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Como rapazes da formação do Estoril foram “fundamentais” para a preparação da seleção feminina: “Treinar com eles faz a diferença”

Como rapazes da formação do Estoril foram “fundamentais” para a preparação da seleção feminina: “Treinar com eles faz a diferença”
Hernani Pereira/FPF

Na primeira semana de treinos de Portugal tendo em vista o Europeu de futebol feminino, em Inglaterra, jogadores da formação do Estoril Praia e do Casa Pia integraram os trabalhos da seleção. Francisco Neto, Kika Nazareth e três atletas dos canarinhos explicam como foi uma experiência que agradou a todos

Como rapazes da formação do Estoril foram “fundamentais” para a preparação da seleção feminina: “Treinar com eles faz a diferença”

Pedro Barata

Jornalista

Na semana que antecedia os exames nacionais de Matemática e Português, os jogadores de iniciados do Estoril viveram uma “experiência incrível e única”, como resume Dorin Tenente, defesa de 15 anos da equipa da linha. A equipa técnica do conjunto da formação dos canarinhos já tinha avisado que, numa manhã, os adolescentes iriam à Cidade do Futebol “fazer um treino”, mas Lourenço Azevedo, médio de 14 anos, confessa que “desconhecia contra quem”.

Ao entrarem no campo e verem que iriam jogar contra a seleção principal feminina, que se encontrava nos primeiros dias do estágio anterior ao Europeu, os jovens ficaram “entusiasmados”, conta Lourenço. Estavam conscientes de que “treinar com as jogadoras que vemos na televisão é algo que não acontece sempre”, resume Dorin. Na Cidade do Futebol, durante quatro partes de 20 minutos e em campo inteiro, a preparação da seleção para o torneio que decorrerá em Inglaterra teve a ajuda de 20 jogadores de 14 e 15 anos do Estoril.

Além dos canarinhos, também jovens da formação do Casa Pia participaram em treinos da equipa nacional durante a primeira semana de estágio, na qual o selecionador nacional Francisco Neto só esteve presente numa sessão, tendo depois testado positivo à covid-19 e passado a acompanhar os trabalhos através da varanda do seu quarto na Cidade do Futebol. No primeiro treino depois de cumprido o período de isolamento, o técnico fez um “balanço muito positivo” da presença dos adolescentes na preparação da seleção.

Francisco Neto indicou como “grande objetivo” desta presença o “aumentar dos níveis competitivos internos”. Uma mensagem que parece ter sido captada por jogadores e jogadoras.

Gustavo Lopes, centrocampista de 14 anos, destaca um encontro “muito disputado”, sublinhando a “agressividade” das suas adversárias de circunstância, que “lutavam até ao fim em cada jogada e eram fortes nos duelos”. Somente cinco anos mais velha, mas com um incomparável trajeto no mundo do desporto, uma das jovens estrelas da seleção concorda.

Em conversa com a Tribuna Expresso, sentada num dos bancos do campo principal da Cidade do Futebol, Kika Nazareth explica, com o seu discurso fluido e articulado, que defrontar oposição “mais rápida e forte” obriga a “tomada de decisão” a ser mais acelerada, “com e sem bola”. Para a jogadora do Benfica, “tecnicamente não há homens e mulheres, mas em termos físicos há uma grande diferença” e “treinar com eles faz a diferença” devido à necessidade de “adaptação a dificuldades”.

Do lado do Estoril, Lourenço Azevedo considera ter havido “muita intensidade” em campo, “notando-se que elas estavam ali para melhorar o máximo possível”. Falando com o repentismo com que dribla, Kika diz que os rapazes foram “cinco estrelas” e devem “perceber que foram muito importantes” na preparação para os adversários do Europeu: “Permitem-nos chegar a uma Suíça, uma Suécia ou uns Países Baixos fisicamente mais bem preparadas. Conseguimos ter bola, o que é bom”, confessa a futebolista de 19 anos, que “gosta muito” de jogar contra homens”, pois “eles ficam tramados” se perderem.

Além da competitividade e dimensão física, Francisco Neto destaca como a presença dos jovens permitiu “recriar situações muito específicas”, o que “entre a equipa seria difícil”, elencando “as bolas paradas e a pressão”. Do lado do Estoril, estas preocupações não passaram despercebidas.

Gustavo Lopes recorda que “durante as bolas paradas ouviam-se muitas indicações dos treinadores para dentro de campo”, acrescentando Lourenço Azevedo que se “falava do posicionamento e dos momentos de ataque à bola”. Nos cantos, nota Lourenço, a seleção “ia variando” as formas de execução, ainda que “normalmente batessem diretamente para a área”.

Quanto à pressão, ambos os médios concordam que a seleção dificultava a tarefa do Estoril por ter as médias “com muita movimentação". Lourenço Azevedo — que fala com a Tribuna Expresso dizendo-se “preparado” para o exame de Português que terá brevemente, o que não surpreende dada a forma articulada como se expressa — detalha que a equipa de Francisco Neto “deixava jogar” na defesa, para depois “apertar muito mal a bola entrava no corredor lateral”: “No meio-campo senti muito a pressão delas, com médias muito versáteis, que procuravam muito o espaço, dificultando a marcação. Em momentos específicos do treino, a equipa técnica promovia alterações para adaptar e experimentar coisas novas, ajustando certos detalhes na pressão”.

Um terceiro aspeto realçado por Francisco Neto como virtude da presença dos jovens do Estoril e do Casa Pia foi permitir “intervalar” o esforço das jogadoras, que viviam a primeira semana de treinos depois de épocas desgastantes.

A seleção “conseguia ter sempre um grupo de jogadoras em atividade e outro em pausa”, permitindo gerir melhor a carga das 23 eleitas num trabalho “por vagas e com um maior número de repetições nas tarefas”. O técnico enalteceu “um ganho imenso”, já que elas “não entravam em fadiga nas ações que não interessavam e só entravam em ações que se estavam a abordar no treino nesse dia”. Ao longo das quatro partes de 20 minutos houve várias mudanças na seleção.

Dorin Tenente, Lourenço Azevedo e Gustavo Lopes concordam em apontar Jéssica Silva como a adversária que mais os impressionou, com Gustavo a destacar o “toque de bola e velocidade” da jogadora do Benfica. Já perto do final, Lourenço Azevedo viveu um momento para recordar. Depois de “um erro na construção” da equipa adversária, a bola foi ter consigo, tendo o jovem visto que “tinha espaço para progredir” até ter chegado à entrada da área, onde rematou. O golo que marcou culminou a “oportunidade fantástica” de jogar no local onde treinam as estrelas das seleções.

Algum tempo depois do final da temporada nos iniciados e dias antes dos testes que fecham o ensino básico e abrem portas ao secundário, os jovens do Estoril viveram um dia diferente. Um “desanuviar a meio da época de exames”, diz Gustavo Lopes, que foi, para a seleção, uma “ajuda fundamental”, reitera Kika Nazareth.

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