O futebol castigou Sandro Tonali por causa das apostas, o mesmo futebol que continua a faturar com elas
Serena Taylor
O médio italiano voltou a competir ao serviço do Newcastle após dez meses de suspensão por ter feito apostas desportivas (inclusive nos próprios jogos). Contra o Nottingham Forest, na Taça da Liga Inglesa, o jogador de 24 anos atuou num campo rodeado por publicidade a casas de apostas, vício que o levou a suspender atividade. Na Premier League, 11 dos 20 clubes têm na camisola patrocínios de empresas ligadas à indústria da sorte
O desembrulhar da nova temporada é fase para estrear jogadores, para os reforços se darem a conhecer aos adeptos e os treinador remendarem os buracos nos plantéis com caras novas. O Newcastle não teve a janela de transferências mais ativa dos últimos tempos. Os investimentos milionários evidentes quando a participação saudita no clube ainda estava pintada de fresco estagnaram, o que não significa que tenha deixado de existir capacidade para os fazer.
Sandro Tonali não é uma novidade na equipa. A disponibilidade que tem para integrar as opções de Eddie Howe é que mudou ou não tivesse sido levantada a redoma que o impedia de jogar. Pela primeira vez, desde 25 de outubro de 2023, o médio entrou em campo ao serviço dos magpies após ter estado afastado durante dez meses por violar, quando ainda representava o AC Milan, as regras impostas aos jogadores em relação às apostas desportivas. A federação inglesa também o castigou com dois meses de pena suspensa por ter concluído que Tonali, já em Inglaterra, levou a cabo apostas indevidas, algumas em jogos nos quais participou, situação que também tinha acontecido em Itália.
Diante do Nottingham Forest, num encontro a contar para a Taça da Liga Inglesa, Tonali voltou aos relvados. Durante o período de ausência, além do acompanhamento psicológico e da multa de 20.000 euros, visitou escolas e clubes amadores transalpinos na tentativa de sensibilizar jovens para o problema. O agente Giuseppe Risol disse, ao longo do processo, que o seu cliente estava a sofrer com a “doença das apostas”.
O centrocampista de 24 anos, que voltou a ser convocado para representar a Itália, assume que nos primeiros três meses da penalização sentiu “verdadeiras dificuldades” para lidar com a situação. “Nunca estive sozinho”, garante Tonali que treinou à parte da equipa que ficou em sétimo lugar da Premier League na última época.
Só as grandes penalidades quebraram a prepotência da igualdade (1-1) na eliminatória entre o Newcastle e o Nottingham Forest. Sandro Tonali foi titular e quase conseguiu marcar. Não foi capaz de empolar o regresso com um golo mesmo que se tenha visto frente a frente com Carlos Miguel, o brasileiro que zela pela segurança das redes das tricky trees. Esse momento, como tantos outros que a transmissão televisiva embrenhou em coordenadas geográficas por todo o globo, teve como pano de fundo a publicidade a uma… casa de apostas.
Robbie Jay Barratt - AMA
Os painéis publicitários contornam o relvado alternando nas marcas que exibem. Quem investe para ter a sua marca a piscar nos limites do campo anseia que os melhores momentos do encontro – aqueles que integram os resumos que passam incessantemente nas estações televisivas e que são cortados em vídeos de poucos segundos difundidos pelas redes sociais – aconteçam quando o anúncio pelo qual pagaram estiver a ser exibido. Inevitavelmente, devido à omnipresência, as casas de apostas são o emplastro de muitos lances mesmo que a promoção do vício contamine até jogadores de futebol como Tonali. Na memória recente dos ingleses está também o caso de Ivan Toney, avançado do Brentford que foi castigado devido a apostas.
Este ainda é um caso em que a publicidade a casas de apostas fica fora das quatro linhas. Noutros, a propaganda consegue acesso VIP ao relvado por intermédio das camisolas dos jogadores. Na edição 2024/25 da Premier League, 11 dos 20 clubes têm casas de apostas a ocupar-lhes a parte frontal do equipamento. Porém, em abril de 2023, a Liga Inglesa anunciou que os emblemas que a compõem acordaram pôr fim aos patrocínios a casas de apostas nas camisolas a partir de 2026/27.
Em Portugal, 13 das 18 equipas da Primeira Liga carregam na camisola estampagens de casas de apostas, além de que o próprio nome do campeonato inclui uma empresa que atua na mesma indústria. Segundo o que o Instituto Português do Desporto e Juventude divulgou à agência Lusa, as apostas desportivas valeram 67 milhões de euros à federações desportivas nacionais em 2023.