O relvado não obedecia à grandeza da Premier League, mas o orgulho dos futebolistas do Manchester United, esse, estava mais condizente com a história do clube. A bola ainda não lhes obedece como antigamente, nem o corredor central parece ser ainda a refinaria dos milagres futeboleiros mais belos, mas a vitória no campo do Southampton esta tarde (1-0) alimenta o processo de lambimento de feridas em curso no Old Trafford, gloriosamente insuflado pela vitória contra o Liverpool, na jornada anterior.
Bruno Fernandes, intermitente, fez o único golo do jogo no início da segunda parte, depois de bater de primeira, já dentro da área – um gesto difícil –, respondendo da melhor maneira a uma excelente bolinha de Diogo Dalot, cada vez mais fiável pelo lado direito. Foi uma das raras vezes que os jogadores do United superaram realmente a defesa liderada por Armel Bella-Kotchap, que fez uma exibição especial, como mostram os dados.
Erik ten Hag, que ouve Steve McClaren por uma orelha e Mitchell van der Gaag por outra, optou por manter Cristiano Ronaldo no banco, dando gás aos vitoriosos jogadores que bateram o rival de décadas na segunda-feira. Casemiro, o milionário reforço, também ficou no banco.
Mas Cristiano entraria mesmo quando faltavam pouco mais de 20 minutos para o fim, assinando o jogo 230 na Premier League (102 golos). O capitão da seleção portuguesa substituiu Jadon Sancho, o futebolista mais entusiasmante dos red devils esta tarde. O que se viu, o que é uma má notícia para Ten Hag, foi uma equipa que ainda vai vivendo de rasgos individuais e lançamentos para o espaço. Rashford não foi particularmente influente, Elanga idem.

Steve Bardens
Agora que o triângulo das Bermudas foi cancelado no Santiago Bernabéu, o termo usado por Ancelotti para definir o trio Casemiro-Kroos-Modric, viu-se outro tipo de triângulo das Bermudas no corredor central do United (ausência de jogo), o que sugere a falta de afinação, qualidade técnica até, embora não falte talento nas botas de Bruno Fernandes e Christian Eriksen. Mas falta talvez coragem ou confiança para avançar por ali, para combinar, é ali que se criam mais problemas ao adversário ou, pelo menos, se atraem mais jogadores e se abrem verdadeiras crateras pelos lados.
Cristiano, que ouviu “Viva Ronaldo” e outro cântico por parte dos adeptos (talvez “We love to see Ronaldo”) que não o deixam cair, levou um toque e pediu assistência no joelho direito. A cara do futebolista revelava problemas, mas ele insistiu e ficou em campo. Casemiro, aos 78’, já ouvia indicações do treinador neerlandês, provavelmente para substituir o português, já que após algumas perguntas e um regresso ao relvado, o médio brasileiro voltou a vestir o colete laranja.
Poucos minutos depois, Casemiro entrou mesmo, foi a estreia do ex-Real Madrid na Premier League. Elanga saiu para a entrada do novo camisola 18 do Manchester United. Viram-se bandeiras brasileiras na bancada e um simpático “ehhhhhhhh”, como se celebrassem algo importante. O futebolista, que lembrou na véspera que já ganhou cinco Champions (justificando assim a mudança de ares), entrou a dar muitas indicações, como se fosse um capitão ou até um treinador. Deu 11 toques na bola, acertou cinco dos oito passes que tentou e ganhou três dos quatro duelos aéreos que disputou, um capítulo onde Cristiano Ronaldo foi particularmente solicitado.

Ash Donelon
Durante muito tempo, o Southampton jogou no meio-campo dos visitantes, mas, e sobretudo graças ao compromisso e valentia de Varane, Lisandro Martínez e Scott McTominay, não conseguiu criar perigo real, com exceção para uma grande defesa de David de Gea, depois de um cabeceamento de Joe Aribo, a passe de Adam Armstrong. Na primeira parte, já o guarda-redes Gavin Bazunu, um jovem que se mostrou a bom nível, e a defesa do Southampton haviam travado o que parecia um golo certo, uma oportunidade em quatro doses, cortesia do desacerto de Bruno Fernandes, Eriksen e Elanga.
Já quase, quase em cima do apito final, os Saints quase marcaram depois de um pontapé acrobático de Sekou Mara, mas Diogo Dalot, talvez tornando-se no jogador mais influente no relvado, parou a bola em cima da linha de golo.
Apito final e mais três pontos para os rapazes de Erik ten Hag, que viu a equipa encolhida contra um Southampton mais ligado, que fez substituições para recuar no terreno e que ainda não garantiu um futebol de qualidade que todos esperam. Cada coisa a seu tempo. Com as vitórias, talvez chegue o conforto e as ideias comecem a sair das cabeças dos protagonistas e dos quadros táticos e dos treinos para as botas dos futebolistas.