Com as têmporas rapadas de cabelo e o seu carrapicho loiro, Alejandro Davidovich Fokina travava-se de razões com o árbitro de cadeira no court central de Madrid por uma situação rara no ténis: a tecnologia de linha que afere onde a bola ressalta no campo dera como fora uma que o tenista defendia, a pés juntos, ser válida. Acercado do púlpito onde o juiz estava sentado, conversava com Carlos Sanches sobre a decisão que não seria revertida.
O espanhol, descobriu-se mais tarde, tinha razão - a tecnologia ‘trancou’ o frame da imagem antes de a bola bater no court, dando-a erradamente como fora quando chegou a bater sobre a linha -, mas enquanto argumentava com o árbitro, o seu adversário encaminhou-se para o lado do campo onde era suposto jogar no reatamento do jogo. E no seu percurso passou pelo local onde da dita marca no pó de tijolo que estava a ser discutida.
Ao cruzar-se com o motivo da desavença, Holger Rune parou, curvou-se ligeiramente e pisou essa pegada, num gesto que desagradou o público presente na Caja Mágica, estádio principal do Masters 1000 da capital da espanhola. E quem lá estava não o perdoou.
O dinamarquês de feitio áspero e complicado foi, de imediato, apupado quase em uníssono pelo povo de grande maioria espanhola. Sê-lo-ia, outra vez, no final do jogo que durou três horas e se estendeu até à madrugada: derrotado por 7-6(1), 5-7 e 7-6(5), Rune recebeu assobios ao abandonar o court, encostando um dedo indicador à cabeça como resposta. O gesto de apagar a marca na terra foi mais uma amostra da excentricidade dos 20 anos do tenista, com quem o árbitro privou, ainda durante a partida, para o “tentar ajudar”.
Carlos Sanches aproveitou um intervalo entre jogos para chamar o dinamarquês à razão, vendendo a sua “experiência” no torneio para o avisar de que um comportamento daqueles iria “virar o público” contra ele, sem dó nem piedade. Após o jogo, Davidovich Fokina também o reconheceu: “Os adeptos chatearam-se com essa situação e graças a esse gesto de Rune as pessoas ficaram mais do meu lado, isso eu notei”, disse o tenista, de 23 anos, que avançou para os oitavos de final do Masters.
Foi mais um solavanco na conduta do dinamarquês, um dos jogadores a quem se antevê uma relação próxima com o sucesso, auto-causado pelo próprio no ténis que estima o cavalheirismo. Holger Rune junta um ténis bombástico e poderoso que o enche de promessa (é 7.º do ranking ATP e tem quatro títulos conquistados, incluindo o Masters de Paris) a raquetes partidas, garrafas de água atiradas em fúria e postura no court que lhe vão dirigindo críticas, até de outros tenistas.
Casper Ruud já referiu, publicamente, que “é tempo” de o dinamarquês “crescer” e Stan Wawrinka, o ano passado, disse-lhe no final de um encontro entre ambos e no cumprimento na rede para que “deixe de se comportar como um bebé no court”. Isto dirigido a alguém que já atirou insultos homofóbicos contra Tomas Martin Etcheverry, durante um jogo. Holger Rune tem tanto de hábil tenista como de comportamento pouco recomendável a um desportista com tanto tempo de antena na televisão.
Mas o dinamarquês, agora em Madrid como noutros episódios anterior, pouco preocupado parece estar com a reputação que já o persegue. O ano passado, quando confrontado com essa imagem, Rune comparou-se a um dos maiores exemplos de compostura e desportivismo que pegou numa raquete: “Se virem o Roger Federer quando era novo, provavelmente ele era 40 vezes pior do que eu e é um dos jogadores mais adorados no tour, por isso acho que tenho muito tempo para construir uma imagem ainda melhor.”
Em entrevista ao “Ekstra Bladet”, um jornal do seu país, Rune explicou que tem “uma paixão extrema” por ténis e “por vezes mostra-a em demasia”, confessando que “está a trabalhar em deixar passar só o lado positivo” da sua atitude. Comparar-se a Federer terá sido mais um ato excêntrico do que razoável, mas, na altura, defendeu-se com uma verdade: “Se todas as pessoas fossem iguais e pensassem da mesma forma, seria horrível viver neste mundo. É cool pensares o que quiseres e gostares da personalidade que quiseres.”