Quando os equipamentos oficiais das equipas são apresentados antes de cada grande competição, geralmente são motivo de exame minucioso por parte dos adeptos, sobretudo daqueles que gastam uns bons trocos a colecionar as camisolas usadas pelos craques em representação de um clube ou país. Uns gostam da conjugação das cores, outros não gostam do estampado, mas isto do feio e do bonito, já se sabe, é muito complexo e subjetivo.
No que diz respeito às seleções, na maioria dos casos as cores representadas nos equipamentos espelham as das bandeiras nacionais. Mas, como em (quase) tudo, também aqui há exceções que confirmam a regra, umas mais inteligíveis do que outras.
No caso do Japão, continua a ser intrigante o porquê de no equipamento da seleção nacional predominar o azul, quando a bandeira tem apenas duas cores plasmadas em igual número de formas geométricas: um círculo vermelho no centro de um retângulo branco.
A dúvida carece de uma explicação oficial até hoje, a origem real da cor azul da equipa de futebol não está documentada, embora a teoria mais credível pareça estar associada a simbolismo e superstição.
Vamos aos factos. Sabe-se que nos Jogos do Extremo Oriente de 1930, o Japão foi representado pela equipa da Universidade Imperial de Tóquio, cuja cor símbolo é o azul claro. Os nipónicos levaram o título para casa. Seis anos depois, nos Jogos Olímpicos de Berlim, a universidade voltou a representar o Japão, que ainda não tinha ligas profissionais de futebol, vestida de azul e branco, e estreou-se com uma vitória por 3-2 sobre a Suécia. Dir-se-ia que o azul já era sinal de sorte, virou superstição, embora não tenha impedido a goleada (8-0) sofrida três dias depois, perante a Itália.
Continuemos. O futebol só havia de ganhar maior expressão no Japão no final da década de 1980, altura em que surgiram os primeiros projetos para profissionalizar a modalidade. Entre 1988 e 1992, a seleção japonesa resolveu inovar e utilizou equipamentos com as cores branca e vermelha, em referência à sua bandeira. Mas na altura houve rumores de que a mudança se devia à insistência do treinador Kenzo Yokoyama, que foi guarda-redes durante largos anos no clube da Mitsubishi Motors - cujas cores são o vermelho e branco. Só que, com a eliminação nas fases de qualificações para o Mundial de 1990, para os Jogos Olímpicos de Seul e para os de Barcelona, o azul (e o branco) voltou rapidamente a dominar. Coincidência ou não, a seleção conseguiu o apuramento para o Campeonato do Mundo de 1998, na França, e de lá para cá nunca mais falhou um Mundial, sendo esta a sua sétima participação.

A seleção do Japão deixou origamis de Tsurus no balneário (que ficou impecavelmente limpo), após o jogo com a Costa Rica, no Mundial do Catar
Shaun Botterill - FIFA
Porém, a importância do azul na cultura japonesa é milenar e nada tem a ver com futebol. O índigo japonês, planta que dá origem à cor azul anil, ganhou notoriedade no período Edo (1603–1868), considerada uma era de ouro do país. Reza a lenda que os samurais usavam tecidos tingidos pelo índigo japonês por baixo da armadura devido às suas propriedades antibactericidas. Desde então que o azul tem forte presença na cultura japonesa em quase tudo e quem visita o país pode comprová-lo. Para os japoneses, o azul representa também pureza e limpeza, devido aos mares e oceanos que rodeiam as ilhas nipónicas.
Com o apelido de “Samurais Azuis”, criado pela Associação Japonesa de Futebol (JFA) para apoiar a seleção no Mundial da Alemanha, em 2006, os jogadores nipónicos vestem neste Mundial um equipamento inspirado na arte do origami (dobragens de papel), nomeadamente nos tão tradicionais pássaros de papel, os tsurus. Tsuru é uma ave sagrada do Japão, que simboliza saúde, sorte, felicidade, longevidade e fortuna.
Diz a lenda que os tsurus são capazes de viver até 1.000 anos e que quando alguém dobra 1.000 origamis com o seu formato, pensando num desejo, esse desejo torna-se realidade. Recorde-se que no Campeonato Mundial de 2002, organizado conjuntamente pelo Japão e a Coreia do Sul, foram lançados 2,7 milhões de origamis tsurus no Estádio Internacional de Yokohama após a final, para felicitar os vencedores.
E como (quase) tudo tem um significado e tradição no Japão, a Adidas lançou uma campanha de marketing em que revelou o equipamento dos japoneses para este Mundial através das populares mangás de futebol Blue Lock e Giant Killing.
No entanto, houve quem resolvesse “inventar” novas camisolas e em fevereiro deste ano começaram a circular nas redes sociais fotografias de uma camisola com imagens de mangás como sendo esta a camisola oficial da seleção do Japão no Mundial do Catar, desenhada por um designer digital. Daí até passarem a ser comercializadas réplicas falsas do desenho, foi um instantinho. A tal ponto que a própria Adidas, teve de vir a público assegurar que a camisola oficial ainda não tinha sido apresentada.