Um dia, finalmente cara a cara com um dirigente de clube que torcia o nariz e dava o dito por não dito, pouco afim de pagar a um jogador os bónus previstos no contrato, Rafaela Pimenta ouviu a seguinte admissão: “Trocámos muitos e-mails, afinal existes mesmo. Achava que eras apenas uma prostituta do Brasil”. Não diz há quanto tempo foi, mas constata como hoje ainda negoceia com o tal homem. “Não quero saber, não acho humilhante ser mulher. Se é assim que tentas que eu me sinta mal, é muito estúpido”, explicou sucintamente ao “Financial Times”.
Rafaela Pimenta ‘herdou’, por assim dizer, a carteira de jogadores que detinha em parelha com Mino Raiola, um dos empresários mais conhecidos do futebol, falecido em abril do ano passado. Em conversa com o jornal britânico, garantiu jamais ter ponderado encerrar a agência e que o negócio nem foi tema na última vez que esteve com Raiola, já no hospital. A ligação com o ítalo-neerlandês vinha desde 2000, quando se conheceram no Brasil onde era professora de direito e recebia seis euros à hora “que nem davam para pagar o parque”.
A brasileira mudou-se para o Mónaco, ficou com parte igual da One Sports Business Strategy e desde então era apresentada como “a advogada” em reuniões com gentes da bola. “Ainda é uma indústria muito orientada para os homens, onde algumas pessoas acreditam honestamente que ‘ela não sabe fazer uma transferência, ela é uma mulher’”, contou Rafaela Pimenta, hoje a cargo de clientes como Erling Haaland, Gianluigi Donnarumma, Marco Verrati, Paul Pogba ou Zlatan Ibrahimovic e empregadora de três pessoas a tempo inteiro, “todas mulheres”.
Ao “Financial Times” retratou, ainda, como muitos empresários foram “muito paternalistas” a meio que oferecer o seu apoio na altura da morte de Mino Raiola, à exceção de Jorge Mendes. Recebeu telefonemas de vários a dizerem que iriam tomar conta de jogadores seus, outros ligaram diretamente aos futebolistas, tentando convencê-los a trocarem de alianças. Os preconceitos sexistas ainda existem, assegurou. “Se a Margaret Tatcher fosse uma agente, iriam questioná-la. Ela conseguiu liderar um país, mas não conseguiria ser agente. No futebol, muitos homens acreditam que só eles são capazes”, criticou.
Rafaela Pimenta teve igualmente palavras para defender os chorudos salários tipicamente pagos aos jogadores dos clubes de topo nas principais ligas da Europa. “Estás numa indústria onda existe muito dinheiro, estás intitulado a ele”, resumiu, confessando o seu aborrecimento quando nota algo para o qual a sua agência já oferece serviços específicos - imagem branding. “O que me chateia é a desconexão da realidade. ‘Ganho muito dinheiro, posso fazer e dizer o que quiser. Posso comprar um Ferrari e ir para o Mónaco’. Aí tornas-te um idiota”, defendeu. Enquanto futebolista, “não podes passar o dia a olhar para o Instagram e a contar quantos seguidores tens”.