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Sérgio Conceição: “Alguns treinadores já me chamaram mal-formado. É uma provocação incrível, querem aparecer e têm todo o direito disso”

O treinador do FC Porto falou esta sexta-feira aos jornalistas para lançar o jogo com o Famalicão, no sábado (20h30, Sport TV1), num jogo a contar para a penúltima jornada da Liga. Conceição defendeu que em Portugal “trabalha-se muito bem e não se dá o devido mérito”, confessando que “por vezes” sente “mais dificuldades em defrontar equipas mais acessíveis do nosso campeonato do que a jogar na Champions”. Num tom de ajuste de contas, disse ainda: “As pessoas chateiam-se e ficam saturadas de não ter protagonismo. Alguns treinadores já me chamaram mal-educado, mal-formado, querem duelos comigo, é uma provocação incrível, porque querem protagonismo, querem aparecer, têm todo o direito disso”

Expresso

MIGUEL RIOPA/Getty

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Famalicão

“Os jogos são todos diferentes. Por aquilo que sei é que às vezes, mudando um jogador, a dinâmica é um bocadinho diferente. Cada jogo tem a sua história. Depende muito do que fizermos e permitimos ao adversário fazer, dentro dos momentos do jogo.”

Distância para Benfica

“Nem desmoraliza, nem dá força anímica. O que nós fazemos é diariamente trabalhar no máximo, perceber que se o rival está à nossa frente, o Benfica, e depende só dele para ser campeão, alguma coisa não fizemos tão bem como a equipa que vai na frente. Focamos no que é o nosso trabalho, durante a semana preparámos a equipa para ir a Famalicão tentar ganhar o jogo. Essa diferença de pontos na classificação, não tem de nos dar mais ou menos motivação para o jogo.”

As contas da Liga

"Estamos a duas jornadas do fim, os jogos são todos importantes, fundamentais mesmo, menos para alguns clubes que não estejam a lutar ou pela manutenção ou ida a Europa ou ser campeão. Se olharmos para o Marítimo-Vizela tem o seu peso para Marítimo e com certeza para o Vizela, que pode ter relação direta pela manutenção, com Paços de Ferreira e Santa Clara, mas também com o título, porque o Santa Clara depois vai jogar à Luz. Uma coisa é ir despromovido, outra é ir com a possibilidade de ir disputar o play-off. Mesmo os clubes que estão tranquilos, nunca estão tranquilos. Dou outro exemplo: o Casa Pia contra o Benfica fez sete faltas, contra nós fez 18. É uma equipa que veio tranquila ao Dragão em termos de tabela classificativa. No primeiro pontapé de baliza foram cerca de 22 segundos que o guarda-redes demorou e está tranquila na tabela. As equipas querem todas ganhar, têm grandíssimas equipas técnicas, grandíssimos jogadores, massas adeptas fantásticas e toda a gente está envolvida no que são os três pontos, que toda a gente quer ganhar a duas jornadas do fim.”

Processo por gesto no FC Porto-Casa Pia (referência a dinheiro)

“Os comentadores passaram a semana toda a deduzir o gesto, a insinuar que tinha sido algo. Abriu-se um processo por causa dos comentadores. Não comentam futebol, têm de ter o tacho e receber o seu dinheirinho ao final do mês. Algo factual, escrito, contrapondo o que é o relatório do árbitro, sem dúvida nenhuma que é extremamente de compreensão para mim, mas estou habituado ao lixo e ao que é tóxico do futebol português, em que sou a primeira figura para essa gente. Pensam que me diminuem em alguma coisa, não é isso que me torna mais forte, mas é mais um escudo, mais uma proteção para o que sou como pessoa e profissional. Com certeza faz felizes os donos desses canais, é difícil mudar isso. Vejo noutros países a comentarem futebol mesmo, o porquê, porquê daquele golo acontecer, o porquê de tirar aos 50 e poucos minutos Fábio Cardoso, baixar Mateus. O que implicou no processo defensivo, nomeadamente no terço defensivo e na linha defensiva, o que provocou no próprio jogo. Isso ninguém quer saber, porque percebem muito pouco, percebem muito pouco. O que fico triste é que os que percebem não falam nisso, preferem falar no gesto, gesticular, do meu olhar fulminante, enfim, insinuar ou deduzir o que fiz. Há algum comentário para o banco quando faço esse gesto? Sorriso e fiz assim [polegares em cima]. Estava a receber uma proposta de duelo, quando acabou o jogo, a minha reação era buscar duas mini-balizas no túnel para fazermos 1x1. Ia fazer 1x1 com o senhor que me propôs um duelo. ‘Vamos lá para dentro, fixe, não há problema’. Futebol não querem saber, pois não? Porque entrou o Grujic? O Mehdi acabou a 8, acabou a 8! Viu isso? Sabe o que é a posição 8?”

Tensão

“O que é verdadeiramente importante é o que se passou no último jogo. Isso é que é interessante. Obviamente que acontecem coisas no final que não dignificam ninguém e ninguém fica contente por isso, mais grave é estar sentado numa mesa, com um computador na frente, com toda a tranquilidade do mundo, sem ninguém provocar emoções diferentes, aí ainda é mais grave o que vem cá para fora e leio. Ali é normal. Não é normal… Há muitas emoções à flor da pele, à medida que o campeonato vai caminhando para o final é natural que essas emoções venham cá para fora com mais facilidade. Dá-se muito protagonismo aos treinadores dos quatro grandes e pouco aos outros treinadores e equipas técnicas, que fazem um trabalho excelente e fantástico. Sinceramente. Sinto por vezes mais dificuldades em defrontar as equipas teoricamente mais acessíveis do nosso campeonato do que jogar na Liga dos Campeões. Sinceramente. Trabalha-se muito bem em Portugal e não se dá o devido mérito. E as pessoas chateiam-se e ficam saturadas de não ter protagonismo. Alguns treinadores já me chamaram mal-educado, mal-formado, querem duelos comigo, é uma provocação incrível, porque querem protagonismo, querem aparecer, têm todo o direito disso. Toda a gente devia dar mais mérito a estas pessoas que trabalham muitíssimo bem.”

Saturação emocional de fim de temporada

“Essa saturação emocional [que fala]… Quando estamos apaixonados não há saturação nenhuma, podemos estar a viver com intensidade e ao máximo todos os dias. O problema da saturação tem a ver com o que disse. Agora, por algo que amo fazer? Há dias mais felizes, menos felizes, mas estou a fazer aquilo que gosto, o que amo. Os jogadores têm de pensar exatamente da mesma forma. Aparecem nos jornais, são conhecidos, ganham graças a Deus bem para terem uma vida fantástica com as suas famílias, têm o privilégio de fazer o que gostam. Deparo-me com realidades completamente diferentes no meu dia a dia, pessoas que se levantam às 5h da manhã para trabalhar, chegam a casa à noite, não têm tempo para ver os filhos. Têm outros problemas na vida, outros trabalhos. Nós? Somos uns privilegiados. Saturação de quê? Escolher um restaurante estrela Michelin para ir almoçar ou jantar com a família? Beber um bom vinho ou boa água?... Não é por aí. Algum desgaste, sim, algum cansaço, pelo que falámos aqui, que não tem que ver com o futebol, que o é o mais importante.”