Caso Portugal alcance as ‘meias’ do Euro 2024, há meia dúzia de jogadores que vão falhar esse jogo caso recebam um cartão amarelo no duelo com a França. Duarte Gomes, antigo árbitro internacional, considera que a regra é “demasiado rigorosa” e defende que a UEFA deveria repensá-la tendo em conta “a adrenalina e intensidade que cada jogador coloca em campo”. Porque torneios destes são “momentos únicos” na vida de um futebolista
I. Portugal joga esta sexta-feira o apuramento para as meias-finais do Campeonato da Europa. A seleção nacional fez um trajeto imaculado na fase de qualificação e ganhou dois dos três jogos oficiais que disputou na prova (perdeu apenas aquele que a calculadora permitiu que perdesse).
Ainda assim não se livrou - nem se tem livrado - de escrutínio mediático apertadísssimo, fruto da enorme expetativa criada em torno desta geração de jogadores. É compreensível, mas só até certo ponto.
Querer ganhar por muitos e com exibições colossais uma atrás da outra é o sonho de qualquer adepto. Dos nossos e dos outros. Mas a um nível tão alto, os jogos geralmente decidem-se nos pormenores: na forma como são preparados e planeados, em função da qualidade e forma do adversário, tendo em conta a condição física, psicológica e emocional dos atletas e avaliando outras variáveis, como a qualidade do relvado ou o estado do tempo. Tudo conta para perceber quem joga e como se joga.
Cá fora, nenhum de nós sabe ao certo o que se passa lá dentro. Não sabemos com exatidão como está a moral do grupo, quem se sente mais ou menos cansado, mais ou menos confiante, mais ou menos motivado. Não sabemos quem sente que pode decidir tudo num rasgo de genialidade. Mas quem está lá sabe. Sabe porque esse é o seu trabalho, essa é a sua obrigação.
Quando a nossa participação terminar - pode ser mais logo ou não (espero que não) - podemos e devemos fazer balanços, perceber o que correu bem e mal, responsabilizar ou elogiar, exigir explicações ou aplaudir. Podemos tudo, porque no fim é que se fazem as contas.
Mas criticar e envenenar o grupo com opiniões destrutivas quando tudo (ainda) está em aberto não me parece a forma mais inteligente de apoiar. É que essa nuvem tóxica chega até eles. E por muito fortes, experientes e imunes que sejam, acaba por envenenar-lhes a alma, retirando confiança e aumentando a ansiedade. Não é assim que se ajuda aqueles que lutam pelos nossos sonhos. Não é assim que se coloca a moral da malta em alta. Para refletir (para memória futura).
II. Artur Soares Dias e a sua equipa já regressaram a Portugal depois de uma participação extremamente positiva neste Europeu. A equipa de arbitragem lusa dirigiu três jogos - dois da fase de grupos, um dos oitavos de final - com exibições muito sólidas e competentes. A este nível, nem sempre fica quem merece e há ‘n’ variáveis maiores, bem maiores do que a meritocracia evidenciada em campo. Mas para a história ficará uma prestação conjunta digna, numa altura em que parece claro o crescimento da nossa arbitragem além-fronteiras. Parabéns a todos... e obrigado. Orgulho!
III. A exibição de dois cartões amarelos ao mesmo jogador (em jogos diferentes) pode custar a meia-final àqueles que lá chegarem. Ou seja, um atleta que seja advertido em dois dos cinco jogos que realizou na competição, ficará privado de participar num momento desportivamente importante para si, para a sua seleção, para o seu país.
Não me parece justo. O cartão amarelo é exibido em infrações disciplinares menores e, a este nível, com tanto que está em disputa e tendo em conta a adrenalina e intensidade que cada jogador coloca em campo, é demasiado rigoroso privar alguém de estar no jogo seguinte (neste caso, será uma meia-final) só porque foi amarelado duas vezes em 450' de futebol.
A UEFA podia e devia repensar este tipo de suspensões, por exemplo, passando o limite para o 3.° amarelo ou então limpando o cadastro a partir da próxima fase.
Estes são momentos únicos na vida e carreira de muitos atletas e seria justo que, a menos que tenham cometido ilícito grave, todos pudessem estar aptos para as decisões a sério.