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Crónica de Jogo

No fio da navalha até à descolagem final

A seleção nacional conseguiu frente à Coreia do Sul a primeira vitória (32-24) no Mundial de 2023, num jogo em que o resultado, tal como na derrota da estreia, volta a ser enganador: só nos últimos 10 minutos Portugal conseguiu descolar dos asiáticos

Lídia Paralta Gomes

JOHAN NILSSON

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A falsa perceção dos números pode enganar-nos para um lado ou para o outro. Há dois dias, na estreia de Portugal no Mundial de andebol, os quatro golos de diferença para a Islândia pareceram de alguma forma desajustados, que nem injustiça maquiavélica. Nem sempre se está do lado errado dessa história, dessa lógica da batata, chamemos-lhe assim, porque no final pouco importa se são muitos ou poucos os golos de diferença: basta um para a alegria e um para a desilusão.

Frente à Coreia do Sul, historicamente uma das melhores equipas asiáticas e treinada pelo português Rolando Freitas, Portugal era favorito e entrou a jogar como favorito. Mas depois, por excesso de confiança, a equipa recreou-se com rendilhados desnecessários, permitindo que os supersónicos coreanos pudessem sonhar. Só nos últimos minutos, e muito por desespero do adversário, a seleção nacional estabilizou e descolou no resultado, uns oito golos de diferença que, lá está, contam apenas esta última parte da história e não os 50 minutos anteriores.

E se Portugal chegou aos 10 minutos finais com uma ténue vantagem como ponto de partida para um resultado gordo, muito tem a agradecer aos dois guarda-redes: Miguel Espinha na 1.ª parte e Manuel Gaspar na 2.ª , este último a evitar várias vezes que os coreanos empatassem um jogo em que Portugal entrou a ganhar 7-3. Nesse período inicial, a rapidez dos adversários estava longe de ser um problema, com os asiáticos a acumularem erros. Espinha ia defendendo o resto. A falsa sensação de jogo fácil terá entrado então na mente dos jogadores portugueses, que deixaram de jogar simples para tentar jogar bonito, abusando nos passes artísticos e nas jogadas aéreas. Os erros não tardaram a aparecer. E em catadupa.

No final da 1.ª parte, já a Coreia do Sul se aproximava rapidamente, sentindo o cheiro a sangue que cada assistência disparatada e exclusão portuguesa ia deixando pelo chão. O jogo chegou a estar a 10-8, depois a 11-9 e 12-10. Na buzina para o intervalo, Portugal tinha conseguido colocar a vantagem de novo em três golos (15-12).

JOHAN NILSSON

No regresso dos balneários, a seleção nacional não se viu mais consistente e a Coreia cortou mesmo a desvantagem para um golo. Assim se andou em boa parte dos segundos 30 minutos, com Portugal a não conseguir fugir no resultado, permitindo sempre a reação do adversário. Manuel Gaspar foi então a botija de oxigénio de Portugal, com a equipa coreana também a mostrar inexperiência quando teve o empate na mão, em diversas ocasiões.

E falhando nos momentos-chave, os asiáticos foram-se abaixo. Nos 10 minutos finais sucederam-se as bolas atabalhoadas, presas fáceis para Gaspar. A Coreia do Sul não marcou nos últimos oito minutos e foi aí que Portugal engordou o marcador, aproveitando cada situação de contra-ataque para enterrar mais a cruz dos coreanos, que começam o Mundial com duas derrotas. Já Portugal fica com a main round a um pequeno passo, mas é importante vencer a Hungria na segunda-feira para chegar a próxima fase levando pontos da primeira.

Num encontro em que o coletivo só se encontrou verdadeiramente no final, André Gomes, com oito golos, foi o destaque ofensivo de Portugal. Mas os melhores em campo foram mesmo os dois guarda-redes, um sinal de alerta para o que aí vem.