É uma daquelas coincidências que apenas a pandemia explica, tal a baralhação que trouxe ao calendário internacional do atletismo. Com Jogos Olímpicos a caminharem para a frente, Mundiais adiados e Europeus idem aspas, tudo se concentrou em pouco mais de um ano. E nesse ano, Pedro Pablo Pichardo ganhou tudo. Depois de campeão olímpico, foi campeão mundial há três semanas em Eugene, nos Estados Unidos. E numa proximidade pouco comum, realizam-se agora os Europeus, em Munique. Com vitória para Pichardo no triplo, pois claro.
O atleta português faz assim o pleno nas maiores provas ao ar livre, campeão de tudo e com vantagem, principalmente neste panorama europeu onde não tem sequer quem lhe faça cócegas nos pés. Não saltando o seu melhor, Pichardo foi ouro com 17.50, praticamente mais meio metro que o medalha de prata, o italiano Andrea Dallavalle (17.04). O bronze foi para o francês Jean-Marc Pontvianne (16.94). O outro português na final, Tiago Pereira, foi 8.º, com 16.60.
Chegado a Munique com a melhor marca mundial do ano, os 17.95 que lhe deram o título mundial em Eugene, Pichardo até começou a prova com um salto incaracteristicamente modesto para a sua valia, um 17.05 que o colocou imediatamente na frente. A olhar para Jorge Pichardo, seu pai e treinador, que não estaria seguramente satisfeito, o triplista do Benfica respondeu com um gesto com a mão que parecia querer dizer “espera, calma”. E se não foi à primeira que matou a competição, seria à segunda. Os 17.50, naquele estilo planante, como que parando no ar, um avião de papel a fazer a sua trajetória sem mácula, deixaram a concorrência lá bem atrás e uma certeza para os rivais: quem quisesse bater Pichardo teria de fazer recorde pessoal no Estádio Olímpico de Munique.
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Tal não aconteceu e deu até para dispensar o quarto e quinto saltos, algo que Pichardo faz frequentemente para poupar forças para tentar aquele que é, por estes, o seu verdadeiro objetivo para lá das medalhas de ouro: chegar novamente aos 18 metros, algo que conseguiu ainda como atleta cubano (é o quinto melhor de sempre), mas que lhe vai fugindo desde que se veste de verde e vermelho. Nos Jogos de Tóquio chegou aos 17.98, nos Mundiais aos 17.95.
Em Munique não conseguiria novamente, ao fazer um nulo no derradeiro ensaio, mas depois de uma temporada desgastante, em que ainda foi prata nos Mundiais indoor, em março, era difícil pedir o salto da sua vida a Pichardo nesta altura da época.
Fica o mais importante, mais uma medalha, aquela que fecha a Santíssima Trindade das medalhas do atletismo. Os 18 metros e o recorde mundial continuam à espera. Provavelmente não por muito tempo, é esse o desejo de Pichardo, que à RTP, logo após o final da prova, lembrou um facto curioso: “O Jonathan Edwards bateu o recorde mundial com a minha idade, 29 anos. A época ainda não acabou, vou tentar ainda um bom salto”, assegurou.
Pichardo confessou-se "muito feliz", sublinhando que tudo é grupo de muita dedicação. "É muito trabalho aqui dentro do meu corpo. E depois parece fácil", atirou. O objetivo é, claro, "continuar a conquistar título".