Pela primeira vez, um Mundial de futebol será disputado em novembro e dezembro. A circunstância inédita que rodeia a competição que colocará o planeta com os olhos no Catar, entre 20 de novembro e 18 de dezembro, fez o já apertado calendário do futebol ficar ainda mais congestionado. É este engarrafamento competitivo o objeto do mais recente estudo da Fifpro, o sindicato internacional dos jogadores profissionais, em parceria com a Football Benchmark.
Uma das mais relevantes conclusões realça a seleção nacional: nas duas últimas épocas, Portugal tem a equipa cujos jogadores somaram mais minutos, num total de 135.237.
Analisando o período entre 12 de julho de 2021 e 24 de outubro de 2022, isto é, toda a temporada 2021/22 e o início da 2022/23, o trabalho detalha o pouco tempo de descanso que muitos futebolistas têm tido, o excesso de viagens ou a desigualdade de sobrecarga competitiva entre diversas seleções que estarão no Catar, deixando o aviso para o risco de se “aumentar o risco de lesões musculares e o stress mental”.
Estando entalado a meio da temporada, o Mundial não foi precedido pelo fim das competições e não antecede as férias dos jogadores. Assim, indica o estudo, em anteriores competições houve, em média, 31 dias prévios e 37 dias posteriores ao Mundial sem encontros oficiais. Em 2022, em média, cada futebolista competiu sete dias antes do começo do torneio e voltará a fazê-lo oito dias depois.
Olhando a carga das diferentes seleções, Portugal destaca-se no conjunto das duas últimas épocas. Desde o arranque de 2021/22, os comandados de Fernando Santos contam, em média, com 5.200 minutos dentro de campo, o equivalente a 58 jogos de 90 minutos. Atrás da seleção nacional estão o Brasil, o México e a França.
Quantidade de minutos, divididos por tipo de competição, que os jogadores de cada seleção acumularam entre o começo de 2021/22 e 24 de outubro de 2024
Fifpro/Football Benchmark analysis
Reduzindo o campo de análise só a 2022/23 e até 24 de outubro, Portugal também lidera, com 30.986 minutos. Os 26 de Fernando Santos são, aliás, os únicos que superam os 30.000 minutos em campo nesta campanha, com o Brasil, a Alemanha e a Coreia do Sul atrás.
Se Portugal se destaca na sobrecarga competitiva, os anfitriões realçam-se pela falta de minutos oficiais. Os eleitos pelo Catar só jogaram, desde o arranque de 2021/22, um total de 67.853 minutos — apenas 6.777 desses minutos foram em competições internacionais de clubes. Optando por um longo estágio de seis meses prévio ao Mundial, os futebolistas do Catar só têm 2.150 minutos nesta época.
Com exceção da Coreia do Sul de Paulo Bento, os conjuntos da Ásia (Arábia Saudita e Irão, além do Catar) e África (Tunísia, Camarões ou Gana) destacam-se como coletivos com pouca rodagem competitiva.
O desgaste de Cancelo e o viajante Son
O estudo foca-se, também, nalguns casos concretos. Olhando aos jogadores de campo com mais minutos realizados entre julho de 2021 e outubro de 2021, Van Dijk é o líder, com 7.597 minutos. João Cancelo surge em segundo, com Sadio Mané, Antonio Rudiger ou Harry Kane a também terem estado em campo durante mais de 7.200 minutos no período estudado, o que equivale a 80 jogos de 90 minutos.
Outro caso que evidencia o cansaço a que alguns jogadores de elite estão expostos é o de Heung-min Son, a estrela da Coreia do Sul de Paulo Bento. Desde julho de 2021, o atacante do Tottenham viajou 146.104 quilómetros para ir representar a sua seleção em compromissos na Ásia e depois regressar a Inglaterra. Só nos primeiros 23 dias de outubro, o avançado acumulou 600 minutos em encontros com menos de cinco dias de distância entre eles.
Simon Colosimo, secretário-geral da Fifpro, realça que os “dados mostram que o desgaste físico e mental a que o calendário sujeita os jogadores evidencia que a sua saúde não é tida em conta” no momento de fazer escolhas quanto aos períodos de descanso. “Todos os responsáveis devem recolocar o foco na garantia da saúde dos futebolistas, que beneficiariam de um calendário mais equilibrado”, considera o dirigente.