Ver José Mota no banco de suplentes do Paços de Ferreira é uma laundromat do passado, o tambor da maquinaria chocalhou quando o clube depositou a moeda, mais uma, fazendo retornar o móvel da casa à capital de José Mota, aquele lugar é será mais assim e eis o homem que lá acabou como defesa central, começou como adjunto, passou a treinador principal, saiu para regressar, debandou de novo para o tempo o fazer de protagonista da Netflix noutras paragens e, agora, reeditar um regresso para junto de uns aflitos.
O Paços entra no Dragão vestido de último classificado e desprotegido pela segunda pior defesa do campeonato, encolhido num plano de resguardo da área, linha de cinco defesas montada estranhamente longe da baliza, outra de quatro à frente e todo um bloco atrás da fronteira da bola com um fantasma do passado no cume: o que sobra de Nico Gaitán planado por lesões em anos recentes, com um físico a obrigá-lo a hoje jogar a um ralenti possível e a ter de confiar, mais ainda, na leveza do pé esquerdo a reboque do qual é um deambulante atacante que José Mota tenta poupar a pruridos defensivos.
O plano do treinador com para lá de 400 jogos na Liga e tornado a casa é arrombado em quatro minutos, expostos os seus fossos entre linhas quando a bola vai de um lado ao outro rapidamente e pára à esquerda, onde Eustáquio recebe, vira-se e pica um passe para as costas dos centrais onde Evanilson amansa a encomenda e a pica sobre o guarda-redes. Pouco demora até Wendel, à entrada da área, rematar a rasar o poste e outra variação rápida de flanco, para a direita, fazer o médio luso-canadiano do FC Porto disparar uma retilínea tentativa que Jordi Martins safa para canto. Uma aceleração só parecia bastar.
A soltura concedida a Gaitán para se escapulir aos centrais tentava tirar-lhes uma referência e deixar que fossem os rápidos Uilton e Koffi a atacarem os espaço, enquanto polvilhava a relva com os seus toques refinados. Por vezes, conseguia assim o Paços avançar a equipa no campo e um cruzamento seu, trabalhado por Koffi, daria no cruzamento que Juan Delgado pareceu um jogador do FC Porto a cortar quando rematou com a baliza praticamente aberta. A oportunidade foi um cato isolado no deserto, porque a equipa de José Mota prosseguiu a defender-se, sem bola, com as duas linhas longe da área e os jogadores sempre a par, permeáveis a serem todos facilmente batidos por um passe vertical.
Um Paços tão recuado, com tanta gente a ver a bola de frente e um bloco aparentemente tão junto, era desmontado quase a cada vez que alguém treinado por Sérgio Conceição aparecia nas costas dos médios adversários e lá aguardava por um passe para encadear a simplicidade: um Pêpê sozinho na pradaria tocaria de primeira para Taremi, entre dois defesas, rodopiar com a receção e enfrentar o guarda-redes para o 2-0 (31’); depois, o iraniano lançaria o brasileiro na área, este aguardaria para Evanilson encarar com ele o guardião e lhe passar um fácil 3-0 (39’).

MANUEL FERNANDO ARAUJO/LUSA
A passividade dos jogadores do Paços em saltarem na pressão a portistas que tivessem a bola de frente para a baliza - sobretudo, de quem estivesse na linha defensiva - agravava o desmantelamento em curso que, ao intervalo, não condizia a equipa com o aprumo de José Mota, encasado, encamisado e encamisolado. O treinador desfez a defesa a cinco para a segunda parte, confiando a esquerda do ataque à reminiscência de Gaitán de feitos de outrora para entrar Adrián Btuzka e dar um avançado à equipa.
A rearrumação, acompanhada por outra corrente elétrica nos duelos e momentos de pressão, deu uns 10 minutos de encontro dividido ao Paços e até repleto de aproximações à área. O canhoto argentino já tinha nos pés do entrada espanhol alguma reciprocidade para jogar. Mas, ao primeiro regresso do FC Porto ao retângulo adversário, Evanilson encarou um adversário, correu até à linha de fundo, cruzou e o salto descontrolado de Juan Delgado fê-lo cabecear a bola para o 4-0 ser um auto-golo (55’). A reação seria de pouca dura, também, pelas mexidas que sucederam ao golo.
O turbo de Galeno entrou e o jogo ganhou esticões vários à esquerda, com a equipa a mastigar a posse de bola em outras zonas do campo até lançar uma receção do brasileiro para ele arrancar logo para cima de adversários. Sérgio Conceição refrescou igualmente o corpo que corre no costado dos defesas para abrir espaços a Taremi, o cada vez mais eficiente avançado que joga para servir e fazer jogar. O iraniano remataria várias vezes, Grujic e Galeno (ao poste) também, até o ritmo ficar como o aparo de um sismógrafo a riscar réplicas de decrescente ocorrência. Matchoi, no Paços, foi sendo uma ilha de pujança e técnica nos visitantes.
Tudo terminou com a certeza de um FC Porto a atuar em regime de suficiente perante tamanho conforto e de estancar a seca sem vitórias que durou um par de jornadas. Uma vitória do Paços de Ferreira no Dragão ainda está para vir e esta equipa, por enquanto, está porventura longe da coesão de qualquer uma que José Mota tenha treinado nas suas nove temporadas anteriores no clube, nos tempos em que um boné lhe pontuava a cabeça em cada momento de oratória pós-jogo.
Apareceria assim mesmo na conferência de imprensa, regressando indumentariamente a um passado em que teria mais coisas boas para dizer.