No final do jogo do Sporting com o Chaves, da 3.ª jornada da Liga Portugal, na zona de entrevistas rápidas, a jornalista Rita Latas, da Sport TV, fez o que é habitual e colocou a Rúben Amorim uma questão. “Que comentário lhe merece o que Slimani disse, que Ruben Amorim não queria que ele jogasse porque preferia Paulinho no onze inicial?”, questionou a repórter. O treinador respondeu, não respondendo - “Estou certo que me vão perguntar sobre isso na conferência de imprensa, aqui falo um bocadinho do jogo. Não leve a mal. Na conferência responderei com todo o gosto a essa questão” -, mas remeteu a reação para o habitual momento em que o treinador está na sala cheia de jornalistas.
O caso poderia ter terminado assim ou, pelo menos, ganho umas reticências amistosas. Mas a situação aparentemente gerada pela pergunta de Rita Latas levou a que o delegado do Sporting tivesse, alegadamente, pedido ao representante da Liga que o “incidente” fosse registado no relatório do jogo. A razão: segundo o artigo 91.º do Regulamento de Competições da Liga, as flash interviews têm “duração máxima de 90 segundos para cada interveniente, versando exclusivamente sobre as ocorrências do jogo”.
Isto porque a Liga, nesse momento das entrevistas rápidas, considera os jornalistas como agentes desportivos, logo sujeitos ao que está regulamentado pela entidade.
Ao “Maisfutebol”, o presidente do Clube Nacional de Imprensa Desportiva (CNID), Manuel Queiroz, fez questão de responder com ironia: “Se houver alguma multa (…), o CNID terá gosto em ir pagá-la (…) com moedas de um cêntimo”. Num tom mais sério, Queiroz acrescentou: “Ela fez apenas o seu trabalho, com toda a lisura. Fez uma pergunta, o treinador respondeu dentro daquilo que entendia”. O dirigente do CNID lembrou ainda que esta regra do regulamento colide com o direito à liberdade de imprensa.
“O CNID e acredito que também o Sindicato de Jornalistas nunca foram auscultados para a elaboração do regulamento”, disse Queiroz, acrescentando que a penalização poderia ser para o canal de televisão, “por ter firmado um contrato com essas cláusulas”. “Agora, um jornalista, por fazer o seu trabalho?”, questionou o presidente do CNID, que prometeu: «Iremos até às últimas consequências. Vamos até ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, se for caso disso”.
À “TSF”, o presidente do Sindicato dos Jornalistas lembrou que o regulamento de competições da Liga não pode sobrepor-se à Constituição. Luís Simões considera que a situação “remete para censura” e quer levar o caso ao primeiro-ministro António Costa e ao presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
"Estamos muito apreensivos quando o Conselho de Disciplina da FPF faz um comunicado e diz que tem de agir perante um ilícito de um agente desportivo. Nunca, em nenhum momento, um jornalista é um agente desportivo e fazer uma pergunta nunca será um ilícito”, reflete o dirigente sindical, em declarações à rádio. “É movido um processo disciplinar a um jornalista por fazer uma pergunta? Isto é assustador”, acrescenta Luís Simões. O presidente do SJ considera ainda: “Os clubes entendem que os jornalistas não podem fazer perguntas. Não, esse regulamento não é aceitável.”
No habitual comunicado do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol, em que esta divulga os castigos aplicados aos diversos agentes envolvidos na modalidade, entre os futebolistas multados e castigados pelas mais diversas razões, pode ler-se o nome “Rita Latas”, seguido de “processo disciplinar”.