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Crónica de Jogo

O campeonato pode vir a ser do Benfica, mas o clássico voltou a ser do FC Porto

A equipa de Conceição foi à Luz ganhar (2-1), acentuando a tendência para, no passado recente, as águias terem muitas dificuldades para baterem os dragões. Um auto-golo de Diogo Costa até colocou o Benfica a vencer, mas Uribe e Taremi materializaram a superioridade de um FC Porto que vai para as últimas sete jornadas da I Liga a sete pontos do líder

Pedro Barata

Carlos Rodrigues/Getty

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Passada uma dezena de minutos do início do clássico, era difícil que o Benfica pedisse um cenário melhor. Luz ao rubro, dia a cheirar a verão em Lisboa, 1-0 para a equipa da casa, resultado que permitiria aumentar para 13 os pontos de vantagem para o FC Porto. Um adversário a viver tempos conturbados, a proximidade de um duelo nos quartos-de-final da Liga dos Campeões que permite sonhar. Tudo felicidade para os líderes do campeonato.

Mas há clássicos dentro do clássico. Vai haver sempre alguma dose de polémica, haverá faltas e quebras de ritmo na partida. E, nos últimos anos, é muito provável haver vitória azul e branca, mesmo quando as circunstâncias parecem desenhadas em tons de vermelho.

Inexplicavelmente, do clima de euforia após o 1-0, o Benfica foi avançado, com o decorrer do jogo, para uma apatia coletiva, uma falta de soluções distante da equipa tão bem montada por Roger Schmidt. Tal como em oito das últimas nove receções ao FC Porto, as águias não conseguiram ganhar. Tal como em 12 dos derradeiros 21 clássicos, os dragões saíram da partida com um triunfo.

Os minutos passavam, o Benfica encolhia-se, a equipa de Sérgio Conceição recorria à sua memória tática para se basear nos pilares do técnico para chegar aos três pontos. Pepe começou a tarde a ser batido por Gonçalo Ramos e terminou-a limpando a área de Diogo Costa; Uribe dominou no meio-campo e fez o 1-1; Otávio fez faltas, viu um amarelo, ganhou duelos, protestou, sempre a extensão do treinador em campo; Taremi, no melhor momento dos últimos meses do iraniano, deu a vitória.

À falta de disputar sete jornadas da I Liga, o Benfica sai do clássico com sete pontos de vantagem, margem confortável para quem, em 27 rondas, só cedeu 10 pontos. Mas a Luz voltou a ver o FC Porto festejar, mesmo quando tudo parecia feito à medida de um conjunto que não perdia em casa desde maio de 2022. Contra… o FC Porto. Há clássicos dentro do clássico.

PATRICIA DE MELO MOREIRA/Getty

Debaixo do sol intenso do fim de tarde de Lisboa, a edição 252 do clássico começou com o mais novo dos 22 em campo a brilhar. Logo aos 4’, um excelente passe de Grujic lançou Taremi para posição de perigo, mas António Silva, com um corte cannavaresco, impediu que o iraniano avançasse para Vlachodimos. Na resposta, chegou o 1-0.

Lançado na direita, Bah cruzou a preceito para o coração da área. Lá elevou-se Gonçalo Ramos, mais forte no ar do que Pepe, num duelo direto com 18 anos de diferença entre avançado e central. O atacante cabeceou à barra, mas a bola bateu na parte de trás da cabeça de Diogo Costa e foi para a baliza. O internacional português tornou-se no primeiro guarda-redes da história dos encontros entre Benfica e FC Porto a marcar um auto-golo.

Sérgio Conceição reagiu à desvantagem com um sorriso irónico, algo nervoso, consciente que o que já era uma missão difícil se acabava de complicar ainda mais. Os visitantes tinham mais iniciativa, mas nunca levaram perigo para a baliza rival nos primeiros 40 minutos. Boa parte da primeira parte foi passada numa zona habitual nos grandes jogos em Portugal: conflitos e quezílias, faltas e amarelos, pausas no encontro e não muito ritmo, um embate engasgado, sem muita fluidez.

Gualter Fatia/Getty

Aos 38’, uma recuperação de bola em zona subida de João Mário voltou a dar palco ao duelo entre Gonçalo Ramos e Pepe, o tal conflito geracional na área de Diogo Costa. Desta feita foi o capitão dos azuis e brancos a levar a melhor.

Só no final do primeiro tempo conseguiu o FC Porto criar perigo, mas essa fase levou os dragões a protagonizarem lances sucessivos de sobressalto para os locais. Manafá teve um golo anulado por falta sobre Vlachodimos antes de um dos momentos da tarde: o lateral viu a desmarcação de Pepê e solicitou o brasileiro, que se virou de costas para a linha final e, de peito, assistiu Uribe, que vindo de trás disparou cruzado para o 1-1. Foi o quarto golo da época do colombiano, sempre em grandes embates: havia-o feito contra o Sporting, duas vezes, e frente ao Atlético de Madrid.

A seguir à igualdade, um remate cruzado de Galeno ainda fez os campeões nacionais festejarem um 2-1. No entanto, o VAR ditou que, por seis centímetros, o veloz atacante estava em fora-de-jogo. A Luz celebrou como se de um golo do Benfica se tratasse, mas o descanso chegou com uma certa nuvem de dúvida para os locais. O empate servia mais aos líderes da I Liga, o cenário continuava a ser de conforto, mas o desenrolar do primeiro tempo levara o clássico para uma zona conhecida de ambos os lados, para o campo da superioridade do FC Porto neste duelo direto. O reatar do jogo confirmou essa sensação.

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DeFodi Images

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PATRICIA DE MELO MOREIRA

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PATRICIA DE MELO MOREIRA

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Gualter Fatia

A sensação ganhou expressão no marcador aos 54'. Taremi tem vivido um 2023 de menor fulgor. Em 18 partidas no ano pelo FC Porto, o iraniano só tinha marcado quatro vezes. Mas há clássicos para manter e o avançado fez questão de não ser indiferente a tradições.

Pepe lançou a bola na frente, onde foi cabeceada por Galeno. A defesa do Benfica não afastou o perigo, acabando Taremi, à entrada da área, em zona para visar a baliza de Vlachodimos. O remate do iraniano saiu colado ao poste direito do grego. 2-1.

Mesmo com o FC Porto em vantagem, até final as únicas verdadeiras oportunidades foram dos visitantes. João Mário, que entrou aos 56' e saiu 15 minutos depois, por lesão, rematou de pé esquerdo com perigo aos 62'. Aos 73', um contra-ataque colocou três jogadores dos azuis e brancos contra um dos locais, mas o passe de Taremi para Zaidu saiu para trás.

Só aos 78' foi Diogo Costa forçado a fazer uma defesa, uma intervenção segura a remate de fora da área de Chiquinho. Foi o único remate enquadrado com a baliza adversária que o Benfica fez, expressão da pobreza ofensiva dos líderes do campeonato.

Schmidt lançou Neres e Musa, mas o Benfica perdeu-se em ações inconsequentes, cruzamentos sem perigo e a sensação de desconforto num jogo que começara em festa. Do outro lado, o FC Porto foi, nos minutos finais, todo segurança e calma, uma gestão da situação baseada na memória futebolística da equipa, bem viva na certeza de Pepe a cortar lances.

Sem o empate ter, nunca, parecido uma possibilidade, o FC Porto voltou a sair da Luz com um sorriso. Não tão expressivo como noutras vezes, porque sete pontos de desvantagem continuam a fazer do Benfica amplamente favorito para vencer a I Liga. Mas o clássico voltou a ser do FC Porto, que pela primeira vez na história fica quatro jogos seguidos sem perder em visitas à casa do Benfica. Mesmo nos clássicos que há dentro dos clássicos há espaço para novidades.