Numa Volta a Itália tão dura, uma etapa como a desta quarta-feira seria bem-vinda por todo o pelotão. No papel, 171 quilómetros tranquilos e sem dificuldades de maior entre Atripalda e Salerno, no habitualmente soalheiro sul de Itália, oportunidade de ouro para sprinters ou para uma fuga mais arrojada. Mas a primeira semana deste Giro de 2023 trouxe-nos não só terreno acidentado como chuva sem parar. E, com a estrada molhada, o caos espreita, sorrindo com a hipótese de ser protagonista.
Ainda na primeira fase da tirada, a 151 quilómetros da meta, Remco Evenepoel, campeão mundial e um dos favoritos à vitória, teve um primeiro encontro imediato com o asfalto, culpa de um pequeno cão que, certamente pouco satisfeito com a passagem de dezenas de ciclistas a alta velocidade, resolveu manifestar-se ladrando ao pelotão. Um dos ciclistas da Soudal-Quick Step assustou-se e caiu. A partir daí formou-se um efeito dominó entre a equipa de Evenepoel, que também iria ao chão.
Avisado o pelotão dos perigos da junção de animais na estrada e da água que não parava de cair do céu, a etapa seguiu tranquila, com a fuga do dia controlada pelas equipas dos sprinters. E foi com o fim da escapada, já nos derradeiros quilómetros da etapa, que o caos regressou. A sete mil metros da meta, uma queda no início do pelotão provocou um corte que deixou gente como João Almeida ou Primoz Roglic para trás - o esloveno da Jumbo-Visma foi mesmo ao chão. Ambos conseguiriam voltar ao grupo principal.
Remco Evenepoel é que se colocou novamente em sarilhos: numa clara desatenção, voltou a cair, provocando mais uma queda no pelotão. Por ter acontecido já dentro dos últimos três quilómetros, não teria consequências para a classificação geral, contudo, deixou o grupo principal ainda mais reduzido. E aí, na meta, superiorizou-se no sprint o australiano Kaden Groves (Alpecin), não sem mais confusão à chegada, com Mark Cavendish (Astana) a chocar com Filippo Fiorelli (Green Project-Bardiani CSF), levando o italiano às baias laterais, para azar de uns quantos telemóveis de quem por ali assistia ao final, que por ora serão apenas metal e fibra retorcida, destruídos no chão.
“Em duas horas de corrida, perdi quatro anos de vida”, diria João Almeida no final da tirada, em declarações à UAE Emirates, o que retrata bem a confusão e desordem que foi esta etapa 5 do Giro, que deixou seguramente mazelas em muito boa gente, embora sem feridas para os favoritos em termos de classificação geral.
A etapa de quinta-feira, 162 quilómetros com início e final em Nápoles, por estes dias o santuário do desporto em Itália, volta a ter um perfil pouco duro, mas depois desta quarta-feira já se percebeu que mesmo sem montanha não faltam dias de cão neste Giro.