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Max, o campeão normal da nova não-normalidade da Fórmula 1

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Verstappen conquistou em 2022 o segundo título mundial na F1. E a F1 deve trabalhar para que ele fique por lá durante muitos anos

Verstappen conquistou em 2022 o segundo título mundial na F1. E a F1 deve trabalhar para que ele fique por lá durante muitos anos

Clive Mason

Há uma história paradigmática de como Max Verstappen foi criado e moldado para um dia ser piloto de Fórmula 1. O neerlandês tinha apenas 14 anos e numa corrida de karting, no sul de Itália, foi demasiado agressivo num duelo em pista. Obrigado a abandonar numa prova que, em condições normais, venceria sem dificuldades, o adolescente teve que lidar com a fúria do pai no longo caminho até casa pelas estradas transalpinas.

Jos, antigo piloto, sempre foi um tipo irascível. Chegou a ser colega de equipa de Michael Schumacher na Benetton nos anos 90, mas a imagem mais marcante da sua passagem pela categoria-rainha será ter sobrevivido à paragem nas boxes mais assustadora da história da Fórmula 1. Naquela tarde, ainda em Itália, a meio da discussão com o rebento, em quem colocou toda a sua atenção e pressão, porque queria que fosse melhor piloto que ele próprio, Jos parou numa numa estação de serviço e expulsou Max do carro.

A história é normalmente contada em tom de tough love, de como é preciso enrijar a criançada para que cresça forte e ciente dos sacrifícios. Para mim é apenas um caso de maus tratos infantis, mas que sei eu disto.

Max Verstappen cresceu assim, por vezes à base da dureza desnecessária, para expiar aquilo que o pai nunca teve talento para fazer: vencer corridas, campeonatos, bater recordes. Com 17 anos foi o mais jovem de sempre a participar num grande prémio de Fórmula 1, um ano depois o mais precoce a vencer uma corrida, logo na estreia pela Red Bull. No domingo sagrou-se bicampeão mundial, com apenas 25 anos, depois de 12 vitórias em 18 corridas e quando ainda faltam quatro provas para o final da época.

A dimensão do talento de Max, a mentalidade implacável nutrida por Jos e uma máquina perfeitamente afinada pela Red Bull trazem tanta surpresa a este título como ver o Bayern Munique campeão na Alemanha, um título ainda assim anti-climático já que o neerlandês só soube da honra revalidada já depois de sair do carro, à conta de mais uma confusão made in FIA no Japão: a chuva torrencial permitiu que se completassem apenas 28 voltas e toda a gente, pilotos incluídos, acreditaram que seriam distribuídos pontos pela metade. Mas afinal a ambiguidade dos regulamentos permitiu que os pontos fossem atribuídos na totalidade. E mesmo que Max Verstappen seja campeão em 2022 com todo o mérito e com uma superioridade imaculada, são dois anos como campeão com banzé regulamentar à mistura, depois da triste debacle da federação automóvel no GP Abu Dhabi há um ano.

E é nestas confusões que têm de se focar a FIA e a Liberty, a empresa norte-americana que transformou a Fórmula 1 numa competição para brancos e ricos de meia-idade num dos produtos de entretenimento mais excitantes dos últimos anos. Depois de um final de época polémico e até à última volta em 2021, 2022 voltou a trazer mais polémica, mas um final zero emocionante. E polémica sem emoção competitiva é coisa estéril, que mais ano menos ano cansa quem vê. Os regulamentos devem ser suficientemente claros para que a Fórmula 1 não pareça uma competição hiper-profissionalizada em que se tomam decisões ad hoc. E no próximo ano, a temporada terá umas nunca vistas 24 corridas à volta do mundo, excelente para as audiências e para os cofres da Liberty, menos para a saúde dos pilotos e mecânicos e eventualmente para a própria competição a longo prazo. Se o domínio de Max continuar nos próximos anos, corremos o risco de termos campeonatos decididos a faltar cinco, seis corridas para o final da época. E como se vão vender essas cinco ou seis corridas? A ambição desmedida de sugar tudo o que é possível do produto não fará exatamente maravilhas pela sua sustentabilidade.

Aos 24 anos, Verstappen ainda tem muitos recordes para roubar, os sete títulos de Hamilton e Schumacher passam seguramente pela sua cabeça, e até lá a Liberty estará segura, mas sem competitividade não há motivação. A nova não-normalidade da Fórmula 1 corre o risco de se tornar normal. E aqui normal é sinónimo de chata, com decisões baseadas em artigos em papéis e com um interminável campeonato. Quando assim for, as audiências mudam para o desporto ao lado. E o próprio Verstappen, competitivo como é, cansar-se-á, porque a marca dos prodígios e dos atletas que são projetos dos seus próprios progenitores é fartarem-se cedo quando a cenourinha da motivação é comida por eles próprios e por outros. E outros que muitas vezes só deviam ter a preocupação de regá-la, não de comê-la.

O que se passou

Depois de uma jornada de Champions com sortes distintas, Benfica, FC Porto e Sporting passaram incólumes na última jornada da I Liga.

Ainda antes de jogar o Mundial, Portugal já sabe quem são os adversários para a qualificação do Euro 2024.

A seleção nacional feminina passou a primeira barreira para chegar ao Mundial de 2023, frente à Bélgica. Terça-feira há jogo com a Islândia.

Messi diz que o Mundial de 2022 será muito provavelmente o seu último.

E notícia fresca da manhã desta segunda-feira: os donos do PSG entraram na SAD do SC Braga.


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“Queria ter defendido aquela bola do Kelvin. Só vi uma vez na televisão. Sei porque é que não a defendi, sei o que devia ter feito”

Artur Moraes confessa que logo na primeira conversa com Jorge Jesus percebeu que ambos falavam a mesma língua. O guarda-redes brasileiro conta, nesta segunda parte, como foi aquela semana em que o Benfica foi do céu ao inferno e perdeu tudo, em 2013 e recorda duas palestras emotivas de Jesus. Fala, também, do que viu durante o ano que viveu na Turquia, do significado da sua passagem pelo Chapecoense, após o desastre que vitimou a equipa, e de como foi difícil voltar a jogar e a viver no Brasil, de onde acabou por sair para residir em Portugal

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Artur Moraes explica como se tornou guarda-redes por ter levantando uma mão, por acaso. Natural do interior de São Paulo, desde criança tinha o sonho de jogar na Europa e descreve a importante passagem pelo Cruzeiro, onde foi campeão brasileiro, e as dificuldades por que passou em Itália, primeiro no Siena, depois no Cesena e também na Roma, de onde saiu para uma época inédita no SC Braga, que veio mudar a sua vida. Pelo meio conta episódios pessoais que nunca tinha revelado

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Zona mista

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O que aí vem

Segunda-feira, 10
⚽ Fecho da jornada da I Liga com o Arouca - Famalicão (20h15, Sport TV1)
🎾 ATP 250 de Florença (10h, Sport TV2) e ATP 250 de Gijón (12h, Sport TV6)

Terça-feira, 11
⚽ O futebol não pára e esta semana também é semana de Champions, com a visita do Benfica ao Paris Saint-Germain (20h, Eleven 1), entre muitos outros jogos que valem milhões
⚽ A seleção feminina recebe a Islândia e uma vitória coloca-nos mais perto do Mundial de 2023 (18h, 11)
🥋 Jorge Fonseca vai à procura do terceiro título nos -100kg dos Mundiais de judo (13h, Sport TV5)

Quarta-feira, 12
⚽ Na Liga dos Campeões, o FC Porto joga em casa do Bayer Leverkusen (20h, Eleven 1) e o Sporting recebe o Marselha (20h, TVI)

Quinta-feira, 13
⚽ O SC Braga joga com o Union St. Gilloise na Liga Europa (17h45, Sport TV1). Mais tarde, o Manchester United recebe o Omonia (20h, Sport TV1)

Sexta-feira, 14
⚽ Taça de Portugal: Amora - Estoril (20h45, 11)

Sábado, 15
⚽ Taça de Portugal: Caldas - Benfica (20h45, RTP1)
⚽ Liga feminina: Benfica - Famalicão (15h, 11)

Domingo, 16
⚽ Taça de Portugal: Varzim - Sporting (19h, Sport TV1) e Anadia - FC Porto (20h45, RTP1)
⚽ Liga feminina: Amora - Sporting (13h, 11)
⚽ Premier League: Leeds - Arsenal (14h, Eleven 3), Manchester United - Newcastle (14h, Eleven 1) e Liverpool - Manchester City (16h30, Eleven 1)
⚽ Ligue 1: Paris Saint-Germain - Marselha (19h45, Eleven 1)

Hoje deu-nos para isto

Talvez nunca fique totalmente claro se aquele tweet-OVNI que surgiu na timeline de Iker Casillas em que atirava assim meio casualmente que era gay foi verdadeiramente um hacking ou uma brincadeira de mau gosto mas, pelo caminho, o mal está feito. As respostas à mensagem, que o antigo guarda-redes apagou cerca de uma hora depois, iam do zombar macho de Carles Puyol ao gozo generalizado.

Casillas diz que houve apropriação da sua conta, mas é estranho que uma conta roubada volte tão rapidamente para o seu legítimo dono. Por Espanha, fala-se na hipótese de ter sido uma reação (homosapiensziana, diga-se) ao facto da imprensa del corazón dos nossos vizinhos lhe atribuir namorada nova a cada semana, razão mais do que suficiente (isto é irónico, caso não se note) para apoucar e diminuir como uma simples graçola o doloroso processo de afirmação pelo qual ainda tantos homossexuais têm de passar junto das famílias e da sociedade.

Desculpas foram pedidas, quase tão casualmente como a mensagem foi colocada, como se tudo isto fosse nada mais do que isso: uma brincadeira, um episódio de boys will be boys. No final, nada interessa, muito menos a dor de quem viu naquela mensagem a esperança do seu caminho poder ser mais simples porque uma figura de alto perfil também contou a sua verdade ao mundo. Porque muitas também foram as mensagens de regozijo de quem se sentiu, ali, representado. Afinal, era tudo farsa. No final de terríveis semanas em que, aqui e lá fora, soubemos que o futebol ainda está cheio de gente que lhe faz mal, que abusa de quem está em posição de fragilidade, fazia-nos falta um bom exemplo.

Mas ele não apareceu. E que triste ver antigos capitães do Real Madrid e do Barcelona entrarem nestes buracos negros de falta de empatia, de conversa de tasca, com gracejos que sempre foram, mas em 2022 ainda mais, grunhidos animalescos, coisa de gente que não pára 10 segundos para pensar na dor que vai provocar com um simples tweet.

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“Espero que me respeitem: sou gay”, escreveu Iker Casillas no Twitter. Entretanto, apagou a mensagem e disse que foi “hackeado”

A mensagem foi publicada na conta oficial do ex-guarda-redes, retirado em 2020, quando jogava no FC Porto. Cerca de hora e meia depois foi apagada da rede social onde conta com 9,6 milhões de seguidores. A ser verdade, Iker Casillas seria o antigo ou atual futebolista de maior renome a assumir publicamente a homossexualidade, mas, mais de duas horas depois, pediu desculpas e revelou que a sua conta foi “hackeada”

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E já agora, se ainda não escutou, o podcast chamado A Culpa é do Árbitro, com Duarte Gomes, terá como habitualmente um novo episódio à terça-feira, onde as regras e as leis do jogo são protagonistas, com o tom pedagógico que tantas vezes falta ao nosso mundo da bola.