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Richarlyson, ex-internacional brasileiro, assume ser bissexual: “Os jogadores héteros têm de abandonar o campo num episódio de homofobia”

Richarlyson, ex-internacional brasileiro, assume ser bissexual: “Os jogadores héteros têm de abandonar o campo num episódio de homofobia”
Joe Giddens - EMPICS
Enquanto jogador de futebol, Richarlyson teve sempre que lidar com o rumor de que seria homossexual, mas nunca aceitou qualquer rótulo. Agora, num podcast que aborda o machismo e a homofobia no futebol brasileiro, decidiu assumir a sua bissexualidade, mas confessa não ter muitas esperanças que o seu posicionamento venha mudar alguma coisa

A "TV Globo" lançou o primeiro episódio do podcast “Nos Armários dos Vestiários", uma série que aborda o preconceito, em particular o machismo e a homofobia, que se sente no futebol brasileiro, e o primeiro convidado foi Richarlyson. O antigo jogador, retirado em 2021, somou duas internacionalizações pelo Brasil e passou por clubes como o São Paulo, Atlético Mineiro ou Salzburgo, conquistou três campeonatos do seu país, duas Copas Libertadores e um Mundial de clubes. Hoje é comentador desportivo e assumiu ser bissexual.

“A vida inteira me perguntaram se sou gay. Eu já me relacionei com homens e com mulheres. Só que aí eu falo aqui e daqui a pouco sai a notícia: "Richarlyson é bissexual". E o meme já vem pronto. Dirão: "Nossa, mas jura? Eu nem imaginava". Cara, eu sou normal, eu tenho vontades e desejos. Aí vai chover reportagens e o mais importante não vai mudar, que é a questão da homofobia. Infelizmente, o mundo não está preparado para ter essa discussão e lidar com naturalidade com isso”, disse o ex-jogador durante a participação no podcast.

Richarlyson falou abertamente da sua bissexualidade sem sequer ser questionado sobre ela. O brasileiro realçou que lhe tem sido cobrado um posicionamento, algo que as pessoas consideram ser importante no mundo do futebol. “Hoje eu resolvi falar: sou bissexual. Se era isso que faltava, ok. Pronto. Agora eu quero ver se realmente vai melhorar, porque é esse o meu questionamento”, afirmou, realçando que “o Brasil é o país que mais mata homossexuais”.

Mas, em resposta à sua própria questão, Richarlyson mostrou-se pouco confiante que o seu posicionamento altere alguma coisa no futebol brasileiro. O ex-jogador considera que não lhe é possível mover montanhas para acabar com crimes ou a homofobia no futebol. Até porque o futebol brasileiro só viu uma pessoa que jogou no Brasileirão e na seleção falar abertamente sobre este tema: ele próprio.

Antes destas declarações, foram as palavras de outros que mais deram que falar. Em 2007, José Cyrillo Júnior, na altura diretor do Palmeiras, insinuou que Richarlyson seria homossexual. O então jogador apresentou queixa na sequência das declarações, mas o juiz que ficou responsável pelo caso decidiu arquivá-lo por acreditar que não se deveria aceitar jogadores homossexuais no futebol brasileiro.

“Isso sim, deixou-me muito triste, porque em nenhum momento eu senti que aquilo era uma coisa normal. Era uma coisa muito pejorativa. Isso foi muito ruim não só para mim. Ser homossexual não é demérito para ninguém e no futebol não deveria ser um assunto tão polémico”, afirmou.

Para Richarlyson, estas situações acabaram por prejudicar a sua carreira como jogador de futebol: “Com certeza, minha carreira poderia ter sido muito melhor em termos mediáticos por aquilo que eu construí dentro do futebol se não tivesse essa pauta [sexualidade]. Isso é visível, todo mundo sabe disso”.

O brasileiro falou ainda da importância de punir quem tem um comportamento homofóbico, particularmente dentro dos estádios, além da importância do posicionamento dos outros jogadores.

“Os próprios jogadores têm que se posicionar melhor sobre a situação, especialmente os heterossexuais. Não é questão de vestir a camisola com um arco-íris. É, quando acontecer essa situação de homofobia, sair de campo. 'Espera aí, a torcida não está respeitando o meu companheiro ou meu adversário como ser humano? Então, eu não vou voltar a jogar' Eu tenho amigos e ex-companheiros de profissão que realmente tiveram momentos difíceis na sua carreira por quererem ser aquela pessoa que ele queria ser, mas era reprimido pelos seus clubes e até pela sua torcida”, disse.

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