No seu último jogo oficial na Argentina, Messi emocionou-se e lançou a dúvida: “Pela idade, o mais lógico é que não vá ao Mundial”
Marcos Brindicci
Lionel Messi jogou na quinta-feira a última partida oficial em território argentino, marcando dois golos na vitória da seleção da casa frente à Venezuela, na qualificação para o Mundial. Ainda não é o adeus definitivo, mas o início do fim. Se esse fim será daqui a um ano, no Mundial, é algo que o craque vai perguntar ao seu corpo no dia a dia até lá
Nos primeiros minutos, Lionel Messi parecia até desligado. Talvez nervoso, solene que era o momento. O Monumental, nome e adjetivo do estádio do River Plate, em Buenos Aires, estava apertadinho de tanta gente, tarjas e mais tarjas celebravam o craque. Aquelas 85 mil pessoas sabiam, Messi sabia, todos em campo sabiam, que eram as felizes contempladas de uma visão única: o último jogo oficial de Lionel Messi em território argentino.
A fase de qualificação para o Mundial de 2026 já está praticamente terminada na América do Sul, enquanto na Europa acaba de começar. A Argentina dominou-a, há muito que sabe que estará nos Estados Unidos, Canadá e México para defender o título conquistado no Catar, o zénite da vida futebolística de Messi, mas frente à Venezuela impunha-se ganhar, para Messi despedir-se em festa. E assim aconteceu, uma festa com golos, emoções, lágrimas e algumas declarações contraditórias, e daí talvez não, porque aos 38 anos um futebolista não pode dar certezas, apenas viver com o que o dia a dia lhe dá.
Voltemos então ao aparente alheamento de Messi, que seria, na verdade, o peso da realidade. Só que a magia não se compadece com estados de alma, surge, apenas. Ainda na 1.ª parte, Julián Alvarez encarou um defesa, ultrapassou-o. Podia ter assumido o remate, as estatísticas dos expected goals ou quejandos estariam seguramente em valores explosivos, mas o jovem preferiu dar para o lado, para que Messi pudesse marcar na despedida. E o jogador do Inter Miami fê-lo com um toque de classe, uma bola picada com aquele glorioso pé esquerdo por cima do guarda-redes da vinotinto.
Marcos Brindicci
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Messi marcaria de novo numa 2.ª parte em que pareceu finalmente desamarrado das responsabilidades de se despedir em grande. Fez o terceiro golo do 3-0 com que a Argentina fechou a qualificação em casa. Messi no início e no fim, claro. Já não estará na viagem da albiceleste ao Equador, onde terminará esta fase. Já não é um rapaz e Lionel Scaloni lembrou que, com o objetivo já mais que conquistado, com a simbólica despedida feita, Messi merece estar com a família.
As dúvidas para 2026
As lágrimas não saíram como um riacho poderoso, mas rondaram os olhos de Messi durante todo o jogo. Depois de muitos anos de uma relação agridoce, com virares de costas dramáticos e regressos esperados, as vitórias na Copa América em 2021 e no Mundial de 2022 fizeram unir definitivamente Lionel Messi e o povo argentino. As lágrimas também vêm desse lugar. “É claro que foi porque este era o último jogo a valer pontos cá, vivi muitas coisas boas e não tão boas neste relvado e poder terminar desta maneira aqui é o que sempre sonhei, festejar com a minha gente”, afirmou no final do jogo. “Durante muitos anos tive carinho em Barcelona e o meu sonho era ter esse carinho aqui também, no meu país, da minha gente.”
Esta não foi uma última despedida, mas o início do fim. Um último tango em vários atos. O adeus à Argentina aconteceu, 72 jogos na qualificação sul-americana depois, jogos em que marcou 36 golos. Daqui até ao Mundial falta apenas um ano. Ou ainda falta um ano? Messi não sabe se chegará lá, deixando o mundo em suspenso. “Pela idade, o mais lógico é que não chegue ao Mundial”, começou por dizer, para susto de toda a gente, para logo abrir as portas à esperança: “Mas está quase aí e estou entusiasmado, com vontade. Como sempre disse, será dia a dia. Venho de estar parado, regressei e ressenti-me da lesão. Mas agora consegui jogar três jogos seguidos.”
NurPhoto
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Messi diz que se sente bem, mas tem de ser “sincero” consigo mesmo e, neste momento, quando está bem fisicamente, diverte-se muito. “Mas quando não estou, passo mal”, revelou aos jornalistas, já depois do fogo de artifício invadir os céus de Buenos Aires, iluminando-se perante um iluminado.
“Nove meses passam muito rápido, mas, ao mesmo tempo, é muito”, disse ainda o craque, o adágio serve para o futebol e para todos aqueles que se encontram num limbo. Messi coloca as decisões finais para a pré-temporada de 2026 e para o que o seu corpo lhe confidenciar aí. Agora quer ser campeão da MLS com o Inter Miami, haverá mais jogos com a Argentina, amigáveis, preparações. Scaloni, rosarino como Messi, assume que gostava que La Pulga ainda jogasse em Rosario, mas não sabe se será possível. Jogos a contar é que Messi já não fará no seu país (tal como Otamendi, aliás).
Começou a última dança, de rosa trincada entre dentes.