As imagens dos festejos da seleção argentina após cada encontro do Mundial 2022 dariam para escrever um dicionário sentimental, com fotografias que ilustrariam o significado de “emoção”, “paixão”, “alívio” ou “desejo”. Entre os postais de cânticos entoados por vozes eufóricas e acompanhados por pulsos que parecem soltos dos braços, há uma cara pouco conhecida que se mistura nas danças de Messi, Otamendi ou Enzo Fernández.
De cabelo loiro e cara imberbe, um olhar para a globalidade da alegria alviceleste talvez não permita atestar que ali está aquele aparente intruso. É Federico Gomes Gerth, guarda-redes de 18 anos e o 27.º jogador do plantel que Lionel Scaloni levou ao Catar.
O guardião é o único sparring da lista, nome que os argentinos dão aos jovens que acompanham a seleção, ajudando-a na preparação para os Mundiais. Gerth foi o único pibe chamado pelo técnico para estar no Mundial 2022.
Com 1,93 metros e já tendo assinado contrato profissional com o Tigre, clube do bairro onde nasceu mas pelo qual ainda não se estreou na equipa principal, Gerth participa nos treinos com Dibu Martínez, Armani e Rulli, os três guardiões convocados. O adolescente já tinha integrado vários estágios da seleção antes do Mundial, fazendo todo o quotidiano à imagem dos 26 jogadores, só não estando nas fichas das partidas.
No vídeo que Nicolás Otamendi fez da viagem de avião da seleção da Argentina rumo ao Catar, a dada altura ouve-se Leandro Paredes a perguntar “vais filmar o loco com aquele cabelo?”. O loco era o jovem Gerth, respondendo Ota à pergunta de Paredes dizendo que “aquele cabelito vai durar pouco tempo”. Para já, a prometida praxe de rapar o guardião ainda não foi cumprida.
Segundo o diário “Olé”, Fede destaca-se pelo hábil jogo de pés. Admirador de Rogério Ceni e Chilavert, o guardião copia os exemplos dos ídolos para marcar golos através de livres e penálti, algo que “começou com uma brincadeira e acabou como uma arma nas camadas jovens do Tigre”, indica o mesmo jornal.
De Sensini a Gerth
Desde cedo considerado uma jovem promessa das balizas, Fede Gomes Gerth tem já passado nas seleções jovens argentinas. Já em 2022, fez parte da seleção que ganhou o conhecido torneio de L'Alculdia, em Espanha, para seleções sub-20, sendo o guardião da equipa orientada por Javier Mascherano.
O antigo médio e defesa de Liverpool ou Barcelona partilha com o guarda-redes também o facto de ter sido sparring num Mundial. Em 2002, Marcelo Bielsa levou Mascherano ou Pablo Zabaleta para treinar com a seleção que acabaria por cair na fase de grupos.
A tradição de levar jovens que ajudem a preparar a seleção nas fases finais de Campeonatos do Mundo começou em 1986, no México, com Bilardo. No Mundial de Maradona, Néstor Sensini foi um dos sparrings, na antecâmara de disputar os Mundiais de 1990, 94 e 98. A ideia teve continuidade em 1990 com Bilardo e em 1994 com Basile, mas, no França 1998, Daniel Passarella não levou qualquer jovem além dos convocados para o torneio.
Nos últimos Mundiais, houve vários sparrings que viriam depois a chegar à seleção principal. Além dos já citados Zabaleta e Mascherano em 2002, em 2006, à Alemanha, foram Di María, Fazio ou Mercado. Em 2010, Maradona levou Tagliafico à África do Sul e, em 2014, Gio Simeone foi um dos jovens que viajaram com a equipa de Sabella para o Brasil. Em 2018, Thiago Almada, outro dos 26 desta Argentina de Scaloni, foi com Sampaoli à Rússia.
Tem alguma questão? Envie um email ao jornalista: tribuna@expresso.impresa.pt