Vamos lá falar sobre o tema da atualidade, de forma clara e direta: Taremi é o novo saco de pancada do futebol português. Não é o primeiro nem será o último, é apenas o atual.
Esta constatação é evidente, se tivermos em conta tudo o que lemos e ouvimos nas redes sociais e imprensa.
Importa recordar que, o que hoje acontece com o avançado iraniano - que fique desde já muito claro que não faço juízos de valor pessoais sobre condutas de jogadores, porque enquanto comentador de arbitragem devo cingir-me apenas à análise técnica de lances -, aconteceu antes com outros jogadores talentosos pelo mesmo ou por outros motivos.
Nos seus tempos, o enorme Paulo Futre - que, importa não esquecer, jogou no Sporting, Porto e Benfica - foi catalogado como "fiteiro", tantas foram as vezes em que caiu nas áreas adversárias sem aparentemente sofrer falta. O próprio Paulo, que é genuíno e sincero, é hoje o primeiro a falar sobre isso, com humildade e humor.
Depois e também antes dele, muitos outros foram rotulados como "mergulhadores" ou "caceteiros": de João Vieira Pinto a Paulinho Santos, de Mozer a Jorge Costa, de Pepe a Rúben Dias, de Jonas a Nuno Santos, de Argel a Paulinho, de Oceano a Danny, sem esquecer Fernando Couto, Otamendi, Otávio, Gabriel e tantos, tantos outros.
Quando o tema preferido do povo é "pancada e queda fácil", há escolhas para todos os gostos e emblemas. É muito simples: quem for sincero e tiver boa memória, não aponta o dedo a ninguém.
Não pensem que este fenómeno, o dos carimbos, é exclusivamente nacional. Não é.
Lá fora, Paul Gascoigne, Luís Suárez, Diego Costa, Eric Cantona, Roy Keane, Genaro Gattuso, De Jong e até Cristiano Ronaldo (só para citar os que me vêm à cabeça) foram/são apontados como protagonistas de uma ou de outras práticas. Podem dizer-me que "não há fumo sem fogo" e que há condutas que são fáceis de referenciar. Sim, às vezes é verdade. Às vezes.
O que eu digo é que tudo isso é irrelevante e que não estamos a focar naquilo que verdadeiramente interessa, que é a decisão que o árbitro toma a cada momento.
Se o árbitro for competente e ajuizar bem as situações que tiver pela frente, o ruído exterior acalma, as pessoas entendem, a verdade desportiva é reposta e a justiça do jogo está garantida.
Os jogadores serão sempre autores de boas e más práticas. Em campo, farão o que devem e não devem para alcançar os seus objetivos. É por isso que existem regras e que o seu cumprimento deve ser vigiado por uma terceira equipa, a de arbitragem.
A lei é muito clara e, nesses casos, refere que o ato de simular é passível de cartão amarelo. Também refere que protagonizar um entrada com força excessiva ou atuar de forma violenta é sancionado com vermelho direto. Se a equipa de arbitragem for competente e decidir em conformidade, a cada momento, está tudo certo.
Isto leva-nos para algo mais subjetivo, que é o de tentarmos perceber o que é essa coisa de "ser competente". Bem, se eu soubesse o segredo, não tinha asneirado tanto durante a carreira, mas em tese há um conjunto de parâmetros que conseguem balizar a ideia:
- Um árbitro competente é aquele que domina as regras do jogo e sabe sentir o pulso a tudo o que acontece em campo. É aquele que prepara o seu trabalho e conhece os intervenientes que tem pela frente, a cada momento, em cada contexto. Um árbitro competente é aquele que consegue abstrair-se de tudo o que o rodeia, focando no essencial. É aquele que se movimenta a preceito, de forma a estar bem colocado para analisar. É aquele que trabalha em equipa e é corajoso, firme, independente. E é também aquele que aplica as leis com sensatez, uniformidade e coerência.
Dito assim parece fácil mas em campo, com a dinâmica de movimentos, a velocidade de circulação da bola/jogadores e tantos outros fatores de pressão/distração, não é fácil, nada fácil.
Os árbitros terão uma época muito desafiante pela frente, onde mais uma vez parece que o jogo se jogará mais fora do que dentro das quatro linhas.
Têm que ser fortes e imunes ao que se diz e pede, atuando de forma pragmática e equidistante, perante o que vêem e intuem em cada situação. Não pode haver rótulos antes da hora nem justiça popular, tal como não pode haver benefícios ou vantagens a quem usa de expedientes antidesportivos.
As decisões serão sempre técnicas e ajustadas à realidade de cada lance, algo que todos devem aceitar e respeitar com desportivismo e elevação, porque a função é "só" a mais difícil do espetáculo.
Ao povo o que é do povo. Ao árbitro o que é do jogo. Doa a quem doer.