Ninguém sabe muito bem o que aconteceu, mas é provável que tenha sido assim:
O médio americano Walter Bahr chutou de um ângulo ambicioso num lance que o guarda-redes inglês Bert Williams controlaria sem grandes dificuldades em circunstâncias normais.
Sucede que do nada apareceu Joe Gaetjens, surpreendendo Williams, todos os outros futebolistas britânicos – entre eles, o celebérrimo Alf Ramsey –, os adeptos no Estado Independência de Belo Horizonte e, possivelmente, o mundo: a seleção norte-americana, profundamente amadora e da qual nada se esperava, tinha marcado à Inglaterra e acabaria por vencer o jogo numa jogada que a câmara de TV não apanhou e que os fotógrafos por pouco não deixavam escapar.
Poderá ter sido desta forma: o cabeceamento de Gaetjens resultou de um mergulho arriscado que levou o avançado dos EUA a aterrar de cara no chão antes de ver a bola entrar na baliza. Uma das raras fotos desse instante, em que Ramsey parece não acreditar no que vê, sugere que Bahr foi mal batido pelo intrépido Gaetjens que terminaria o encontro levado em ombros pelos colegas.
Independentemente dos relatos, a 3 de julho de 1950, no Mundial do Brasil, os EUA chocaram o mundo do futebol, e Gaetjens e os seus colegas vitoriados como heróis nacionais.
Depois, alguns deles passaram à obscuridade, sobretudo Gaetjens cujo fim trágico nunca foi devidamente esclarecido.
A prisão política
Joe Gaetjens nasceu no Haiti numa família de classe média alta e o dinheiro nunca seria problema para o miúdo corpulento com queda para o futebol. Jogando como avançado centro, Gaetjens destacava-se pelos seus cabeceamentos certeiros que ajudaram o Etoile Haitienne a conquistar dois campeonatos nacionais.
Mais tarde, o prolífico Gaetjens partiria rumo a Nova Iorque para estudar contabilidade e jogar pelo Brookhatan, cujo dono também era o patrão do restaurante onde o avançado lavava pratos para uns dinheiros extra. A sua capacidade goleadora levou-o a ser convocado para a seleção americana e, cortando a história a direito, Gaetjens foi parar ao Mundial do Brasil, em 1950, onde marcou aquele golo histórico.
Depois, Gaetjens lesionou-se, pendurou as chuteiras, voltou ao Haiti, constituiu família, abriu um negócio de lavandarias, promoveu localmente o futebol – até que um dia foi dado como desaparecido.
Em 1964, o ex-jogador foi levado pela polícia do regime opressivo de François Duvalier e nunca mais foi visto com vida. Os relatos são díspares, mas tudo leva a crer que Duvalier, sugestionado pelo facto de Gaetjens ter dois irmãos politicamente engajados, o tenha detido, torturado e assassinado.
Só alguns anos mais tarde é que a família seria notificada oficialmente da morte de Gaetjens, embora os detalhes nunca tenham sido revelados. À “BBC”, o filho garantiu que a CIA tem documentos que colocam Duvalier na prisão na noite em que o sei pai terá sido morto aos 40 anos. Também disse que escreveu um livro e que esta história dava um filme.