Em ano de Olímpicos haverá os ‘Jogos em Esteroides’, onde o doping é bem-vindo e se dá 1 milhão de dólares a quem bater recordes do mundo

Editor
“É uma treta, não é?” pode não ser a tradução que assente à medida no “bollocks” do inglês britânico. A essa expressão ligeira, usada para menorizar ou troçar, recorreu Sebastien Coe quando comentou o evento sobre o qual “realmente” não se pode “entusiasmar”. Sem travões, o presidente da World Athletics explicou que caso algum atleta “for imbecil o suficiente” e queira nele “participar”, será “banido durante muito tempo” das competições oficiais. A pontuar o embrulho, acrescentou-lhe um laçarote: “Mas, realmente, não perco noites de sono a pensar nisso.” A frase a querer indicar desprezo, dita pelo líder da Federação Internacional de Atletismo na véspera do arranque dos Mundiais de pista coberta desde fim de semana, pareceu emanar o seu contrário.
Ainda não se sabe bem quando, nem como será, mas os Enhanced Games são uma nuvem a pairar, sem ponta de inocência, sobre o desporto internacional em ano de edição centenária dos Jogos Olímpicos. Traduzi-los à letra como ‘Jogos Melhorados’ não fará jus ao evento. Talvez um ‘Jogos em Esteroides’ seja mais apropriado face ao conceito: fazer uma competição com natação, atletismo, ginástica, halterofilismo e modalidades de combate, sem vertente coletiva nem modalidades com bola, em que não haja testes anti-doping, nem lista de substâncias proibidas e os atletas possam usar qualquer anabolizante que lhes melhore o rendimento. É um cada um por si em busca de aprimorar a performance onde se permite um vale-tudo de drogas para o conseguir.
E com uma cenoura pendurada diante dos olhos de cada participante, a servir de incentivo para que atletas outrora olímpicos e ganhadores de medalhas engulam ou injetem substâncias: quem for capaz de bater um recorde do mundo na prova será recompensado com um milhão de dólares. O sumário é curto, claro como a água também - os Enhanced Games querem retribuir atletas que sem amarras quanto à toma de substâncias consigam fazer melhor do que os resultados obtidos por atletas proibidos de tocar nessas mesmas substâncias. O presidente da World Athletics “pode chamar-lhe uma treta, mas chamar nomes não vai parar o progresso”, advogou quem descreveu Sebastien Coe como “um representante da era analógica do desporto”.
A sede de serem anfitriões de marcas mundiais a serem quebradas por corpos inflacionados por substâncias vai até aos píncaros das possibilidades. “O primeiro atleta ‘enhanced’ a bater o recorde do Usain Bolt vai receber, pelo menos, um milhão de dólares”, já exclamou, este mês, Aron Ping D'Souza, o fundador do projeto que ousa ter a mira posta nos 9,58 segundos que o lendário jamaicano, dono de aptidões inatas surreais, fixou em 2009.
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