É um clássico. Após uma derrota dura e inesperada, fala-se de lições. O que se aprendeu. Que erros não se poderão voltar a cometer. Disso falou Rúben Amorim na véspera de receber o Marselha, uma semana depois da debacle no sul de França, onde o Sporting até entrou a ganhar antes de entrar em processo de autodestruição.
Não foi exatamente loquaz o treinador do Sporting, ele que até leva jeito com as palavras. Atirou aquilo que seria de esperar, que a este nível não dá para relaxar porque quando se relaxa se perdem jogos em nove minutos, referindo-se ao curto intervalo de tempo que bastou ao Marselha para marcar três golos mal se apanhou em vantagem numérica no seu estádio.
Pois em Alvalade o Sporting não perdeu o jogo em nove minutos: foi em dez. Os dez minutos que foram do momento em que Guendouzi marcou o penálti consentido, permitido, praticamente autorizado por Ricardo Esgaio, aos 20 minutos, até Alexis Sánchez encostar à boca da baliza a oferta em forma de cruzamento de Harit, aos 30’, num lance que até começou por ser anulado por fora de jogo, mas confirmado pelo VAR como legal.
À meia-hora de jogo, o Sporting jogava com uma dupla desvantagem no marcador e com menos um campo numa noite em que até quando tudo estava igual já se notavam as dificuldades: a equipa de Rúben Amorim sofreu desde cedo para sair a jogar, pouco confortável com a superioridade dos gauleses a meio-campo, sem se conseguir desembrulhar da pressão precoce, da estratégia que Igor Tudor trouxe para Alvalade e à qual Amorim nem teve tempo de responder.
E o que se seguiu foi apenas uma espécie de avalancha de erros, azares, muita culpa própria e um desfecho que já se parecia adivinhar, como que pairando no ar logo no arranque. Com Porro no banco, aparentemente disponível, Amorim deu a titularidade a Ricardo Esgaio que em dois minutos juntou todas as falhas individuais possíveis para deixar a equipa numa situação limite num jogo tão importante. Já sabendo do critério do árbitro, até porque este já tinha sido implacável em lances semelhantes, o lateral foi de braço no ar numa disputa de bola com Nuno Tavares aos 16’. Resultado: cartão amarelo. E logo a seguir começou por falhar o posicionamento num ataque do Marselha para depois entrar de forma imprudente às pernas de Harit dentro da área, quando já tudo estava descompensado. A expulsão era inevitável e, para ajudar o Sporting, Guendouzi não falhou - ainda que Israel tenha adivinhado o lado do remate.
PATRICIA DE MELO MOREIRA
O posterior golo de Alexis veio matar o jogo, com 30 minutos no marcador. Um golo que era apenas sintoma de uma equipa perdida, com Amorim a reagir aos repelões no banco. Começou por lançar Fatawu para fechar o lado direito após a expulsão de Esgaio, a equipa continuou frágil e insegura, e com a saída de Coates por lesão aos 34’ voltou a mexer: entrou não só Marsá para o lugar do uruguaio como Sotiris para vez de Marcus Edwards, porque o Sporting necessitava com urgência de estancar o meio-campo.
Mas aí já o mal estava mais que feito. Nazinho entrou após o intervalo para a saída de Trincão e o Sporting até nem começou mal na 2.ª parte, mas a expulsão de Pote aos 60’, aparentemente por irresponsáveis palavras ao árbitro, tornaram a meia-hora restante numa espécie de Survivor, em que o importante era o controlo de danos, evitar uma possível humilhação. E se o jogo terminou 2-0 foi porque o Marselha mais não quis: Tudor aproveitou para rodar a equipa, fazer descansar alguns jogadores e quase nunca acelerou num jogo que chegou a ter “goleada” escrito na testa.
Com tudo isto, o Sporting mantém-se com todas as hipóteses de seguir em frente na Liga dos Campeões, com seis pontos, tal como o adversário desta noite. Mas se os franceses estão em trajetória ascendente em termos de motivação e os leões vão na direção contrária: parece agora tão longe aquele Sporting venenoso de Frankfurt ou o cheio de coração da receção ao Tottenham. E isso tem o seu peso, até porque em dois jogos com o Marselha, a equipa de Rúben Amorim competiu, quanto muito, vinte minutos em cada um, vergando-se depois à sobrevivência em contendas já fechados a meio da 1.ª parte. E isso tem peso, para mais numa fase de grupos tão concentrada, sem contemplações para derivações de qualidade ou curtos-circuitos individuais.