O Tour de France 2024 começa com uma enorme surpresa: Romain Bardet é o primeiro camisola amarela
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De forma totalmente inesperada, o francês da DSM ganhou a primeira etapa, impondo-se após uma fuga a dois, em parceria com o seu companheiro Van den Broek. A Emirates agitou a corrida a mais de 70 quilómetros do fim, mas Bardet, com uma grande ajuda do colega de equipa, dá aos franceses um arranque de Tour épico
Romain Bardet chegou a parecer a mais credível esperança francesa em muito tempo. A mais viável forma de acabar com a maldição. Desde 1985 que os gauleses não triunfam no Tour, a sua corrida, a competição que criaram e universalizaram.
Para quebrar o jejum, muitas expetativas foram colocadas em Bardet. Ele tornou-se num voltista de elite, mas o melhor que conseguiu foi o segundo lugar do Tour, em 2016. A seca foi aumentando, Romain foi pedalando rumo ao fim da carreira.
Mas, mesmo no fim, chegou, talvez, o dia mais épico de Bardet. Na sua última Volta a França, a um ano de deixar o ciclismo, o corredor de 33 anos da DSM protagonizou uma jornada épica, memorável, inesquecível.
Estamos na idade de ouro do ciclismo e o Tour dos extraterrestres, a competição que os junta a todos, teve um arranque a condizer. Audaz, espetacular. E totalmente inesperado.
Aproveitando o terreno acidentado do percurso entre Florença e Rimini, 206 quilómetros com duas contagens de montanha de segunda categoria e quatro de terceira, a DSM lançou Bardet ao ataque, em conjunto com o jovem Frank Van den Broek. Os dois foram deixando todos para trás, resistiram ao assédio do pelotão, aguentaram-se sozinhos na frente.
Cruzaram a meta como primeiro e segundo, com Bardet agradecendo a ajuda do seu parceiro de escapada, 10 anos mais novo. O francês é o primeiro camisola amarela do Tour de France 2024.
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A maior corrida do ano partiu de Florença, na primeira vez que a competição arrancou em Itália.
Depois de Liège (2004), Londres (2007), Roterdão (2010), Leeds (2014), Utrecht (2015), Düsseldorf (2017), Bruxelas (2019), Copenhaga (2022) ou Bilbau (2023), o Tour foi recebido com glamour pela cidade-museu, deixando-se fotografar com a catedral de Santa Maria del Fiore atrás ou atravessando a Ponte Vecchio. Um postal de rara beleza num dos piores momentos da história do ciclismo italiano.
Florença é, também, chão sagrado para o desporto nacional. Na capital da Toscânia, em 2013, Rui Costa sagrou-se campeão do mundo, voltando à cidade-museu, para ele cidade-arco-íris, passados 11 anos. O poveiro ainda passou pela frente do pelotão nos quilómetros finais, tentando alcançar os escapados, mas a dupla da DSM não foi caçada.
Neste Tour dos super-heróis, neste cartaz perfeito, há quem não venha para homenagens nem para ver as paisagens. Aproveitando a dureza do percurso, cheio de sobe e desce, a UAE-Emirates, com a sua equipa de sonho, começou cedo a impor um ritmo que foi sufocando o pelotão.
Ainda antes disso, já Mark Cavendish sofria. O britânico, que procura neste Tour uma 35.ª vitória que o coloque sozinho como homem com mais etapas conquistadas, penou devido às subidas e ao calor, com os mais de 30 graus a juntarem-se às ascensões para desenhar um cenário idóneo para a armadilha que a Emirates queria colocar ao pelotão.
A mais de 70 quilómetros do fim, o “Real Madrid do Tour", como batizado por Remco, iniciou o fogo de artifício. Primeiro com Tim Wellens, depois com Marc Soler e Pavek Sivakov, corredores altamente talentosos feitos gregários, a equipa de Pogacar aceleoru o ritmo.
Na Côte de Barbotto, 5,9 quilómetros a 7,6%, não só os sprinters não conseguiram acompanhar o ritmo. Também homens com ambições na geral, como Louis Meintjes e David Gaudu, ficaram para trás.
No entanto, nas contagens de montanhas seguintes, a Emirates não foi ao limite. Ayuso, o jovem craque espanhol, passou dificuldades, e talvez tenha sido pela pior condição física de um dos escudeiros de luxo de Pogacar que a equipa não deu continuidade à ofensiva total.
ANNE-CHRISTINE POUJOULAT
ANNE-CHRISTINE POUJOULAT
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Na dianteira, aproveitando as inconsistências do grupo dos favoritos, Bardet e Van den Broek chegaram à penúltima subida apenas acompanhados por outro francês, Madouas. A 40 quilómetros do fim, este cedeu e a dupla iria solitariamente para a meta.
No topo da última subida, a Côte de San Marino, Bardet e Van den Broek tinham um minuto e meio de vantagem. A 10 quilómetros do fim já tinham menos de um minuto, a 7 somente tinham 40 segundos. Mas conseguiram chegar com 5 segundos de avançado para Wout Van Aert, o melhor do pelotão. Pogacar foi quarto, Rui Costa 39.º, João Almeida 43.º, todos com o mesmo tempo.
Mesmo no fim da carreira, Bardet conseguiu o seu momento mais glorioso. A segunda etapa volta a prometer, com dupla ascensão ao santuário de San Luca, em Bologna.