O guarda-redes que, há uns anos, se recusou a ser substituído durante uma final com o Chelsea, foi o tipo que, aos 119 minutos, Thomas Tuchel tirou do banco para ir buscar um caneco. Entre a Taça da Liga inglesa de 2019 para a Supertaça Europeia deste 2021 foi quanto durou a travessia da penitência de Kepa Arrizabalaga, a figura da vitória dos ingleses contra o Villarreal
Kepa Arrizabalaga Revuelta está no banco de suplentes em Belfast, com a franja encaracolada a tombar-lhe sobre a testa e o olhar mais calmo do universo a relaxar-lhe a cara, a vestir as mãos com luvas, a ajustar as meias nas canelas e a tirar o colete que o sinaliza como suplente. Quando deixa de o ser, o jogo vai nos 119'.
A um minuto de os acoplados Villarreal e o Chelsea terem de ser cortados um do outro à força, pela lâmina a escaldar que é o desempate por penáltis na final de um caneco europeu, Thomas Tuchel matutou uma ousadia. Ia tirar o Edouard Mendy, o guarda-redes que se ocupou da baliza durante duas horas, para ter Kepa a defendê-la, talvez, tão só contra cinco remates ou menos.
Os ingleses que sorriram primeiro com a graça do golo de Hakim Ziyech (27') estavam empancados nos espanhóis que os igualaram por Gerard Moreno (73'), um empate teimoso ao ponto de separar toda a gente da baliza por 11 metros. A Supertaça Europeia também penaliza igualdades.
Após falatório tido com Hilário, o treinador de guarda-redes do Chelsea, Tuchel enviou Kepa para o retângulo com postes e a tentação dedutível é que o técnico viu na serenidade do tipo que, há uns anos, se recusou a ser substituído durante outra final — em 2018/19, deixou Maurizio Sarri furioso na decisão da Taça da Liga inglesa — o melhor truque para ganhar mais um troféu.
Terá visto, também, a matreirice.
Entre o mau prenúncio do primeiro pontapé de Kai Havertz, facilmente parado por Marco Asensio, e a mansa bola que Raúl Albiol emanava que ia bater, tal a postura corporal que denuncia tudo sem falar, Kepa Arrizabalaga foi amarelado pelo árbitro por atrasar o pontapé de Estupiñán.
Chris Lee - Chelsea FC
No último penálti, aproximou-se do capitão do Villarreal, tapou a boca com a luva e falou algo para ser uma picareta de dúvida na cabeça de Albiol. Seria o segundo penálti que defenderia.
Na prosaica corrida de tudo quanto era corpo do Chelsea na sua direção, um dos primeiros a alcançá-lo foi Mendy. Um dos abraços a engoli-lo logo de euforia veio do guarda-redes que serviu para proteger a equipa contra tudo até os penáltis evocarem a guarda de quem tinha sentado na suplência. Hilário chegaria a esse abraço; haverá outro, certamente, para Petr Cech, guarda-rede de outras primaveras e agora dirigente do Chelsea, filmado a aplaudi-los da bancada.
Depois de conquistar a Liga dos Campeões no Porto, o Chelsea leva a Supertaça Europeia de Belfast diante do senhor Liga Europa (cinco finais, quatro troféus) que tem as agulhas invertidas quando colide com quem levou a Champions na mesma época (três finais, três derrotas). O responsável último, desta vez, foi a penitência de luvas postas de um homem que estava guardado no banco para quando uma final o chamasse com penáltis.