Nasceu em Ermesinde, certo? Fale-nos um pouco do sítio onde cresceu e da sua família.
Nasci no hospital de São João, no Porto, Paranhos. A minha infância, até aos 10, 11 anos, foi vivida no bairro das Saibreiras, em Ermesinde. Tenho dois irmãos e uma irmã, todos mais velhos. A minha mãe foi sempre doméstica e o meu pai trabalhou na construção civil.
Era um puto reguila?
Muito reguila, mais do que devia [risos].
O que é que isso quer dizer?
Fazia muita coisa que não devia. O meu pai nunca trabalhou perto de casa, andava sempre em Espanha, ia para França, voltava passados 15 dias, então nunca esteve muito presente. Na escola, faltava às aulas para ir jogar futebol.
Imagino que não gostasse nada da escola.
Gostava da escola porque era o único sítio onde estava tranquilo com os amigos a jogar futebol, sem ninguém nos chatear. E gostava muito do meu sábado. Quando era miúdo, tínhamos jogo no Porto ao sábado de manhã e eu gostava muito do sábado porque ia jogar de manhã e à tarde chegava ao bairro e toda a gente do bairro estava no ringue e ficávamos ali a jogar até se fazer noite.
Quando é que começa a jogar no FC Porto?
Fui para o Porto com sete anos e meio. Comecei a jogar nas escolinhas do FC Porto com oito anos.
Como é que vai lá parar?
Jogava no bairro com o meu irmão e com amigos mais velhos do que eu, até que um dia as pessoas lá do bairro convidaram-nos para ir jogar ao Salgueiros. Naquela altura o Salgueiros tinha um treinador, o Silvino, que era adjunto do José Mourinho. Ele viu-me a jogar e convidou-me para ir para o Salgueiros, mas eu nunca quis ir porque na minha casa só se falava no FC Porto. Até que um dia o meu pai viu no jornal que o FC Porto estava a fazer captações a partir dos oito anos, na Constituição, e levou-me lá. Em 100 miúdos fiquei eu e mais dois jogadores.
Sempre torceu pelo FC Porto?
Sim, sempre foi pelo FC Porto.
Quem eram os seus ídolos?
Quando era pequenito não pensava assim muito em ídolos. Eu tenho um ídolo de sempre que é o Riquelme, um argentino que jogou no Barcelona, no Villarreal e no Boca Juniors, para mim esse sempre foi o meu maior ídolo.
O que mais gostava nele?
A maneira de jogar, de estar em campo, a minha posição em campo é parecida com a dele; eu quando era miúdo nem jogava a médio, jogava a extremo esquerdo, depois é que comecei a vir para médio e acabei a número 10. Para mim, ele foi o melhor número 10 da história do futebol.
O que é que dizia que queria ser quando crescesse?
Ainda hoje digo que se eu não fosse futebolista não sei mesmo o que teria sido, mas dizia quando era pequenino que queria ser bombeiro [risos].
Algum dos seus irmãos jogou futebol?
Não, nenhum.
Quando foi às captações e ficou no FC Porto, foi logo viver para o Porto?
Não, até aos 11, 12 anos eu ia sozinho de autocarro de Ermesinde para o Porto. Ninguém me levou. Ainda me lembro que o treino acabava muito tarde, já mesmo de noite, e eu pegava num saco maior do que eu e vinha de autocarro para casa.
Vai viver para o lar do FC Porto quando e porquê?
Aos 13, 14 anos, porque fui expulso da escola em Ermesinde.
Foi expulso porquê?
Porque andava com uns amigos do bairro, éramos assim um bocadinho problemáticos e depois o FC Porto tomou essa decisão para me ajudar.
Custou-lhe sair da casa dos pais e ir viver para o lar?
Não, nunca me custou. Eu nunca tive uma ligação muito... Ou melhor, eu tinha uma ligação com o meu pai um bocadinho distante. Quando eu era miúdo, todos os pais dos outros miúdos iam ver os treinos, iam ver os jogos, enquanto comigo isso não foi possível; sempre soube viver um bocadinho bem com isso, até porque eu não tenho relação nenhuma com a minha família no momento. A única pessoa com quem eu falava era mesmo só com o meu pai, mas como ele faleceu há dois anos, então nunca mais. Acho que já há 10, 12 anos que eu não tenho relação com a minha família.
Nem com os seus irmãos?
Não, com ninguém. Muitos atritos, e eu depois também fui crescendo, fui tomando as minhas opções e pronto, foi isso.
Não lhe custou ir para o lar do FC Porto, mas era um mundo diferente. Quando lá chegou, como é que foi o impacto?
Já estava habituado ao lar porque antes do treino eu saía da escola e ia lá sempre lanchar. Quando fui viver para lá, ao início fiquei sozinho num quarto e depois fiquei com o Ruca, que agora é guarda-redes.
Foram muito rígidos consigo no FC Porto?
Foram, foram muito mais rígidos, já não faltava às aulas, apesar de não ligar muito, não queria saber muito das aulas. Mas eu não podia faltar à escola, porque eles controlavam, eles tinham pessoas só mesmo dirigidas para isso, para controlar esse aspeto.
Não tentava arranjar esquemas para furar, para faltar às aulas?
Não porque havia castigos. Podíamos ser expulsos da casa-lar do FC Porto, podíamos ficar sem treinar. Era a pior coisa que podiam fazer aos miúdos, ficar sem treinar, ou ser expulso dali.
Aconteceu-lhe alguma vez ficar sem treinar?
Aconteceu, mas não foi por causa da escola, foi por outros problemas que tive no clube porque... Porque eu cresci, não foi sozinho, mas aprendendo as coisas sozinho, porque não tive a balança familiar ao meu lado e então aprendi as coisas que aprendi até agora, assim dizendo, sempre sozinho.
Era um jovem revoltado?
Sim, se calhar. Se calhar era uma capa para me poder defender e às vezes, agora olhando para trás, era muito rude com as pessoas, quando as pessoas me queriam bem. Pensava que o mundo estava contra mim, quando não era isso, quando as pessoas do FC Porto e de outros lugares só me queriam era ajudar. Hoje percebo isso, mas na altura...
Quando começam os primeiros namoros, as primeiras saídas à noite?
As primeiras saídas à noite foram com 16, 17 anos, com alguns amigos que agora já não tenho contacto com eles.
Alguma vez teve alguma chatice por causa dessas saídas?
Com o clube não, com o clube nunca tive, mas obviamente eu não controlava quem estava comigo e houve várias vezes em que os meus amigos tiveram problemas e eu, como estava lá no meio, também tinha. Mas nunca tive um problema de maior, de agressões ou assim, nunca se passou nada assim tão grave.
Entretanto vai para o Padroense, que no fundo era uma espécie de equipa satélite do FC Porto, não era?
Era. Foi no meu primeiro ano de juvenil, porque o FC Porto nesse ano só tinha uma equipa de juvenis, então normalmente quem passava dos iniciados para os juvenis ia para o Padroense e no ano a seguir é que voltava ao FC Porto.
O mesmo nos juniores, com a ida para o Candal?
Aí foi mais um castigo do Luís Castro porque eu não dava valor ao que tinha. Agora dou valor às pequenas coisas. Um jogador do FC Porto tem tudo, não lhe falta nada, temos todas as condições para singrar e só damos conta, ou só damos valor, quando vamos para um clube de menor dimensão como foi o Candal, onde faltam muitas coisas. Foi mais um castigo da parte deles para eu aprender e para perceber que no FC Porto tinha tudo, e tinha que dar mais valor ao lugar onde estava.
No meio disso tudo, quando é que deixa a escola?
Eu concluí o 12.º ano, através de um curso profissional, eu e vários jogadores, também estava o Nuno Espírito Santo, guarda-redes. Fazíamos um curso profissional no Dragão para concluir o 12.º ano.

Josué fez a formação no FC Porto, mas só em 2013/14 é que se afirmou no plantel principal
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Quando assina o primeiro contrato com o FC Porto?
Nos juniores. Eu fui para o Candal, estava tudo a correr muito bem, tínhamos uma equipa muito forte no Candal porque eram muitos jogadores que tinham vindo do FC Porto e nos primeiros seis meses estávamos a dar luta aos juniores do FC Porto. Até apareceu um agente que me queria levar para o Benfica. Fomos jogar ao Vianense e houve um agente que me queria levar para o Benfica, que tinha tudo acordado com o Benfica para eu ir para lá jogar.
Queria ter ido?
Nessa altura como eu estava chateado com o FC Porto, não era bem querer ir, mas foi bom ver que as pessoas do FC Porto souberam disso e foram lá buscar-me a Viana do Castelo. Acabei por vir com as pessoas do FC Porto e voltei ao Porto. É aí que assino o primeiro contrato profissional.
Mas antes desse contrato profissional, já recebia algum dinheiro do FC Porto?
Sim, pelo contrato de formação. Começo a ganhar dinheiro com 15, 16 anos, na altura dos juvenis.
Lembra-se do valor do seu primeiro ordenado?
Não. A única coisa que me lembro é que no dia em que assinei contrato profissional, como não tinha empresário, não tinha nada, quem fez de meu advogado, de meu empresário, foi o Vítor Baía, era ele que lá estava. Eu nessa altura não prestava atenção a nada.
Não se lembra de nada que quisesse muito comprar com o seu primeiro dinheiro?
Acho que foi um telemóvel. Um telemóvel com câmara para tirar fotografias. Tenho quase a certeza que foi isso.
É chamado à equipa principal pela primeira vez quando e por quem?
Ora bem, fui chamado pelo Jesualdo Ferreira, o meu primeiro jogo pela equipa principal foi na Taça da Liga, contra o Vitória de Setúbal, no Dragão.
Estava muito nervoso?
Não, estava ansioso para poder jogar no clube do coração, era a primeira vez, o ir para o estádio, o estar no banco, estar com os jogadores da equipa principal, não estava nervoso, mas estava ansioso por poder jogar.
Quando entrou pela primeira vez no balneário sénior do Porto, como é que foi a receção?
A receção foi sempre incrível, foi muito boa. Nessa altura o FC Porto tinha como capitão o Pedro Emanuel. Quando eu ia treinar à equipa principal, o Tomás Costa, o argentino que estava no FC Porto, era quem me ia buscar à casa do Dragão, íamos juntos. Eu tinha muito boa relação com eles, com o Tomás Costa, o Guarín, o Stepanov.
Não foi praxado?
Não, nessa altura não faziam essas praxes. O que faziam era, por exemplo, ter de pegar as chuteiras de algum jogador, e pegava ponto final, nem havia o "se". O "se" não existia naquele balneário. Mas a coisa que mais recordo de quando me chamaram à equipa principal era que, à hora de começar o treino, quando viam o Pedro Emanuel a acabar de apertar as chuteiras, toda a gente se levantava e saía do balneário.
Como é que foi o impacto com o Jesualdo?
O Jesualdo é um professor, como toda a gente diz, e é mesmo, é verdade, ele gosta muito de ensinar os jovens. Tinha muita paciência para os jovens, e não era fácil. Há 12 anos não era qualquer treinador que tinha essa paciência toda com os jovens, mas o Jesualdo sempre teve, e tenho muito boas recordações.
Tinha 18 anos quando é chamado por Jesualdo Ferreira, mas faz poucos jogos na equipa principal do Porto nessa época 2008/09.
Certo.
O que mais o marcou nessa sua primeira época como sénior no FC Porto?
Foi poder treinar ao lado do Hulk, que era um fenómeno, do Bruno Alves, que gostava de ensinar os jovens. Nós nos juniores estávamos a treinar no sintético e eles estavam a treinar na relva e sempre que ouvíamos a voz do Bruno Alves era como se ouvíssemos a voz do deus que estava ali dentro. Agora, não tenho assim um momento marcante. O mais marcante foi mesmo quando me estreei pela primeira equipa do FC Porto.
Continuava a viver no lar do FC Porto?
Não, aí tínhamos uma casa que era para os mais velhos, que era ao lado do lar, era uma casa só para os juniores. Porque eu treinava muitas vezes com os seniores mas jogava muitos jogos da intercalar, depois ao sábado jogava sempre pelos juniores.
Entretanto, é emprestado ao Sporting da Covilhã. Reagiu mal ou percebeu que tinha de rodar?
Não, nessa altura não havia equipas B, por isso eu sabia que dificilmente quem saía dos juniores ficava na equipa principal. Sabia que me ia tocar a mim ir para uma equipa profissional para poder jogar e um dia poder regressar ao Porto.
Foi viver sozinho para a Covilhã?
Sim. Tinha o Steven Vitória, que agora é o capitão do Moreirense, que vivia no mesmo condomínio do que eu, então estávamos sempre juntos e ele ajudava-me imenso porque eu nem um ovo sabia fazer [risos]. O clube também tinha algumas relações com alguns restaurantes, então os jogadores iam lá almoçar e jantar.
No SC Covilhã tem quantos treinadores?
Eu apanhei dois, e depois da saída do João Eusébio vem um treinador que eu nem gosto de dizer o nome dele.
O João Salcedas. Porquê?
Porque tive problemas com ele. Mas o que ele falou nos meios de comunicação social, não foi assim que se passou, os jogadores que estavam lá nessa altura sabiam o que se passou e ele foi falar outras coisas.
Mas o que aconteceu?
Ele disse que foi por causa do mau comportamento, e não foi. Óbvio que eu já tinha um rótulo, vinha da formação do FC Porto com o rótulo de ser mau comportado, de ser mal educado e então isso para ele foi uma ajuda naquele momento, mas... Eu nem gosto muito de falar na minha passagem no Covilhã porque quando me perguntam se joguei no Covilhã, eu digo que estive só lá de férias e nem falo muito do clube, porque até com o presidente... Não tivemos muito boa relação.
No que é que ele pegou? Pegou em algum episódio, em alguma coisa em concreto?
Pegou em várias coisas. Ele era diretor, quando o João Eusébio era o treinador, eu fui para lá também por causa do João Eusébio, que falava muito comigo, e depois do João Eusébio sair, eu também chutei um bocadinho o balde, dei azo a quem me fizessem isso. Depois acabou o meu período de empréstimo, voltei ao FC Porto e depois fui emprestado ao Penafiel, onde fiz seis meses muito bons, num clube espetacular, acolheram-me muito bem e adorei estar no Penafiel.
No SC Covilhã encontra o Pizzi. Passava-lhe pela cabeça que o Pizzi pudesse chegar aonde chegou?
Passava, o Pizzi sempre foi muito bom jogador. Nesse ano tínhamos uma equipa muito boa, se não acontecesse o que aconteceu se calhar eu também poderia ter ido para a I Liga, ter dado o salto na mesma altura que o Pizzi. Ele nessa altura deu o salto para o Paços de Ferreira e eu só passado dois anos é que consegui dar o salto para a I Liga.

Josué conquistou a Taça de Portugal ao serviço do SC Braga, em 2015/6
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Depois do Penafiel como é que surge a Holanda?
O FC Porto na altura tinha, como acontecia com o Padroense e com o Candal por exemplo, o um protocolo também com o VVV-Venlo, onde tinha estado o Diogo Viana um ano antes. Naquele ano, como estavam à procura de um jogador na minha posição, fui eu e o Jorge Chula. Estivemos lá com o Diogo Viana.
Como foi o primeiro impacto quando chegou à Holanda? Sonhava em ir para fora ou ainda não lhe passava essa ideia pela cabeça?
Não me passava pela cabeça. Fui também para as pessoas verem que eu tinha valor e para tentar limpar um bocadinho a imagem, ou o rótulo que me tinham colocado. Fiquei lá a viver com o Chula, era ele que cozinhava e eu lavava a loiça que não sabia cozinhar [risos]. Mas hoje já sei cozinhar.
Era um mundo completamente diferente, como é que lidou com uma cultura e língua diferentes?
Eu não sabia falar inglês, tudo o que eu fazia o Chula tinha que estar presente porque eu não falava nada, nem uma palavra em inglês. O Chula já falava e era ele que me ajudava em tudo. Foi um mundo completamente diferente.
E o futebol, também muito diferente daquilo a que estava habituado?
Sim. Toda a gente atacava, não queriam muito saber de defender. Era um jogo mais partido, havia muitos golos, muito espaço para jogar.
Gostou de lá estar?
Gostei, foi um país diferente. Estava habituado a estar na zona de conforto em Portugal, então foi tudo diferente e gostei. Se fosse agora em que sou muito mais maduro é obvio que era totalmente diferente. Lá a partir de fevereiro, mudaram de treinador e deixei de ter mais tempo de jogo. Eu e outros fomos para lá com o Jan van Dijk.
Foi na altura em que estava na Holanda que conheceu a sua mulher?
Eu estava a jogar na Holanda, mas foi numa vinda à seleção de sub-21 que conheci a minha esposa, a Joana Fonseca, através de amigos em comum. Ela na altura trabalhava numa discoteca à noite e estudava na faculdade.
Em que curso?
Não sei, não me lembro. Mas conhecia-a nessa altura e depois nem acabei a época na Holanda. Pedi para vir dois meses antes de terminar a época. Como já não estava a jogar muito pedi para voltar para Portugal.
Por causa dela?
Sim, porque começámos a conhecer-nos, começámos a falar. Também já não estava lá bem, não estava a jogar e acho que um miúdo, eu tinha 18, 19 anos, quando não está a fazer aquilo que gosta noutro país, sem falar a língua, é difícil.
Veio para o Paços de Ferreira. Tinha empresário?
Já nem me lembro. Mas fui para o Paços à minha conta e do Carlos Carneiro. Quando estive no FC Porto ganhei a liga intercalar ao Paços de Ferreira e o Carlos Carneiro já me queria levar nessa altura.
Quando chegou ao Paços Ferreira o treinador era Rui Vitória. Que tal?
Fui viver para Paços de Ferreira já com a Joana, estávamos perto do Porto. Em relação ao Rui Vitória, profissionalmente não gostava porque não jogava, mas pessoalmente ele dizia-me uma coisa que eu entendo agora. Eu não era muito intenso nos treinos, com a bola tinha qualidade, mas sem a bola não era nada intenso. E ele uma vez disse-me que se eu quisesse jogar na equipa dele tinha que aumentar dois carretos, como na bicicleta, um não chegava. Passado um tempo ele foi para o V. Guimarães e veio o Luis Miguel, o adjunto neste momento do Vítor Pereira.
Jogou mais?
Sim, joguei muitos jogos, mas os resultados não estavam a sair e veio o Henrique Calisto e aí foi mau de mais até acabar a época.
Porquê?
Não era aquilo que estava à espera, não era o que estava habituado em termos de treino. Cada um tem o seu método, mas não era nada do que estava à espera. Também não o fazia para agradar a ninguém, fazia o que queria, por mim. Até que no ano seguinte veio o Paulo Fonseca e é engraçado que com o Paulo Fonseca no início não jogava. E tenho uma história com ele.
Conte.
Com o Paulo Fonseca todas as semanas tínhamos que nos pesar duas vezes. Eu estava acima do peso. E houve um jogo que se não estou em erro foi com o V. Guimarães, em Paços, o Luiz Carlos estava suspenso e o Paulo Fonseca veio falar comigo e disse-me que eu tinha de baixar o peso para jogar. Só que eu achava que não [risos]. E dizia-lhe: "Não, não vou baixar, eu estou bem. Eu é que sei como é que estou". E não queria baixar o peso. Até que ele começou a pôr multas de excesso de peso [risos]. E na altura disse-me que eu tinha de pagar as multas. Eu não queria pagar, queria ir contra as regras da equipa, até que um dia, acabamos o treino e ele vira-se para mim: "Tu agora vais correr". E eu: "Ok, se vou correr, vou correr". Comecei a correr à volta do campo, até que lhe disse: "Estou cansado, já não aguento mais. Estou morto. Quero parar". E ele: "Se tu estás aqui é porque acredito em ti. Se tu não acreditas em ti, eu não te vou deixar cair. Eu acredito em ti". A partir desse treino e desse jogo com o V. Guimarães, nunca mais saí da equipa, comecei a jogar sempre.
Perdeu peso?
Perdi [risos]. Depois entrei na linha, aliás, já me ia pesar e já ia com um pé atrás com medo de pesar mais do que devia. Foi o clique que ele me deu, porque antes desse mesmo treino, eu tinha subido ao escritório do Carlos Carneiro e tinha-lhe dito que queria ir embora do clube. "Eu não jogo aqui, quero ir embora para outro clube para jogar". E ele respondeu-me: "OK. queres ir embora, vai". Eu desci e fui treinar. Depois desse treino tudo mudou na minha vida. Houve um clique.
E regressa ao FC Porto.
O Paulo Fonseca já tinha contrato com a Proeleven do Carlos Gonçalves e foi através deles já que aconteceu o FC Porto.

Josué com a mulher
D.R.
Quando lhe deram a notícia ficou felicíssimo por poder regressar ao FC Porto, não?
Nessa altura eu tinha a hipótese de ir para o Sporting, as coisas estavam a ser feitas para ir para lá, porque o Sporting também me apresentou um projeto ambicioso, em que eu ia jogar. Só que o FC Porto tinha 50% dos direitos do meu passe e tudo se complicou. Na altura era o Augusto Inácio o diretor desportivo do Sporting, tudo se complicou e acabei por ir para o FC Porto.
Ficou desiludido de alguma forma por não ter ido para o Sporting?
Não, é óbvio que fiquei contente de ir para o FC Porto porque voltei ao clube do meu coração. Queria muito poder voltar e cumprir um sonho meu e do meu pai que era jogar no estádio do Dragão, como profissional, na primeira equipa do FC Porto, e não como júnior que de vez em quando é chamado.
A receção foi diferente quando regressou ao balneário do FC Porto?
Foi porque a minha postura também foi totalmente diferente, já tinha aprendido muitas coisas. Eu já conhecia a maioria dos jogadores que lá estavam.
O treinador era o Paulo Fonseca. Foi ele que o quis lá, certo?
Toda a gente me pergunta isso, mas pelo que sei e pelas conversas que tive com ele, eu assinei um mês e meio antes do Paulo Fonseca assinar, por isso, nem sonhava que ele ia para o FC Porto. Só se falou mais no fim do campeonato que ele poderia ir, mas eu aí já tinha tudo alinhado com o FC Porto.
Como correu essa época. Jogou o que achava que ia jogar?
Fiz 34 ou 35 jogos, e se não estou em erro cinco golos. Joguei muito, mas não foi um ano feliz para o clube. O único troféu que o clube venceu nesse ano foi a Supertaça ao V. Guimarães, no resto estivemos abaixo do nível em que o FC Porto tem de estar.
Depois de Paulo Fonseca veio Luís Castro, que já conhecia...
E com quem já tinha, não digo uma má relação mas já tinha tido alguns problemas. Porque quando eu estava na formação ele era diretor da formação do FC Porto e foi ele que me mandou para o Candal. Quando ele veio, para mim, foi um balde de água fria.
Viu a sua vida a andar para trás?
Vi não, a minha vida andou mesmo para trás. Fiz mais quatro ou cinco jogos. Na altura também estava na seleção, era o ano do Mundial no Brasil, eu era chamado regularmente quando estava com o Paulo Fonseca e depois sinto que isso afetou também muito a minha chamada à seleção.
Entretanto chega Lopetegui. As coisas não correram bem. O que aconteceu?
Fomos para a Holanda de estágio e o Lopetegui queria pôr-me numa posição diferente daquela onde eu jogava. Eu disse logo que não queria.
Queria pô-lo onde?
A número 6. Na altura começou a jogar o Rúben Neves nessa posição, foi quando ele apareceu.
Não queria jogar a 6 porquê?
Porque nunca tinha jogado naquela posição e não é qualquer jogador que se adapta a essa posição. Disse que não queria, que preferia ser emprestado do que mudar de posição e foi o que aconteceu.
Foi emprestado ao Bursaspor, da Turquia. Como e porquê a Turquia?
Foi tudo através dos meus empresários, que chegaram com a proposta. Eu nunca na vida tinha ouvido falar da Turquia. Nesse ano em que estive no FC Porto, o Castro tinha ido para a Turquia para o Kasimpasa e eu decidi arriscar também. E foi um dos meus melhores anos a nível futebolístico.
Gostou do que viu quando chegou à Turquia?
Cheguei a Bursa e foi só mesmo assinar porque a equipa estava em estágio na Eslovénia. Fui ter com a equipa. O impacto foi grande porque eu tinha vindo do FC Porto e as pessoas estavam à espera muito de mim e eu não tinha noção do que eu ia encontrar. O poder estar com o Fernando Belluschi, que tinha jogado no FC Porto, com o Fernandão, o avançado brasileiro, e com outro argentino Renato Civelli, como defesa, ajudaram-me imenso a integrar na equipa e no clube e depois na cidade também. A minha mulher e a minha filha foram ter comigo depois.
Quando nasceu a sua filha?
A Mariana nasceu no ano em que estive com o Paulo Fonseca, em Paços de Ferreira. No início do ano. Assisti ao parto. Mas o mais engraçado é que sempre disse que nunca um filho meu ia nascer em Lisboa e a minha filha acabou por nascer em Lisboa [risos]. Saiu-me tudo ao contrário. Eu que dizia que Lisboa nem pensar, nunca lá viveria. Afinal, a minha esposa, conhecia-a em Lisboa, a minha filha nasceu em Lisboa e elas agora estão a viver em Lisboa e eu estou sozinho em Israel, por causa da escola da minha filha.
A sua mulher e filha adaptaram-se bem à Turquia quando foram ter consigo a Bursa?
A minha esposa adaptou-se muito bem. Aliás, ela ama a Turquia, se há país onde ela voltava a viver era Turquia e já ontem, não era hoje, nem amanhã. Ela gostou muito das pessoas e da cultura de lá. Eu também, passei muito bem todo o tempo que lá estive. Foram muitos anos na Turquia, já sabia falar algumas coisas, estava completamente adaptado.
Qual foi o costume turco a que mais lhe custou adaptar e, pelo contrário, aquele que se tornou um hábito seu e da sua família?
O que eu mais gostei foi o hábito de beber chá. Eles estão sempre a beber chá e foi lá que aprendi a gostar de chá. Hoje bebo muito chá. O mais difícil é a comida, porque eu sou muito esquisito com a comida. Tanto lá como aqui em Israel não me aventuro em comidas típicas. Na Turquia por acaso há bom frango, o peixe também é bom. Em Israel, já nem posso ver frango à minha frente.
A época corre-lhe bem. Faz 39 jogos...
Nove golos, nove assistências, foi uma época incrível. O clube comprou 30% do meu passe. Mas da equipa titular do meu primeiro ano, só fiquei eu e mais outro jogador. A equipa desmoronou e não é fácil fazer outra equipa com jogadores novos e ter o mesmo sucesso. Foi totalmente diferente e a época não estava a correr como eu esperava. Houve muitas mudanças, o presidente também acabou por sair e eu acabei por ir para o SC Braga.
Como era o seu dia na Turquia. Ia treinar e depois do treino o que fazia?
Nada de especial. Vivia num condomínio grande que tinha shopping e ia passear com a minha esposa e a minha filha ao shopping; também brincava no parque com a minha filha; íamos muitas vezes a Istambul de carro passear. Era tranquilo.

Josué jogou no Galatasaray em 2016/17
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Quando regressa a Portugal é o Paulo Fonseca que o chama para o SC Braga?
Foi curioso. Eu estava em Portugal na paragem de inverno da Turquia, estava a jantar com a minha esposa e a ver o SC Braga-Belenenses. Nesse dia estava frio, chuva, se estivessem 100 pessoas no estádio era muita gente. Eu estava a olhar para a televisão e virei-me para a minha esposa e disse-lhe: "E se eu um dia viesse para o SC Braga jogar? Acho que vou falar com Paulo Fonseca. Vou jogar no SC Braga". E ela: "Vais jogar no SC Braga? Mas financeiramente o SC Braga não te vai poder pagar o que recebes"; "Está bem. Não faz mal, mas eu vou jogar para o SC Braga". Não falei com o Paulo Fonseca, mas com o adjunto Nuno Campos, e eles pensaram que eu estava a brincar. "Estás a gozar, não brinques com isto"; "Não, não estou a gozar, estou a falar a sério, quero ir jogar para o SC Braga. O que é que acham?". Através do presidente, do Paulo Fonseca e do meu empresário arranjámos a solução para jogar no SC Braga.
Porque é que queria tanto jogar no SC Braga?
Por causa do Paulo Fonseca. O SC Braga era um clube que estava a crescer imenso, uma equipa forte, jovem, já tinha jogado com muitos deles também. Tinham o Wilson, Rui Fonte, o Rafa que estava a aparecer, o Pedro Santos, muitos jogadores que eu conhecia, e o mais importante foi o Paulo Fonseca estar lá e eu saber que ao trabalhar com ele poderia jogar e ir para outros patamares.
Jogou e ganhou a Taça de Portugal. O que sentiu ao ganhar a Taça ao FC Porto?
Foi um misto. Eu não sabia que podia jogar a final da Taça. Óbvio que dentro do balneário perguntaram-me se eu queria jogar e eu disse que sim, porque naquele momento eu estava a defender as cores do SC Braga, naturalmente não ia deixar os meus colegas na mão, porque era um jogador importante para a equipa. Mas foi difícil. Foram dois dias de estágio, muitos pensamentos, muitas conversas com a minha esposa sobre o que ia acontecer ou não. E depois aconteceu o inevitável, que foi fazer o golo ao FC Porto.
Que não festejou.
Foi difícil. Muitos adeptos do FC Porto criticaram, outros perceberam. Mas não festejei o golo por respeito ao clube que me formou, com o qual ainda tinha contrato.
Não conseguiu saborear o título?
Fiquei contente por ter conquistado a Taça de Portugal porque é um título muito bonito, é um dia espectacular em que as famílias começam a juntar-se logo cedo, para comer e beber, à volta do estádio, é um dia que todos sabem que é diferente. E teve um sabor especial.
Mas não fica em Braga. Volta à Turquia, agora ao Galatasaray. Porquê?
Começo a época no FC Porto com o Nuno Espírito Santo. O SC Braga queria comprar-me, estavam em conversações com o FC Porto. Só que apareceu o Galatasaray e eu queria voltar à Turquia e a um clube grande como é o Galatasaray, com milhões de adeptos. Um clube incrível, uma cidade incrível e jogar com jogadores incríveis, foi uma grande aprendizagem e um grande ano para mim. Na minha posição tinha o Wesley Sneijder, que é um fenómeno no futebol mundial, mas joguei mais do que aquilo que esperava tendo em conta que tinha um jogador como ele na minha posição. Correu-me bem.
Porque não fica?
Porque os clubes não chegaram a um acordo. O Galatasaray economicamente também estava a passar uma má fase e não chegaram a acordo para me poderem comprar. Voltei ao FC Porto, já era Sérgio Conceição o treinador. Mas comecei a fazer a pré-época na equipa B. Depois apareceu o Osmanlispor.
Sabia que ia sair? O Sérgio Conceição disse-lhe que não contava consigo?
Não. Eu sabia que não contava para o clube. Nunca falei com o Sérgio Conceição, mas sabia que não contava para o clube. Ao começar a pré-época logo na equipa B, ninguém precisava de me dizer que eu ia sair, dava para ver o que ia acontecer.

Josué com a filha Mariana
D.R.
Volta à Turquia, desta vez a Ankara. Dos locais onde viveu na Turquia, de qual gostou mais?
De Bursa. Ankara é uma cidade muito grande, é a capital, gostei de lá viver, conheci lá um amigo para a vida, o Tiago Pinto, a esposa e os filhos. Ajudaram-me muito, estávamos todos os dias juntos em minha casa ou na dele. Vivíamos no mesmo prédio. A minha filha também começou a ir para a mesma escola onde os filhos dele andavam. Então criámos uma relação de amizade muito forte.
Mas não fica muito tempo no clube. Rescinde unilateralmente. Porquê?
Em dezembro rescindi porque a minha esposa também teve problemas de saúde. Teve cancro no útero. O clube também tinha salários em atraso. Fomos para um jogo, eu não ia jogar, estava no banco, e ela ligou-me antes do jogo a dizer-me o problema que tinha. Eu fui à beira do diretor desportivo, disse que não queria jogar, mas não lhe expliquei o motivo. Não queria explicar, não queria falar com ninguém. Disse-lhe só que não queria jogar. Como ele pensava que eu estava chateado ou que queria arranjar problemas por ter ido para o banco, entendeu que no dia a seguir tinha que me suspender das atividades do clube e pronto. Depois fomos para a FIFA e no fim ganhei o caso e pagaram-me. Não era pelo dinheiro mas mais pelo respeito que deviam ter tido e não tiveram. Mas já passou.
A sua mulher entretanto já recuperou e está bem?
Sim. É claro que sabemos que de um momento para o outro pode reaparecer. Ela agora está numa fase outra vez um bocadinho em baixo, mas vai ficar tudo bem. Temos de ir vigiando.
Veio embora da Turquia e o que aconteceu depois?
Estive seis meses sem jogar, de janeiro até maio/junho. Disse que não queria jogar. Não estava bem da cabeça, psicologicamente; também tive alguns problemas no Osmanlispor, mas continuei em Ankara porque a minha filha andava lá na escola. A minha esposa começou a ser tratada lá, só depois é que veio para Portugal. Em fevereiro estou na Internet e vejo que o Evra, que jogou no Manchester United, tinha sido despedido do Marselha e tinha ido para o Dubai treinar com uns preparadores físicos. Comecei a pesquisar na internet o sítio para onde ele foi e disse para a minha esposa: "Encontrei um sítio bom, vamos os três para o Dubai, ficamos lá até maio, eu vou treinar". Alugámos um aparthotel e ficámos lá os três. Eu ia treinar de manhã e à tarde ficávamos os três no hotel. Isto enquanto ela estava a recuperar também.

Josué vestiu pela primeira vez a camisola do Hapoel Beer Sheva, de Israel, em 2019/20
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Como surge o Akhisar?
Também através dos empresários. Encontro-me lá com o Miguel Lopes e com o Hélder Barbosa. Correu bem até uma certa altura. Porque na Turquia os clubes falham muito com os salários, os clubes não são muito profissionais. Jogámos a Liga Europa, ganhámos a Supertaça ao Galatasaray, foi um ano bom, mas depois em abril também rescindi com o clube.
Porquê?
Eu já estava um bocadinho cansado de estar na Turquia. Estive na Turquia quatro anos e meio e todos os anos tive problemas com os salários. Também mudámos de treinador no Akhisar, só começaram a jogar os turcos e chegou a um ponto em que me cansei. E quando me canso prefiro sair e não ter mais problemas. Perdi dinheiro, obviamente, deixei lá três meses de salário, mas saí livre.
E vai para Israel. Uma realidade completamente diferente?
Sim. A única coisa que tinha ouvido falar de Israel era de bombas a cair aqui e ali. Vinha um bocadinho de pé atrás, mas quando cheguei aqui vi que era uma realidade completamente diferente, não é nada do que as pessoas pensam ou falam. É um país incrível, com uma segurança incrível, com um tempo incrível. Gosto muito de estar aqui, só que o país para viver é muito, muito caro.
E das pessoas, gosta?
Sim. São diferentes. Eles à sexta-feira juntam-se todos para o Shabat e os mais religiosos não mexem em nenhum aparelho de eletricidade, nem telefone, nem televisão, não mexem em nada. Têm uns costumes estranhos para quem chega aqui pela primeira vez, mas a que nos acostumamos. Mas são completamente diferentes dos turcos. Foi bom conhecer a cultura muçulmana e agora estar a conhecer a cultura dos judeus. O futebol é muito diferente de Portugal. Do da Turquia nem tanto, mas de Portugal é muito diferente.
Como assim?
Aqui o jogo é um bocadinho mais tático do que na Turquia, mas muito partido. Chega a um determinado ponto em que o jogo está completamente partido, as equipas já não estão disciplinadas taticamente e é uma vantagem para mim porque o espaço que há para jogar é muito grande.
Entretanto acabou por se tornar uma espécie de herói do Hapoel Be'er Sheva, porque fez o golo que deu a Taça de Israel ao clube.
O clube há 30 anos que não ganhava uma Taça de Israel. E na final eu fiz um golo, uma assistência e vencemos. Foi incrível. Foi uma época boa.
Quando jogou essa final já tinha assinado para esta nova época?
Já.
Era o que queria, continuar aí, ou procurou ir para outro lado?
Não, não tentei. Aliás, passado um mês da pandemia começar assinei mais um ano com o Hapoel.
Mas teve de reduzir o salário, certo?
Sim, reduzimos todos o salário 30%. O meu contrato nessa altura acabava passado três meses e a dona do clube queria que os jogadores cortassem 30% para 15 meses, mas para mim não era possível por ir acabar o contrato, então quando assinei por mais um ano cortei 50% do salário.
50% é uma grande diferença na sua vida ou não?
É muita diferença, ainda para mais neste país, onde ir ao supermercado é tudo três, quatro vezes mais caro do que em Portugal ou na Turquia. Mas eu queria ficar cá mais um ano, tinha-me corrido bem a época.

Josué tem-se afirmado em Israel, no Hapoel Beer Sheva
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A sua mulher e filhas entretanto já não foram consigo para Israel?
Não. Vim para cá com contrato de um ano. E como a minha filha começava a escola, decidimos que o melhor para ela era ficar em Portugal e vinham cá mês a mês. Só que meteu-se a pandemia pelo meio e estive quatro, cinco meses sem poder estar com elas. Só em julho do ano passado é que consegui ir para Portugal e tive de voltar em agosto.
O que fazia no tempo da quarentena em que não havia jogos e estava aí sem família?
Treinar, treinar e muita Playstation com o André Martins, o Rafael Lopes, o Luís Rocha, João Pereira. Eram muitas horas a jogar “Call of Duty” com eles.
E agora quais são os seus objetivos?
Eu aprendi que colocar objetivos grandes ou pensar muito alto, pode não acontecer, por isso vivo o momento. Neste momento estou bem aqui no clube. As pessoas tratam-me bem. Tenho contrato até final da época. Não sei o que vai acontecer depois. Gosto de estar aqui, sinto-me importante tanto no clube como na equipa. Vamos ver. Também tenho de falar com a minha esposa e a minha filha, porque já estou há muito tempo sem estar com elas.
Já pensou no que vai fazer depois de pendurar as chuteiras?
Às vezes, quando estou um pouco mais sozinho, ou mais em baixo, penso que já faltou mais e então penso no que poderei fazer. Agora não tenho noção nenhuma do que poderá acontecer, mas gostava de ser treinador.
Tem algum nível do curso feito?
Não. Digo que gostava, mas o gostar não quer dizer que vá acontecer. Se calhar daqui a um ano ou meio ano vou querer fazer outra coisa, mas por agora gostava de ser treinador. Se vai acontecer ou não, não sei.
Onde ganhou mais dinheiro?
Bursaspor.
Investiu em quê?
Em imobiliário, em Portugal.
Tem mais algum passatempo além da Playstation?
Não.
É um homem de fé?
Por vezes. Às vezes acontecem coisas na vida, como foi a morte do meu pai e do meu sogro, que se fosse de acreditar muito... Deus nesses casos não me ajudou. As mortes deles foram muito dramáticas para mim, para a minha esposa e filha. Eu não tinha muita conexão com o meu pai mas mesmo assim foi muito mau, porque ele estava longe de mim e eu queria ajudá-lo. E o meu sogro foi em casa. Foram duas mortes repentinas.
E superstições, tem?
Beijar a tatuagem da minha esposa e filha que tenho no braço esquerdo.
Quando fez a primeira tatuagem? O que tatuou?
A primeira foi o nome do meu pai, tinha 19 anos.
De todas as que tem, qual a que tem significado mais especial?
Duas: a cara da minha esposa e os olhos da minha filha.
Qual foi a maior extravagância que fez?
Se calhar ter ido para o Dubai três meses e meio. Gastei lá muito dinheiro.
De todos os clubes, qual o clube de sonho onde gostava de ter jogado?
AC Milan. Jogou lá Kaka, Pirlo, Gattuso, Seedorf, Rui Costa, foi uma equipa que sempre me chamou a atenção.
Qual foi a maior alegria e a maior frustração na carreira?
A maior frustração se calhar foi não dar continuidade ao meu primeiro ano no FC Porto. A maior alegria foram os troféus que ganhei até hoje.
Calculo que diga que o melhor treinador que teve foi Paulo Fonseca, por isso pergunto-lhe qual o pior?
Henrique Calisto.
Qual o momento mais difícil da sua vida?
A morte do meu sogro. Não estava presente, estava na Turquia sozinho, a minha esposa e a minha filha estavam em Portugal e foi o momento mais difícil porque para a minha filha foi muito difícil e ela ainda hoje sofre com isso. É difícil explicar-lhe o que aconteceu.
E a maior amizade que fez no futebol?
Tenho algumas. Uma recente é a do Miguel Vítor, que é o meu braço direito, braço esquerdo, é o meu tudo aqui em Israel. Mas o meu grupo da Playstation é tudo para mim: André Martins, Rafael Lopes, Luís Rocha e João Pereira.
Qual foi o seu adversário mais difícil?
Filipe Melo, o brasileiro.
E qual aquele com quem se entendeu melhor a jogar?
O ano passado entendia-me muito bem com o David Simão. Entendi-me muito bem com o Sneijder, entendia-me como André Martins na seleção de sub-21. Com quem jogava melhor se calhar era com o Belluschi no Bursaspor.
É chamado pela primeira vez à seleção quando?
Sou chamado aos sub-17, mas só comecei a jogar na seleção nos sub-18. Fiz dos sub-18 aos sub-21 e fui chamado à seleção A também pelo Paulo Bento.
Fez quantos jogos?
Fiz quatro jogos na seleção A, num entrei ao intervalo, outro joguei todo, com o Luxemburgo, e depois entrei em mais dois jogos na 2ª parte, com a Suécia no playoff de apuramento no estádio da Luz e contra Israel, em Alvalade, um jogo treino.
Porque é que acha que não jogou mais na seleção?
Eu nunca fui aquela pessoa de pensar vou para ali para poder ir para a seleção. Não. Eu sempre tomei decisões por mim, nunca ninguém tomou nenhuma decisão por mim, sempre tomei as decisões juntamente com a minha esposa. Obviamente que se calhar podia não pensar tanto com o coração como pensei e pensar mais na parte profissional, mas sempre estive tranquilo. Foram quatro jogos, não interessa, o importante foi representar. Cumpri o sonho.
Qual é o seu maior arrependimento?
Se calhar o meu comportamento na formação.