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Uma liga até ao fim

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O Benfica, olhando para o retrovisor para ver o FC Porto: o título só se decidirá na última jornada

O Benfica, olhando para o retrovisor para ver o FC Porto: o título só se decidirá na última jornada

Gualter Fatia/Getty

Em bom rigor, nenhum dos três grandes terá saído plenamente feliz da penúltima jornada da I Liga. O Benfica, o mais sorridente dos três, ainda não conseguiu selar o título, primeiro porque o FC Porto venceu em Famalicão, depois porque de Alvalade não trouxe os três pontos; a equipa de Sérgio Conceição vai para a última jornada a precisar de quase um milagre para revalidar o título da época passada, necessitando que o despromovido Santa Clara vença na Luz ou que, em caso de empate, dê a volta aos 11 golos de desvantagem que tem no confronto com os líderes da competição; o Sporting, sem o pequeno prémio de consolação que seria bater o rival, também viu a Liga dos Campeões fugir definitivamente, selando uma temporada em que todos os objetivos foram caindo uns após os outros. Festejou o SC Braga, que lutará, no verão, por estar na fase de grupos da principal competição europeia.

Vamos, assim, ter campeonato até ao fim, como se o desfecho de Alvalade, com o golo de João Neves em tempo de descontos, quisesse ilustrar uma competição sempre dominada pelo Benfica, mas que só se decidirá em cima da linha da meta. Para as águias, após quatro anos sem qualquer título, é um regresso ao cenário do derradeiro, já que, a 18 de maio de 2019, o triunfo com Bruno Lage surgiu, também, na última jornada, em casa, contra o Santa Clara. Seferovic bisou, Félix marcou depois de deitar um defesa ao chão e rematar forte. É tempo para novos heróis.

No próximo sábado, às 18h00, o Benfica - Santa Clara e o FC Porto - Vitória SC decidirão o destino de uma maratona que teve sempre o mesmo líder, mas com um perseguidor que teve o mérito de, mesmo quando tudo parecia impossível, não desistir, acreditar, andar a aparecer no retrovisor. Em seis temporadas de Sérgio Conceição, a competitividade é garantida: além dos três campeonatos, duas Taças, uma Taça da Liga e três Supertaças, fica esta persistência, esta insistência, o andar sempre na discussão até final. O que, na verdade, só valoriza aqueles que o derrotam.

O Benfica de Bruno Lage, em 2018/19, teve de fazer 87 pontos para ser campeão (recorde-se que o recorde histórico são os 91 do FC Porto no ano passado); o Sporting de Rúben Amorim, em 2020/21, fez das tripas coração, expulsou todos os fantasmas de Alvalade e andou 33 jornadas sem perder, chegando aos 85 pontos; agora, o Benfica de Roger Schmidt fez uma primeira volta quase perfeita e ganhou 23 dos primeiros 26 encontros, uma campanha de alto nível que pode chegar até aos 87 pontos, igualando a marca de Lage.

Talvez se quem está no futebol português olhasse mais para isto, vendo os méritos dos rivais para realçar os seus, o ambiente fosse algo mais respirável, menos tóxico. Se só virmos no outro defeitos, se só o concebermos como um inimigo, é tudo uma política de terra queimada, de desrespeito, de ignorar as virtudes alheias.

Ter estado na tarde de ontem na zona de Telheiras, do Lumiar ou do Campo Grande foi uma experiência estranha. Na antecâmara de um jogo de futebol havia demasiada tensão, demasiado medo, muitos confrontos físicos, polícia por todo o lado, pais preocupados levando crianças pela mão, um clima quase de guerra de guerrilha, em que tudo poderia, subitamente, dar lugar a incidentes ainda piores dos que foram sendo noticiados.

É o retrato final de uma liga que, como vem sendo habitual, teve demasiado ódio alimentado de dentro para fora e de fora para dentro. Se calhar, se uns olhassem para os outros como parte de algo comum e não como lados opostos de uma qualquer guerra, isto poderia começar a mudar.

A liga vai até ao fim. Seria ingénuo pedir que não haja episódios menos dignos, pelo talvez só seja possível desejar que nada de grave haja a lamentar. O dérbi acabou com um caloroso abraço entre Grimaldo e Bellerín, espanhóis com passado comum ligado ao Barça. Que sejam eles, os jogadores, os protagonistas deste final.

O que se passou

Zona mista

Creio que não mereço terminar assim. Esforcei-me o suficiente durante a minha carreira desportiva para que o meu final não seja hoje, aqui, numa conferência de imprensa. Vou esforçar-me para que o meu final seja de outra maneira.

Rafa Nadal comunicou a decisão de não participar na edição de 2023 de Roland-Garros — que arranca já hoje, com a qualificação — num anúncio que teve tanto de triste como de reflexivo. Um dos matrimónios mais constantes do desporto será interrompido: depois de 19 anos de presença ininterruptas, nos quais ergueu o título 14 vezes e fundiu o Grand Slam francês com a sua lenda pessoal, o espanhol interrompe a carreira para tentar voltar em 2024, fazendo do próximo ano uma despedida dentro dos courts. Nos próximos tempos, Rafa, massacrado pelo próprio corpo, nem irá treinar, descansando antes de tentar uma última batalha contra si próprio antes do adeus que merece.

O que vem aí

Segunda-feira, 22

⚽ A Roma de José Mourinho e Rui Patrício recebe a Salernitana de Paulo Sousa (17h30, Sport TV2) na Série A. À noite, o Newcastle é anfitrião do Leicester na Premier League (20h, Eleven Sports1) em jogo que importa para a disputa de lugares de Champions e fuga à despromoção.

Terça-feira, 23

🏀 Quarto jogo da final da Conferência Oeste da NBA entre os LA Lakers e os Denver Nuggets (1h30, Sport TV1).
⚽👶 Portugal defronta a França no terceiro jogo da fase de grupos do Europeu de sub-17 (14h, RTP1) necessitado de uma vitória para seguir na prova. Na Arábia Saudita, o Al Nassr de Cristiano Ronaldo defronta o Al-Shabab (19h30, Sport TV1).

Quarta-feira, 24

🏀 Os Miami Heat e os Boston Celtics defrontam-se na partida n.º 4 da final da Conferência Este da NBA (1h30, Sport TV3).
⚽🏆 Inter e Fiorentina jogam a final da Taça de Itália (20h, Sport TV1).

Quinta-feira, 25

⚽ Jogo dos grandes na Premier League: o Manchester United é anfitrião do Chelsea (20h, Eleven Sports 1).

Sexta-feira, 26

🌊 Começa a sexta etapa do circuito mundial de surf no ‘rancho’ de Kelly Slater no interior da Califórnia, EUA, onde se formam ondas artificiais (Sport TV).
⚽ I Liga: Vizela-Sporting (21h15, SportTV2), Rio Ave-Famalicão (19h, SportTV1)

Sábado, 27

⚽ Decide-se o campeonato: Benfica-Santa Clara (18h, BTV), FC Porto-Vitória (18h, SportTV1)
⚽ Liga: Gil Vicente-Casa Pia (12h45, SportTV1), Estoril-Marítimo (15h30), Desp. Chaves-Boavista (15h30, SportTV1), Portimonense-Arouca (18h), Sp. Braga-Paços Ferreira (20h30)
🏎️ F1: qualificação para o GP do Mónaco (15h, SportTV4)
⚽ Bundesliga: Colónia-Bayern (14h30, Eleven Sports1), Dortmund-Mainz (14h30, Eleven Sports2)
⚽ Serie A: Fiorentina-Roma (17h, SportTV3)

Domingo, 28

🎾 Roland-Garros: Começa o quadro principal do segundo Grand Slam da temporada (9h30, Eurosport 1)
🏎️ F1: Grande Prémio do Mónaco (14h, SportTV4)
⚽ Serie A: Juventus-Milan (19h45, SportTV3)
⚽ Premier League: Brentford-City (16h30, Eleven Sports1), Man. United-Fulham (16h30, Eleven Sports2), Southampton-Liverpool (16h30, Eleven Sports3)
🚴 Giro: Última etapa da corrida em que João Almeida luta pelo pódio (14h30, Eurosport)


Hoje deu-nos para isto

Seria bom sinal se, de facto, só “hoje” é que me tivesse dado para isto. Mas, na verdade, “isto” não é novo, é recorrente, e triste.

Um dos melhores jogadores do mundo é, há vários meses, perseguido, insultado, vítima de crimes de ódio nos estádios de uma das principais ligas do mundo. Vinicius Júnior tem sido o alvo de bárbaros comportamentos racistas em Espanha, um craque com um alvo nas costas para ser atingido com o que de pior há na espécie humana.

Já aconteceu em Maiorca, em março de 2022 e fevereiro deste ano, no terreno do Osasuna, também em fevereiro, ou frente ao Atlético de Madrid, em setembro passado. Ontem, o nojo repetiu-se, talvez de forma agravada, em Valência: cânticos com “Vinícius, és um macaco” à chegada do autocarro do Real, gritos de “macaco, macaco”, em uníssono ou insultos como “puto negro, és um idiota” ou “puto negro, és um filho da p***”.

Quality Sport Images/Getty

Vinícius denunciou um dos agressores, mas o jogo não parou e, nos descontos, o brasileiro acabou expulso. Depois da partida, o brasileiro denunciou a situação, escrevendo que “o campeonato que já foi de Ronaldinho, Ronaldo, Cristiano e Messi hoje é dos racistas”.

Tão ou mais grave do que o nojo para o qual Vinícius é atirado quase semanalmente é a reação de quem o deveria defender. Javier Tebas, o presidente da LaLiga que já admitiu simpatias pelo Vox, disse que o jogador se deveria “informar” antes de “criticar e injuriar” a competição, não se deixando “manipular”, acrescentando que é “muito injusto” dizer que LaLiga ou Espanha são racistas.

Ao triste espetáculo de acusar a vítima juntou-se alguma comunicação social do país vizinho, agarrada a clubites quando está em causa algo bem maior. O “Superdporte”, jornal de Valência, é talvez o exemplo mais gritante desta baixeza mural, irresponsabilidade, pedindo, na sua manchete, que Vinicius não “provoque”. Após o encontro, um jornalista perguntou ao brasileiro se ele “ia pedir desculpa” aos adeptos do clube adversário.

Indefeso e atirado para o meio do lodo, a imagem de Vinícius nos jogos fora em Espanha é a de um jovem de 22 anos indefeso, só perante um tsunami de agressões à sua condição humana. Quem o deveria defender e proteger, ataca-o, e cabe perguntar: se um dos melhores futebolistas do mundo, num dos maiores clubes do mundo, está tão indefeso e vulnerável perante o racismo, que proteções terão outros ainda mais frágeis e menos poderosos, que esperança há para quem, longe dos focos do mediatismo, sofre diariamente com tamanha podridão moral?

Tenha uma boa semana, tentando fazer do desporto e da sociedade um lugar um bocadinho melhor, onde, pelo menos, ninguém se ache no direito de chamar animal a outro ser humano. Obrigado por nos ler e acompanhar no site da Tribuna Expresso, onde poderá seguir a atualidade desportiva e as nossas entrevistas, perfis e análises. Siga-nos também no Facebook, Instagram e no Twitter.