A camisola vermelha deu superpoderes no contrarrelógio a Sepp Kuss, no dia em que João Almeida se aproximou da frente na Vuelta
Manuel Bruque/EPA
O norte-americano da Jumbo-Visma nunca foi um especialista na luta contra o cronómetro, mas defendeu com unhas e dentes a sua liderança na Volta a Espanha, terminando a apenas 1.29 segundos do vencedor da etapa, Filippo Ganna (INEOS), baralhando ainda mais as contas da geral. João Almeida (UAE Emirates) brilhou e subiu ao 6.º lugar
Sepp Kuss é um daqueles tipos essenciais numa equipa. Gregário de luxo, é ele quem reboca Primoz Roglic e Jonas Vingegaard quando o terreno empina, deixando para trás ambições pessoais ou desejos de grandeza. Ele próprio assume que não é feito da massa dos líderes - discurso humilde tão pouco usual num norte-americano - e que é feliz assim mesmo, a trazer a felicidade aos outros.
Mas e se Sepp Kuss afinal tem fibra de campeão dentro dele?
Vestido com o vermelho de líder no primeiro contrarrelógio individual desta Vuelta, o super-domestique de 28 anos teria pela frente um terreno plano onde nunca foi especialista, ele que é rapaz de montanhas, na sua estatura leve e franzina, com pouco mais de 60 quilos distribuídos em 1,82 metros de altura. Mas, psicológico ou não, a camisola de líder, seja ela amarela ou encarnada, costuma dar asas a quem a veste, aquele superpoder escondido que muitos ciclistas nem sabem que têm dentro de si. Sepp Kuss, o último a começar, habituado a levar minutos e minutos nos contrarrelógios, sentiu-o: foi 13.º no circuito de 25,8 quilómetros em Valladolid, perdendo apenas 1 minuto e 29 segundos para o vencedor, o italiano Filippo Ganna, e não tanto quanto se esperaria para os favoritos à vitória final em Madrid.
João Almeida foi 4.º no contrarrelógio e subiu a 6.º da geral
Alexander Hassenstein
Desses, Remco Evenopoel, de quem todos esperavam a vitória, foi o melhor, a 16 segundos do especialista Ganna, numa etapa em que João Almeida se imiscuiu nos primeiros: foi 4.º, a 50 segundos, saltando da 10.ª posição da geral para a 6.ª, a 2.16 minutos de Kuss. Dentro da guerra particular dentro da UAE Emirates, o português bateu Juan Ayuso, 7.º no contrarrelógio: há agora 9 segundos a separar os dois, ainda que o primeiro da equipa ainda seja Marc Soler, que se mantém no 2.º lugar da geral, a 26 segundos do norte-americano da Jumbo-Visma.
Destaque ainda para o 9.º posto de Nélson Oliveira (Movistar), com Portugal a colocar dois atletas no top 10 da etapa.
Montanhas para definir hierarquias
O contrarrelógio de Valladolid em nada ajudou a definir as batalhas da geral. Quanto muito, só as baralhou. Com as montanhas dos Pirenéus a aproximarem-se, a super Jumbo-Visma terá agora de decidir (ou deixar que a estrada decida) quem é o líder e aposta para a vitória. Sepp Kuss é um excelente trepador, mas esperar-se-ia que estivesse na Volta a Espanha para trabalhar para Roglic e Vingegaard. O esloveno é agora 4.º na geral, a 1.36 minutos do colega, e o dinamarquês está ainda mais para baixo: é 7.º, a 2.22 minutos da liderança.
Na UAE Emirates, Marc Soler não parece ser material de aposta e tudo será jogado entre João Almeida e Juan Ayuso, com o português agora com uma pequena vantagem sobre o jovem espanhol. E, claro, ainda há Remco Evenepoel, 3.º a 1.09 minutos de Kuss, o mais bem colocado dos super-favoritos, mas que já mostrou algumas fragilidades na montanha nesta Vuelta.
Com tanta montanha ainda pela frente - e na sexta-feira há Col du Tourmalet - está tudo em absolutamente em aberto.