Quando o jogo terminou, o sorriso de Holly era diferente. Ainda de bandeira na mão, parou e respirou fundo, como tantas vezes fez durante o encontro entre as Harlequins e as Exeter Chiefs, mas um pouco mais ofegante do que costume. “Nunca tinha arbitrado em Twickenham, foi um grande jogo para marcar a minha saída. Os meus abdominais começaram a esforçar-se um pouco quando estou a correr, por isso não poderei fazer o meu trabalho como deve ser por muito mais tempo”, disse ao “The Telegraph”, após o Big Game, uma partida da RFU organizada pelos Harlequins, todos os anos pelo Natal, mas que desta feita foi adiada para este sábado, 4 de março.
A árbitra inglesa, que foi jogadora de râguebi, tal como a sua mãe, resolveu colocar a sua carreira em espera ao fim de seis meses e meio de gestação, mas não escondeu que quando descobriu estar grávida, no ano passado, sentiu medo. Vários. Por um lado, queria continuar a arbitrar, mas tinha receio que ao contar à Rugby Football Union (RFU) esta insistisse que parasse de trabalhar de imediato. Algo que não estava nos seus horizontes. “Se eu quisesse continuar, sabia que tinha de manter a minha gravidez em segredo”, assumiu ao “The Telegraph”.
“Quando se engravida, não se sabe se se vai realmente ter medo de entrar em campo”, explicou Wood, que faz crossfit para manter-se em forma. Nos dois anos em que esteve a tentar engravidar pesquisou e leu muito sobre o assunto e sobre atletas que continuaram a treinar e a competir ao mais alto nível. Percebeu que o risco de ser derrubada ou tropeçar durante um jogo era extremamente baixo. “A minha mentalidade não mudou em nada. Eu queria continuar o máximo de tempo possível. Nunca foi uma questão na minha cabeça parar de arbitrar”.
Com o objetivo de apitar no Campeonato do Mundo feminino, que Inglaterra acolhe em 2025, Holly Wood não só não parou como fez questão de apitar 25 jogos de râguebi enquanto grávida, juntando mais 21 como assistente, abrangendo jogos da II Liga nacional masculina e de nível inferior, e da Premier 15s.
A inglesa, que quis mostrar ser possível conciliar as ambições como árbitra e futura mãe, reconheceu ao jornal inglês que teve sorte por estar a viver uma gravidez com poucos sintomas - e quando finalmente chegou o momento de revelar à RFU a sua condição, a reação foi “super positiva”. Mas Holly não se limitou a informar que estava grávida, apresentou também um documento escrito com uma política de gravidez, que não havia, para todas as árbitras não profissionais, e recebeu luz verde por parte da RFU, que planeia implementá-la formalmente no final deste ano.
“Sei que a forma como o fiz não é para todos e que levanta sobrancelhas, mas as atitudes na RFU estão a mudar”, afirmou ao “The Telegraph”.
O caso de Holly não é único. A ex-atleta de meio fundo, Alysia Montano, competiu grávida mais do que uma vez, em 2014, terminou uma prova de 800 metros na 34.º semana de gestação. Nessa altura, Alysia Montaño já era pentacampeã dos EUA e quis provar que as “mulheres podem estar em forma durante a gravidez e continuar as suas carreiras enquanto constroem uma família”. Depois disso, a atleta voltou a correr grávida em 2017, de cinco meses, e faz questão de levar os filhos para as provas e até para algumas conferências de imprensa. Também a norte-americana Serena Williams ganhou o Australian Open, de 2017, já grávida da sua filha. Em janeiro deste ano, a alemã Gesa Krause, fez 17 minutos e 31 segundos numa corrida de cinco quilómetros em Trier, enquanto estava grávida de cinco meses.
Este é um tema com várias nuances que vão desde a saúde aos direitos legais e apesar de haver cada vez mais mulheres a assumir e a provar ser possível conciliar, durante algum tempo, a sua atividade profissional com o papel de mãe, a verdade é que este número ainda é inferior aos casos em que a revelação da gravidez prejudica, em muito, as atletas. É o caso de Sara Bjork Gunnarsdóttir, jogadora da Juventus, que quando descobriu que estava grávida, em março de 2021, ainda em representação do Lyon, o clube francês deixou de pagar-lhe os salários. Valeu a FIFA, que interveio e deu razão a Sara.