Ciclismo

A equipa de João Almeida que supostamente ia deixar as fugas esfarrapou o que foi dito e ganhou mais uma etapa da Vuelta

A equipa de João Almeida que supostamente ia deixar as fugas esfarrapou o que foi dito e ganhou mais uma etapa da Vuelta
Dario Belingheri

Pouco após a heroica façanha da véspera do português, em Angliru, o diretor da UAE Emirates dissera que a equipa se ia abster de mais fugas em tiradas para trabalhar em prol de João Almeida. Nada disso mostrou este sábado, em que Marc Soler triunfou no alto de La Farrapona onde, nas últimas, Jonas Vingegaard ganhou dois segundos ao ciclista de A-dos-Francos, que foi 3.º na etapa

Que fácil para Joxean Fernández, conhecido na praça pela alcunha de Matxín, ter fôlego e fartura de certeza no cume de Angliru, fresco por não lhe competir pedalar, para dizer agora sim, "estamos todos com o João", ora bem, palavras de diretor para quem dirige escassos minutos volvidos do João de quem falava ser um João estrondoso, histórico e indomável a tomar de assalto a "subida mais difícil do mundo", estas as palavras dele, do português que pôs a sua cara de possuído e puxou por Jonas Vingegaard com tamanha pujança que o extraterrestre dinamarquês se manteve na sua ronda em vez de tentar despegar dela.

A fenomenal vitória de João Almeida no pico da Vuelta nas Astúrias, na sexta-feira, arrancou do chefe da desgarrada UAE Emirates uma raridade. Para fora ainda não demonstrara até então querer encurtar a rédea a Juan Ayuso e aos restantes preocupados com zarpar em fugas para ganharem etapas sozinhos, deixando o português solitário só com o seu esforço, sem o trabalho coletivo que enfim teve, a sério, nesta 14.ª etapa que era para atacar o alto da La Farrapona.

Sem as abissais pendentes da véspera, mas acabando a mais de 1700 metros, o líder já sem espinhas da UAE teve a equipa a pedalar a bem dele, com a etapa a empinar, até o próprio Ayuso, já com destino selado para mudar de equipa, predispôs-se a servir o português, cravando um ritmo ao pelotão que fatiou bicicletas à maralha a cada pedalada na perseguição aos fugitivos que sobravam das naifadas que a subida a San Lorenzo, a primeira de 1.ª categoria da tirada, deu ao grupo de teimosos fugitivos.

Quando o espanhol largou o trabalho e se deixou ir, sobravam à volta de 15 ciclistas (todos os 10 primeiros da geral, à exceção de Giulio Ciccone) no que à falta de melhor se continuou a chamar pelotão.

Tim de Waele

Quando iniciaram a ascensão final, neste dia que era o hoje a partir do qual Matxín garantira "não vamos estar nas fugas", havia Marc Soler, com a licra da UAE, a puxar pela fuga do dia, uma contradição com rodas na equipa que lá atrás, já na inclinação média de 5,3% da La Farrapona, tinha Jay Vine e Felix Großschartner a laborarem por João Almeida. Pode ter sido um bluff, as bicicletas também pode ter mind games, a menos de cinco quilómetros da meta ainda restava a solidão de Soler na frente.

Mais premente nas atenções de João Almeida era manter-se perto, caso não fosse possível fugir-lhes no alcatrão, de Jonas Vingegaard, o camisola vermelha com quem se teve de preocupar sozinho nos 2,5 quilómetros finais, após as pernas de Großschartner cederem. A prioridade do português era se não fosse possível encurtar, pelo menos manter a perseguição ao dinamarquês nos 46 segundos. Percebendo que a etapa já não seria deles, sobravam as possíveis bonificações.

E Hindley deu um esticão no grupo, João foi atrás, Jonas naturalmente acompanhou e de novo na sombra do português, teimoso e persistente como na véspera. A tirada seria mesmo para Marc Soler, a quarta que venceu na sua história pessoal com a Vuelta, a sétima para a UAE Emirates que vendera ao mundo já não estar aí para fugas. Com cara de sofrimento, boca aberta e dentes de fora, Almeida foi quem atacou os dois segundos de retribuição que dariam um 2.º lugar, mas, ao contrário de Angliru, o líder da corrida fez-se sorrateiro e ultrapassou João nas últimas.

Assim a curta diferença entre Vingegaard e o batalhador português que o persegue engordou ligeiramente, para os 48 segundos, no dia em que a equipa de João Almeida que se ia deixar de fugas chegou aos 50% das etapas desta Vuelta ganhas ao mostrar que as palavras de quem a chefia, pelos vistos, não são de fiar.

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