Quando o vídeo avançou, o relato da RTP parece ter hipnotizado Augusto Inácio por breves segundos. Humberto Coelho estava nos comentários e estava prestes a jogar-se o Portugal-Inglaterra, no Campeonato do Mundo de 1986, no México. Referiam-se os 28 graus, filhos de um sol que ia inevitavelmente bater de frente com o corpanzil dos futebolistas. Era um regresso àquele torneio, 20 anos depois de os ingleses terem eliminado a seleção portuguesa onde pontificava Eusébio da Silva Ferreira.
Inácio, natural de Lisboa, está numa sala da redação do Expresso com a história diante dos olhos. Mas, verdade seja dita, parece pouco entusiasmado com o jogo e com o ver-se. Talvez seja isto que os futebolistas têm, que aquela coisa que romantizamos e tiramos o chapéu seja apenas mais um dia no escritório. Ainda assim, as histórias atropelaram-se, foram como uma chuva intensa em novembro. Era o 15.º jogo entre Portugal e Inglaterra e desta vez, talvez contra todas as previsões, com um desfecho feliz. É que os portugueses vinham vivendo um diferendo com a federação, por causa de contratos publicitários e questões burocráticas e de natureza financeira.
Foram 52 dias no México. A certa altura, entre condições que não lembram a ninguém, marcou-se um jogo-treino para a seleção afinar a máquina. Quando deram por eles, os rivais eram os empregados e cozinheiros do hotel onde iam meter para dentro das refeições.
Este Portugal-Inglaterra começou antes de começar. Um colega da equipa chegou-se ao pé de Inácio e disse-lhe “já foste”. Ou seja, havia conspirações para montar o 11 titular, admite. No pequeno-almoço a seguir, chegou a uma mesa e avisou, bem alto e com um murro na mesa, que não aceitava ficar de fora devido ao “caldinho”. E assim se explica que Álvaro Magalhães, normalmente lateral esquerdo, tenha jogado na direita, com Inácio a pegar de estaca a defesa esquerdo.