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Duarte Gomes

Duarte Gomes

ex-árbitro de futebol

‘Chapeau’ a Taremi, que mostrou apoio público às iranianas num país que raramente esquece quem ousa expressar-se livremente

Além de exaltar que as pessoas têm “o direito de exigir que o desporto volte a ser a escola de virtudes que um dia foi” e que ninguém pode usar “a sua posição para coagir, assediar, incomodar, ofender ou diminuir”, Duarte Gomes elogia a postura adotada pelo avançado do FC Porto, na recente posição tomada por Taremi face aos protestos que decorrem no seu país

Duarte Gomes

Robbie Jay Barratt - AMA

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1. Vítor Serpa

É um dos últimos grandes nomes do jornalismo português. Vítor Serpa, ilustre diretor do jornal “A Bola”, decidiu despedir-se da função que ocupava há mais de trinta anos.
O Vítor, mais do que um profissional de competência inatacável, é um ser humano de excelência. Acreditem, sei bem do que falo. Uma pessoa educadíssima, culta e de fino trato, que devo confessar-vos, teve influência importante na minha opção de ingressar, como comentador de arbitragem, naquela instituição.
Sei que a etapa que o Vítor agora encerra iniciará outras onde toda a sua experiência, saber e sensatez continuarão a ser mais-valia. Ele é alguém que acrescenta valor só por estar presente, a falar ou ouvir. A propor ou inspirar.
Para ele um abraço do tamanho do seu caráter e um obrigado muito especial pela forma elevada como sempre respeitou, sem a mínima interferência, a independência das minhas análises.
Tal como todos os seus colegas, o Vítor soube desde o início que isso era (como é e será sempre) condição absolutamente imprescindível para a minha permanência nessa ou em qualquer outra empresa com a qual colabore.

2. Desporto com respeito

O que querem todas as pessoas de bem, que gostam de desporto? Querem usufruir da sua paixão em segurança. Querem levar as suas esposas, maridos e filhos a estádios, pavilhões e pistas, sem pensar no risco de serem atropelados no meio de um motim ou atingidos por um tsunami de pancadaria.

As pessoas normais, as que são boas por natureza, têm o direito de exigir que o desporto volte a ser a escola de virtudes que um dia foi. Têm o direito a querer sentir conforto, paz e entusiasmo quando assistem a uma corrida ou competição.

Não importa se a responsabilidade nessa matéria cabe mais a este ou àquele, a esta ou àquela. Não importa se o problema é difícil de resolver (e é) ou se depende da vontade conjunta de vários órgãos, entidades ou instituições (e depende).

Todas as pessoas que concorrem voluntariamente para cargos na política ou no desporto sabem que o caminho que têm de percorrer não será sempre um mar de nenúfares. Sabem que, no trajeto, terão que enfrentar algumas tempestades (umas mais bravas do que outras), que devem encarar com coragem, sem medos e de frente. Quem tem capacidade, consegue. Quem não tem, está no cargo errado.

Mas não nos precipitemos. O que o adepto pede é muito simples: um sinal de mudança. O adepto quer sentir que este problema de fundo começa a ser resolvido. O adepto quer ver alguns passos, algumas medidas exequíveis neste sentido.

O desporto, tão marcante na forma como influencia as pessoas numa sociedade, nunca pode ser transmissor de violência, medo e insulto. É o mundo ao contrário e a responsabilidade mora sempre nas mãos de quem tem poder e legitimidade para atuar.

3. Mehdi Taremi

A melhor resposta é quase sempre a que se faz, não a que se fala.

O “golo da vida” do avançado iraniano teve o condão de silenciar rivalidades desportivas (já demasiado ofensivas no discurso) e mostrar-nos um homem de coragem e caráter.

Era bom que as pessoas percebessem bem as consequências pessoais, profissionais e familiares que a sua opção - a de apoiar publicamente as mulheres iranianas, num contexto politicamente muito sensível - pode ter num país cujo regime raramente perdoa ou esquece quem ousa expressar-se livremente. Chapeau.

4. Igualdade e respeito

O tratamento dado às pessoas, a todas as pessoas, deve ser justo e igual. Deve ser respeitoso, adequado e íntegro. Isso vale para qualquer pessoa, independentemente da sua idade, género, cor da pele, credo ou religião.

Nascemos iguais, morremos iguais. Não pode haver ninguém, pelo meio, que ache que é diferente para melhor. Esta verdade torna-se mais premente quando em causa estão relações de poder, exercícios de influência. A lei chama-lhe "temor reverencial".

Nenhum patrão, professor ou treinador pode usar a margem de influência da sua posição para coagir, assediar, incomodar, ofender ou diminuir um funcionário, aluno ou jogador. Tal como nenhum pai deve fazer o mesmo em relação a um filho.

Ninguém pode usar o seu poder momentâneo para explorar maliciosamente a “debilidade” física, moral ou intelectual dos que estão sob a sua alçada. Quando isso acontece de forma clara e comprovada, é preciso expor, denunciar, afastar, sancionar e punir. Seja quem for, seja como for.
Respeito.