentes formados no Sporting a serem convocados, 14 oriundos do Benfica e 11 do FC Porto. Só o Belenenses, com quatro jogadores (Rolando, Rúben Amorim, André Almeida e Eliseu) e o Boavista, com três homens (Ricardo Costa, Raúl Meireles e Bruno Fernandes), conseguiram ter mais do que um futebolista convocado fora do universo dos três dominadores da bola nacional.
Ainda assim, há uma grande mudança na última década. Se o Sporting se manteve sempre como grande fornecedor de talento (andou sempre os sete e os 11 jogadores formados), houve um enorme crescimento por parte do Benfica.
Nos primeiros torneios em análise, a presença de formados no clube da Luz é quase irrelevante. Em 2012 só foram dois (João Pereira e Nélson Oliveira) e em 2014 o único representante foi mesmo João Pereira, na altura com 30 anos e um produto pré-Seixal.
Em 2016 já houve as presenças de Renato Sanches, Danilo Pereira e André Gomes e a subida culminou no Mundial do Catar, com o Seixal a igualar Alcochete com sete convocados.
Se em 2012 o Sporting representava 43% dos formados da lista (10 de 23), em 2022 esse número desceu para 26,9% (sete de 26). Em sentido inverso, o Benfica foi dos 8,6% de 2012 ou dos 4,3% de 2014 para os 23% de 2020 ou os 26,9% de 2022.
Este texto faz parte de um conjunto de conteúdos que o Expresso publica para falar diretamente com os leitores mais jovens e sobre aquilo que os afeta mais de perto. Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail.